"Zama" de António Di Benedetto tornado filme por Lucrecia Martel chega a Portugal

O romance "Zama", publicado originalmente em 1956 e considerado a obra-prima do escritor argentino Antonio Di Benedetto, que ganhou fôlego internacional após a adaptação cinematográfica em 2017 por Lucrecia Martel, chegou este mês às livrarias portuguesas.

Lusa /

Considerado um dos grandes romances em língua espanhola do século XX, "Zama" foi originalmente publicado em 1956, mas só agora, mais de 60 anos depois, chega a Portugal, editado pela Cavalo de Ferro.

Reconhecido entre os seus pares - como Jorge Luís Borges, que disse de António Di Benedetto ter "escrito páginas essenciais" que o "comoveram e continuam a comover", ou o chileno Roberto Bolaño, que afirmou que "Zama" foi "escrito com o pulso firme de um neurocirurgião" -, este jornalista, guionista e escritor nascido em 1922 caiu no esquecimento após a sua morte, em 1986.

No entanto, a sua tradução para língua inglesa em 2016, que valeu à tradutora Esther Allen o `National Translation Award` e a sua adaptação para filme, com o mesmo nome, pela realizadora argentina Lucrecia Martel, em 2017, impulsionaram de novo o nome daquele que o Nobel da Literatura Coetzee considerou ser "um grande escritor" que todos deveriam conhecer.

O filme "Zama" mereceu a nomeação para vários prémios cinematográficos, entre os quais o Óscar de melhor filme estrangeiro, tendo valido ao diretor de fotografia português Rui Poças o prémio Platino de melhor direção de fotografia.

A consequente multiplicação de críticas em jornais e imprensa especializada trouxeram de novo à tona literária o nome Di Benedetto e do seu romance maior.

A revista The New Yorker, por exemplo, destacou que Di Benedetto, sendo um "leitor ardente de Dostoievski, sentiu-se naturalmente compelido a escrever sobre os estados extremos - obsessão, delírio, agressão selvagem -, conseguindo, contudo, fazê-lo sem o excesso retórico do século XIX", e acrescenta que "é difícil conseguir pensar num romance superior no que respeita à vida sangrenta na fronteira".

Trata-se de um romance de exílio, que reconstrói o passado, entrecruzando "qualidade filosófica" com uma "prosa deslumbrante", colocando-se na esteira de autores como Dino Buzzati ou Albert Camus, refere a editora.

Nesta senda, o escritor e ensaísta argentino Juan José Saer comparou-o a obras da prosa existencialista como "A Náusea", de Jean-Paul Sartre, e "O estrangeiro", de Albert Camus, mas foi ainda mais longe, considerando que, "pelas circunstâncias em que foi escrito e pela situação peculiar da pessoa que o escreve, `Zama` é, em muitos sentidos, superior a esses livros".

Zama é o nome do protagonista da história -- Don Diego de Zama -, um obscuro funcionário da coroa espanhola relegado para cumprir serviço na pequena cidade de Assunção, um canto remoto do império, na fronteira com a selva e nos confins da civilização, que sonha com um cargo de prestígio na capital da colónia, que resgate a sua vida.

Longe da família, afastado dos centros de poder, aguardando por notícias que tardam em chegar, Zama cai vítima de uma espera interminável, em que o próprio significado da sua existência se vai diluindo entre o sonho e a realidade, em imagens cada vez mais visionárias e delirantes que o levam ao limiar da loucura.

Antonio Di Benedetto começou a escrever e a publicar contos em adolescente, retirando muito da sua inspiração das obras de Dostoievski e Pirandello.

Em 1956, publicou "Zama", livro que lhe valeu na altura rasgados elogios por parte da crítica e dos seus pares, comparando-o aos melhores trabalhos de nomes como Proust, Cortázar ou Camus.

Em 1976, durante o regime ditatorial do general Videla, na Argentina, Di Benedetto foi encarcerado e torturado, permanecendo preso durante um ano.

Após a sua libertação, partiu para Espanha, onde se exila, regressando à Argentina apenas em 1984, dois anos antes da sua morte.

"Zama" é a primeira obra do escritor publicada em Portugal.

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