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CFP: Portugal desviado das regras europeias de despesa e dívida

por RTP
António Pedro Santos - Lusa

O relatório divulgado esta terça-feira pelo Conselho de Finanças Públicas (CFP) estima que o ajustamento estrutural para 2018 fique abaixo do previsto pelo Governo, mas também do valor recomendado por Bruxelas. Na análise da instituição liderada por Teodora Cardoso, a proposta de Orçamento do Estado para 2018 (OE2018) vai cumprir as regras “apenas nos mínimos”. Centeno responde com ironia e considera que “já é um avanço” o reconhecimento do cumprimento das metas.

Segundo a análise da entidade responsável pela fiscalização do Orçamento, este que foi aprovado pelo Parlamento na generalidade na última semana, Portugal deverá registar “um desvio significativo” no objetivo da despesa em 2018. 

No relatório do Conselho de Finanças Públicas (CFP), divulgado esta terça-feira, a instituição de Teodora Cardoso alerta para a possível dívida das contas do Estado português em relação ao que é aconselhado após a saída do braço preventivo do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), em que o país está integrado desde que saiu do Procedimento por Défice Excessivo (PDE).

A instituição destaca que estão em causa três objetivos, nomeadamente a variação da despesa primária líquida de medidas discricionárias em matéria de receitas não exceder a taxa de referência de crescimento a médico prazo do PIB potencial, a regra transitória para a dívida pública e ainda a realização de progressos suficientes para atingir o objetivo orçamental de médio prazo. 

Em resposta às conclusões apresentadas pelo organismo, Mário Centeno reagiu com ironia e considerou que “já é um avanço” existir um reconhecimento em como as regras estão a ser cumpridas. 

“Já é um avanço dizer que se faz o mínimo para cumprir as regras. As instituições também vão amadurecendo as suas análises”, disse o ministro das Finanças em resposta às questões dos jornalistas, esclarecendo que a análise do CFP não corresponde à avaliação que é feita pelo Governo.

Mário Centeno sublinhou ainda que o Orçamento do Estado para 2018 é um documento de “consolidação orçamental” que promove o “crescimento inclusivo”. 

“Todos os indicadores económicos, desde o mercado de trabalho ao investimento, passando pelas exportações, são indicadores suficientemente positivos para que o esforço não seja mínimo”, acrescenta Centeno, considerando que as medidas são adequadas à situação presente do país.  
“Desvio significativo”
O CPF alerta que o desvio estimado poderá levar a uma avaliação global “que pode ser conducente à abertura de um procedimento por desvio significativo” e lembra que até 2019 “Portugal deverá fazer progressos suficientes com vista à redução do rácio da dívida”, no âmbito do PDE. Só em 2020 as finanças portuguesas ficam sujeitas à regra geral de diminuição de um vigésimo ao ano do montante que exceder os 60 por cento do PIB.

Segundo o organismo, o rácio da dívida pública prevista pelo Ministério das Finanças até 2021”não se encontra assegurado o cumprimento da regra transitória do excesso de dívida”. 

Para 2018, "o ajustamento estrutural linear mínimo necessário para assegurar o cumprimento do critério da dívida nesse ano exige uma variação do saldo estrutural de 0,5 pontos percentuais do PIB", um valor que, segundo a instituição, "não é atingido pela melhoria do saldo estrutural recalculado pelo CFP".

No entanto, o CFP admite que, usando a variação do saldo estrutural apresentada pela tutela, "o cumprimento do critério da dívida seria assegurado".
 
Quanto ao ajustamento estrutural, o CFP estima que o ajustamento estrutural para 2018 seja de 0,3 pontos percentuais do PIB, abaixo dos 0,5 pontos estimados pelo Governo e dos 0,6 pontos recomendados por Bruxelas.

No entanto, o CFP antecipa que o valor do saldo estrutural subjacente à proposta orçamental permitirá assegurar em 2018 uma margem de segurança capaz de responder às flutuações cíclicas “sem incorrer em situação de défice excessivo".
Conjuntura “favorável”
No documento divulgado esta terça-feira, o CFP acusa o ministro das Finanças de apresentar uma proposta orçamental “sobretudo empenhada em tirar partido da conjuntura favorável” e cumprir as regras orçamentais “apenas nos mínimos indispensáveis para obviar a desaprovação da Comissão Europeia”. 

Para o organismo liderado por Teodora Cardoso, o documento orçamental aproveita-se de “condições propícias da procura externa e dos mercados financeiras”, propondo medidas que “usam a margem daí decorrente”, traduzida no aumento da receita fiscal e contributiva e na redição de encargos com juros”. 

O CFP acusa ainda o executivo de usufruir de “toda a ambiguidade das regras” para transmitir uma “imagem de cumprimento” do PEC, sem que esses objetivos se reflitam efetivamente na sua “natureza estrutural”. 

“O cumprimento destas regras supõe um compromisso com os princípios que, estando implícitos na formulação da regra, vão para além do cumprimento anual da sua expressão numérica”, sublinha o relatório.
 
“A correção do efeito cíclico é particularmente falível nas circunstâncias da economia portuguesa”, sendo que não deve ser desvalorizada “a importância dos indicadores estruturais”, fazendo uso de informação “microeconómica e qualitativa” de forma a dar prioridade à “eficiência das despesas públicas”, bem como a “à política fiscal que fomente o investimento e a poupança do setor privado”.
Alertas para a despesa com pessoal
Ainda no documento orçamental, o CFP considera que a despesa com pessoal prevista para 2018 está “claramente subavaliada” e que o abrandamento do ritmo de crescimento “não parece ser compatível com as medidas previstas”, nomeadamente o início do descongelamento de carreiras, a reposição da aplicação de instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho, a reposição do regime de trabalho suplementar ou extraordinário ou ainda do programa de regularização extraordinária dos vínculos precários nas administrações públicas. 

O Conselho de Finanças Públicas refere que esta subestimação das despesas com pessoal já aconteceu no último documento orçamental. Em 2017, estava previsto um acréscimo de 94 milhões de euros face ao ano anterior, mas registou-se, segundo as estimativas mais recentes das Finanças, um acréscimo de 528 milhões de euros, quando se previa apenas um investimento de mais 94 milhões em relação ao ano anterior. 

Para 2018, o Governo estima um acréscimo de “apenas 71 milhões de euros” em relação ano ano anterior. A instituição liderada por Teodora Cardoso vê estes números com desconfiança e considera que a dotação de despesas com pessoal terá novamente de ser reforçada com contrapartida na dotação provisional ou na reserva orçamental. Uma situação que, considera a instituição, “contribui para reduzir a transparência do orçamento”.
Esforço estrutural "insuficiente"
O mesmo documento refere ainda que o ajustamento estrutural previsto para o OE2018 deverá ser de 0,3 pontos percentuais do PIB, abaixo dos 0,5 pontos estimados pelo Governo e metade do valor recomendado por Bruxelas (0,3 pontos percentuais), valores que excluem os efeitos do ciclo e as medidas temporárias.

Para o CFP existem quatro divergências com o Ministério das Finanças no que diz respeito à classificação como medidas temporárias: a receita adicional de 235 milhões de euros no IRC em 2017, que deverá ter impacto contrário em 2018, a conversão de ativos por impostos diferidos (passa de 160 milhões em 2017 para 120 milhões em 2018), os lesados do BES (150 milhões em 2017) e os pagamentos à Grécia no âmbito do programa de resgate ao país (83,6 milhões em 2018).

Em declarações à agência Lusa já depois da divulgação do relatório, Teodora Cardoso considera que a proposta orçamental é "insuficiente" em matéria de ajustamento estrutural, havendo um "sério risco" de constituir uma oportunidade perdida.

Para a repsponsável pelo CFP, a proposta orçamental "tira muito partido do bom comportamento das receitas", por sua vez "muito ligado ao crescimento da economia. Teodora Cardoso destaca que o documento consagra "aumentos de despesa rígidos", por exemplo com pensões e com pessoa.l,, e que esse crescumento "não está acompanhado de uma reforma da administração pública".

Teodora Cardoso diz que essa reforma é "absolutamente encessária em Portugal" e que não consiste "apenas em subir e descer ordenados".

c/ Lusa
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