A dívida não é pública é "um roubo aos trabalhadores"

Lisboa, 12 out (Lusa) -- O livro "Quem Paga o Estado Social em Portugal", uma investigação económica coordenada pela historiadora Raquel Varela, defende que a dívida afinal não é pública e que o sistema está a "roubar" os contribuintes e os trabalhadores.

Lusa /

"A divida não é pública, é um mecanismo de acumulação de capital, ou seja é uma renda fixa para quem detém os títulos da dívida. A dívida produz juros e esses juros significam uma renda fixa para quem compra os títulos, nomeadamente o setor financeiro" disse à Lusa a historiadora Raquel Varela, da Universidade Nova, e coordenadora do trabalho publicado em livro e que é apresentado hoje em Lisboa.

O livro socorre-se de dados do Instituto Nacional de Estatística e do Eurostat, estabelece a relação "desigual" entre os impostos pagos pelos trabalhadores e os serviços prestados pelo Estado a que os contribuintes têm direito e conclui que o sistema está a "roubar" os cidadãos.

"É um sistema semi-moribundo, sobretudo depois da crise de 2008 que, para não morrer, socorre-se dos impostos. No livro, os modelos e as contas que foram feitas não são modelos marxistas que vêm da fórmula clássica de `que só o trabalho produz riqueza`, nem são modelos qualitativos" explica Raquel Varela.

Segundo a historiadora, mesmo fazendo as contas do "ponto de vista liberal" os trabalhadores estão a ser roubados e não devem nada a ninguém e isso leva à questão da dívida pública.

"A dívida pública é uma forma de acumulação de capital e com formas um bocado primitivas que é quase de expropriação. Para a dívida pública ser elevada e para o pagamento da dívida pública poder existir - para o pagamento do juro existir - tem de se expropriar os trabalhadores do seu salário direto através dos impostos ou dos cortes salariais e do seu salário social" refere a coordenadora do livro.

Sendo assim, áreas como saúde, educação, estradas, bem-estar, saneamento, segurança social e que são pagos pelos trabalhadores, são transferidos para um mecanismo de renda fixa que são os juros da dívida pública.

"Esperamos é que a discussão deixe de ser qual a parte da dívida que é legítima e que não é legítima e que passe a ser: quem deve dinheiro, porque esta chantagem sobre os trabalhadores de que a dívida pública subiu porque os trabalhadores andaram a gastar mais é falsa. Do ponto de vista económico é uma falsidade", acusa Raquel Varela.

"A dívida pública subiu em 2008 quando o Estado socorreu o setor financeiro, até ao momento isso não se passava e os trabalhadores não andaram a gastar de mais", afirma a historiadora que defende a reflexão sobre um novo modelo de sociedade.

"Nós temos de repensar um modelo de sociedade em que toda a gente trabalhe menos. Não podem uns trabalharem 16 horas e outros nada. O desemprego vai aumentar porque estas são medidas recessivas e isso implica desemprego. Na verdade, aquilo que se verifica na Europa do Sul é aquilo que já se verificava nos países periféricos. O desemprego é estrutural e veio para ficar. Portugal tem excesso de mão-de-obra", propõe Raquel Varela.

"Isto não é um modelo de sociedade que traga bem-estar às pessoas. Assistimos no país a fatores que nos deviam deixar apreensivos como o facto de abrirem cantinas porque o salário mínimo é tão mínimo e o desemprego é tão grande e os rendimentos sociais de inserção são tão vegetativos que há fome num país que tem toda a tecnologia para produzir o que se quiser" conclui Raquel Varela, coordenadora do livro "Quem Paga o Estado Social em Portugal".

 

 

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