Clube Viação Clássica recupera autocarros históricos sem apear o mundo digital

por Lusa

Associados do Clube Viação Clássica, fundado em 2014, reúnem-se aos sábados entre a Maia e Oliveira do Bairro para recuperar autocarros históricos que circulavam nas estradas portuguesas, dinamizando também passeios que até entram no mundo digital dos simuladores.

"O nosso trabalho é sobretudo aos sábados. Nós dividimo-nos em duas estruturas. Neste momento estamos aqui na Maia, onde temos dois veículos pertencentes ao clube, e temos também uma oficina, que é onde nós realizamos o restauro e todos os trabalhos de conservação e manutenção, que se situa em Oliveira do Bairro", disse à Lusa Leandro Ferreira, o gestor de projetos de Tecnologias de Informação, de 36 anos, que preside ao clube.

Falando nas instalações da MaiaTransportes, naquele concelho do distrito do Porto, o responsável do clube explicou que atualmente tem "cerca de 100 associados", contando ainda com o apoio de "empresas parceiras".

"Maioritariamente são particulares que gostam desta temática, alguns com ligação à temática dos transportes em si e outros só por uma questão de saudosismo, pela memória que têm da infância ou das suas deslocações no dia a dia", explicou à Lusa.

Além dos restauros, o clube organiza passeios culturais para sócios ou abertos à comunidade, e também participa em eventos, como foi o caso do Porto By Night, em 2019.

Circundadas pelo barulho dos motores dos autocarros modernos, nas instalações de um dos atuais operadores rodoviários da Área Metropolitana do Porto (AMP), as `estrelas da companhia` são mesmo os velhinhos veículos do Clube Viação Clássica.

Ali repousa um Volvo B58 de 1977, clássico laranja ex-Sociedade de Transportes Coletivos do Porto (STCP), a primeira aquisição do clube e recuperado pelos sócios, que saiu para um passeio matinal, tal como habitualmente acontece nos dias das atividades associativas.

Outro veículo que já pertenceu à STCP é o verde Leyland Atlantean, de 1967, um `double-decker` [autocarro de dois andares] de estilo britânico que marcou uma era no transporte rodoviário no Porto, e que o próprio clube considera como o mais icónico da sua frota.

Originalmente instalado "num espaço arrendado próximo de Vila do Conde", no distrito do Porto, o Clube Viação Clássica teve de se relocalizar também para Oliveira do Bairro, no distrito de Aveiro, devido à venda do imóvel por parte do senhorio.

"As nossas fontes de receitas são sobretudo as quotas e o resultado dos passeios, não temos apoios de espécie financeira alguma, portanto, temos necessidade de procurar um espaço que vá ao encontro da nossa disponibilidade, e só mesmo em Oliveira do Bairro é que foi possível encontrar este pequeno espaço de trabalho", disse à Lusa Leandro Ferreira, já nas novas instalações.

Num armazém coberto, à porta da cidade, estão mais quatro veículos, entre os quais um Toyota Dyna de 1980, adquirido à Associação Portuguesa e Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental (APPACDM) de Viseu, um veículo típico de escolas/colégios/instituições desportivas entre os anos 80 e 2000, segundo o clube.

Há também mais dois autocarros da marca Volvo: um B59 da Carris (Lisboa), de 1975, doado pela Fundação Salvador Caetano (ainda por recuperar), e um B10M de 1986, doado pela Horários do Funchal (o primeiro por empresas de transportes) com o apoio da Auto Sueco, que assegurou o transporte por via marítima entre a Madeira e o continente.

Entre cheiros e sons característicos de uma oficina, atualmente em restauro por parte dos associados está uma camioneta UTIC Europa, com mecânica inglesa AEC de 1967 e carroçaria produzida pela UTIC, em Vila Nova de Gaia, nos anos 80.

"O restauro é sobretudo financiado pela nossa comparticipação, seja a nível de quotas, seja por donativos espontâneos que fazemos. O que nós vemos aqui é não só mão de obra dedicada, voluntária e grátis, mas há também uma componente financeira muito forte nossa, para conseguir que isto se torne realidade", contou.

Segundo Leandro Ferreira, o restauro da UTIC Europa "já se prolonga há mais de três anos" e é o "projeto mais ambicioso" do clube neste momento, tendo já sido feito "o trabalho de recuperação de chapa e estrutura".

"A fase seguinte, então, é prepará-lo para pintura e posteriormente irá levar a decoração da antiga Rodoviária Nacional, e estará pronto a circular nas estradas, indo ao encontro do saudosismo das pessoas que viveram este tempo, desta grande empresa de transportes", disse à Lusa.

A previsão do clube é ter o restauro finalizado na primavera do próximo ano, período em que pretende avançar para uma recuperação funcional do Leyland de dois andares, para permitir a sua circulação, e depois prosseguir com os trabalhos de restauro aprofundado do Volvo B59, da Carris.

Mas nem só de saudosismo se faz o Clube Viação Clássica: as viagens do agrupamento também entram no mundo virtual, através de um simulador, como explicou à Lusa o associado Joaquim Martins, de 30 anos.

"Partindo de um jogo chamado Omsi, procedemos à aquisição do jogo, como é evidente, e a seguir à digitalização de um posto de condução de um autocarro antigo, de forma a que todos os botões deles fossem compatíveis com o jogo", partilhou.

O associado disse ainda que a nível pessoal a experiência também é enriquecedora.

"Eu não tenho carta de pesados nem de ligeiros, portanto acho bastante interessante e acabo por ter uma ideia do que é realmente conduzir um autocarro", disse.

O gestor de comunicação e `marketing` confessou ainda que do que gosta mais é da "visão do motorista", e de "ter que cumprir os horários, os passageiros que querem entrar e querem sair, toda essa situação".

O simulador já esteve aberto ao público na exposição Automobilia, em Aveiro, em maio, e tanto "antigos motoristas quiseram reviver um pouco o passado do mundo da camionagem, neste caso o transporte rodoviário, como crianças quiseram experimentar o que é, realmente, conduzir um autocarro".

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