Dependência do mercado chinês provoca grandes perdas no jogo em Macau

por Lusa

Analistas disseram hoje à Lusa que a indústria do jogo vai sofrer grandes perdas nas receitas por causa do surto do novo coronavírus, porque o território não soube diversificar a economia e combater a dependência do mercado chinês.

O primeiro caso do novo coronavírus chegou a Macau na semana passada, dias antes da semana de celebrações do Ano Novo Lunar, altura em que os casinos normalmente registam enchentes e avultados ganhos provenientes das apostas dos milhares de turistas da China continental.

"As receitas irão sofrer e muito. Penso que (...) 80-90 por cento menos do que no ano anterior no jogo", disse à Lusa o advogado português especialista na área do jogo Pedro Cortés.

"Estamos a falar de receitas brutas iguais às dos tempos iniciais pós liberalização", no início do milénio, sustentou.

As chegadas de visitantes a Macau durante a chamada "semana dourada" do Ano Novo Lunar, entre 24 de janeiro e hoje, desceram 76,5% comparativamente a igual período de 2019, indicou o `site` dos Serviços de Turismo. A situação agrava-se com o número de visitantes provenientes da China continental: apenas 139.580 visitaram Macau, menos 81,7% comparando com o período das celebrações da entrada do ano do porco, no ano passado.

A China suspendeu, esta semana, a emissão de vistos individuais para fora do país.

"O coronavírus vai ter um impacto significativo, o mercado do jogo costuma ter um grande impulso na altura no Ano Novo chinês", com vários eventos e espetáculos de entretenimento que foram cancelados, explicou à Lusa o professor em Gestão Internacional de `Resorts` Integrados da Universidade de Macau Glenn McCartney.

"Todas estas oportunidades para [os jogadores] gastarem dinheiro foram canceladas", reforçou o professor.

Também o fundador da consultora especializada em regulação de jogos em Macau Newpage Consulting, David Green, corroborou com estas opiniões.

"O facto de esta emergência ter ocorrido antes do Ano Novo chinês agrava o impacto. O incógnito agora é quanto tempo essa situação continuará. Um surto prolongado pode ser extremamente prejudicial para a indústria de casinos em Macau", frisou David Green.

O facto de a economia de Macau ser, por um lado, altamente dependente da indústria do jogo e, por outro, a esmagadora maioria dos turistas serem da China continental (mais de 27 milhões em 2019) faz com qualquer fator adverso prejudique gravemente a economia da capital mundial do jogo, criticaram os analistas.

"Isto é o que acontece quando apenas se confia numa fonte", criticou Glenn McCartney, esperando que este acontecimento "possa ser uma lição para o futuro".

Na mesma linha de raciocínio, Pedro Cortés afirmou que "o essencial é perceber se é desta que, de uma vez por todas, o Governo de Macau toma a questão da diversificação muito a sério".

"Não podemos estar dependentes apenas do jogo. Temos de diversificar", frisou.

A China elevou para 170 mortos e mais de 7.700 infetados o balanço de vítimas do novo coronavírus detetado no final do ano em Wuhan, capital da província de Hubei (centro).

O Governo de Macau anunciou o prolongamento até sexta-feira dos feriados do ano novo chinês para a função pública, medida que foi adotada por várias empresas privadas, para diminuir o risco de contágio do novo coronavírus chinês, depois de ter sido registado no território o sétimo caso importado de infeção.

Esta diminuição de turistas poderá ter um impacto ainda maior sobre o jogo se considerarmos a tendência verificada no ano passado. As receitas provenientes das grandes apostas em Macau atingiram 135,228 milhões de patacas (15,152 milhões de euros) em 2019, menos 18,6% face a 2018, com o jogo VIP a perder o estatuto de segmento mais preponderante nas receitas globais, dando lugar ao jogo de massa.

De acordo com dados divulgados pela Direção de Inspeção e Coordenação de Jogos (DICJ), este valor, angariado nas salas de grandes apostas dos casinos, representou menos 30,869 milhões de patacas (3,459 milhões de euros) do que no ano anterior.

A acrescentar a esta perda junta-se o facto de o jogo VIP ter perdido para o segmento de massas a posição mais dominante na capital mundial do jogo: pelo menos nos últimos cinco anos, as grandes apostas representaram mais de 50% das receitas globais.

Em 2019, o jogo VIP representou apenas 46,2% do total das apostas angariadas.

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