Empresa luso-americana vítima do "fim da propriedade privada nos EUA"

Ao fim de quase 30 anos de actividade, a empresa Amaral Auto Sales, de Harrison, Nova Jersey, vai fechar as portas vítima de expropriação governamental por estar integrada numa área destinada a um plano de desenvolvimento económico.

Fernando Santos, Agência LUSA /

Esta empresa luso-americana deveria ter encerrado as portas às zero horas de terça-feira, mas obteve um adiamento administrativo de 10 dias que espera poder prolongar até ao dia 30 de Junho.

O grupo Americans for Prosperity, que tem vindo a defender o direito constitucional à propriedade privada, levou no passado dia 11 de Maio para a Internet a luta da família Amaral colocando um vídeo sobre este caso no portal YouTube (http://www.youtube.com/watchv=JL7Ei6gAzTE ).

De instância em instância judicial, o luso-americano Manny Amaral não conseguiu a semana passada que o Supremo Tribunal do estado de Nova Jersey suspendesse a ordem de entrega da propriedade a partir das zero horas de terça-feira, apesar de correr no Tribunal de Apelos estatal uma contestação judicial da expropriação.

Assediado nos últimos anos com a iminência da expropriação, Manny Amaral disse ter gasto desde então "centenas de milhares de dólares" para defender aquilo que é seu, registando ainda o que ele considera "perdas enormes".

"As perdas são enormes, física, moralmente e no negócio. Tenho de começar tudo de novo, posso estar fora do negócio amanhã e na bancarrota no dia seguinte..." - disse à Lusa Manny Amaral, desgostoso com o facto de não recebido qualquer consideração dos poderes constituídos para os quais paga impostos há quase três dezenas de anos.

"Já não há gente boa" - disse o empresário, que pretendia ver a firma integrada nos planos de desenvolvimento da área.

Esta empresa luso-americana é mais uma das vítimas do que está a ser considerado "o fim da propriedade privada nos Estados Unidos da América" desde que em 23 de Junho de 2005 o Supremo Tribunal do país definiu o que é "uso público" no contexto da Quinta Emenda da Constituição federal.

A Quinta Emenda da Constituição dos Estados Unidos prevê a expropriação apenas em caso da propriedade privada se destinar a uso público: "...nem será tomada propriedade privada para uso público sem justa compensação" - diz a Emenda constitucional, sendo historicamente interpretado como uso público a construção de estradas, escolas e outras estruturas destinadas ao bem comum.

O conceito de bem comum, contudo, tem vindo a ser alargado pelo Supremo Tribunal do país.

Numa decisão do Supremo Tribunal dos Estados Unidos de 1954 ("Berman vs. Parker") foi estabelecida a doutrina de que o desenvolvimento económico por entidades privadas é um bem público se eliminar áreas degradadas e se houver justa compensação.

Em 23 de Junho de 2005, o Supremo Tribunal dos Estados Unidos alargou ainda mais o conceito de bem público, numa controversa decisão tomada por 5-4 votos.

O tribunal decidiu que os governos podem expropriar casas, lotes ou negócios quando estão em áreas identificadas para o desenvolvimento económico, considerando como bem público o facto de tais projectos de desenvolvimento renderem mais impostos para os cofres públicos do que as estruturas prediais existentes na mesma área.

Esta decisão pôs à solta todos os empreiteiros com ligações políticas pressionando os governos locais a declararem áreas de desenvolvimento económico as zonas mais apetecíveis de cada municipalidade.

Os perigos deste acórdão foram denunciados logo em pleno Supremo Tribunal pela porta-voz dos juizes vencidos, a ex- juiza moderada Sandra O`Connor: "Os beneficiários serão os cidadãos com desproporcionada influência e poder no processo político, incluindo as grandes companhias e as firmas de desenvolvimento económico" - escreveu Sandra O`Connor pela minoria.

Este acórdão de 2005 foi considerado situar-se na linha do crescente desrespeito pelos direitos constitucionais dos cidadãos americanos graças à nomeação de juizes conservadores para o Supremo Tribunal da nação por parte das administrações republicanas.

A decisão de Junho de 2005 do Supremo Tribunal foi tomada na sequência da apreciação do caso "Kelo vs. New London", no qual a residente de New London, no estado de Connecticut, Susette Kelo, contestava o direito do município de New London de lhe confiscar a casa junto àcosta para entregar a área a um projecto privado de desenvolvimento económico, que incluía um hotel, um ginásio e escritórios.

Entretanto, confrontado com a expropriação e uma indemnização que considera ficar aquém do valor e prejuízos sofridos, Manny Amaral procura nova localização para a empresa, que não pode ficar longe dos clientela que foi construindo ao longo dos últimos 30 anos.

Como disse, pode sair de uma pequena empresa próspera como a que geria para uma situação de colapso comercial e de bancarrota sem que a autarquia, eleita pelo povo, se preocupe com isso.

FSA.

Lusa/Fim


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