Empresários pedem mais escoltas em Macomia

Os empresários de Cabo Delgado apelaram ao Governo moçambicano para duplicar as atuais escoltas das forças de segurança em Macomia, ao longo de 100 quilómetros até Awasse, Mocímboa da Praia, travando ataques de grupos extremistas a transportadores.

Lusa /

Só entre março e julho deste ano, aquele troço da estrada N380 registou 104 ataques a transportadores, com os atacantes a exigirem o pagamento de resgates para permitir aos automobilistas seguirem viagem, levando os empresários a pressionar o Governo a retomar as escoltas militares, explicou hoje à Lusa o presidente do conselho empresarial de Cabo Delgado.

"Do dia 23 [de julho, retoma das escoltas naquele troço] até hoje ainda não temos incidentes. Pelo menos até hoje estamos felizes com o trabalho que está sendo feito no campo e esse trabalho resultou do diálogo com o Governo", disse Mamudo Irache.

Há uma semana que a escolta acontece uma vez por dia em cada sentido, saindo de Macomia às primeiras horas da manhã, para garantir uma viagem de quase três horas em segurança a centenas de transportadores, comerciantes, empresários e passageiros.

Mas para os empresários de Cabo Delgado, é preciso mais: "Estamos a trabalhar com o comando provincial para ver se a escolta se faz duas vezes por dia".

"Estamos a negociar com o comando provincial da Polícia da República de Moçambique [PRM] para ver se uma escolta dorme em Awasse e outra escolta dorme em Macomia, para fazer um cruzamento no caminho. Mas é um trabalho que está sendo feito junto com o Governo, provavelmente nos próximos dias vamos ter o resultado", explicou Irache, que representa em Cabo Delgado a Confederação das Associações Económicas -- CTA, maior representante do setor privado moçambicano.

Desde a reintrodução destas escoltas, que tinham terminado há mais de um ano, os ataques terminaram, conta o representante dos empresários locais.

"Uma coisa que nunca tínhamos visto daquela forma, já havia acontecido, mas não é como aconteceu neste período (...). Pegavam os carros, mandavam parar e aí era vasculhar. E sem pagar não tinha como tirar o carro. Ou queimavam ou pagavam. E uma das formas para não perder o carro era pedir apoio e fazer o pagamento", recorda.

"Na verdade, o pagamento era na hora. Não ia dizer que vou transferir amanhã, não. É na hora", explica ainda, apontando que alguns empresários chegaram a ter de transferir, via carteira digital, 350 mil meticais (4.800 euros) para não perder as viaturas e mercadorias, enquanto os passageiros tinham de transferir acima de 10 mil meticais (135 euros).

"Os valores eram transferidos. Agora, a questão que nos colocavam, estamos a transferir os valores. Que conta é? A conta é de quem? Mas como não é a nossa responsabilidade, deixamos as autoridades fazerem essa investigação. Provavelmente estão a fazer o trabalho", acrescenta.

Atualmente, diz ainda Mamudo Irache, sem escolta militar, a recomendação é para não se circular naquele troço da N380, uma das poucas vias asfaltadas da região.

"Nós já alertámos os nossos transportadores, e os transportadores estão a acatar as ordens, que não podem seguir sem escolta. Porque quando acontecer um incidente, nós não temos como justificar. Se pedimos a escolta, temos que obedecer à escolta", explicou, reconhecendo que a necessidade das mesmas está limitada atualmente ao troço entre Macomia e Mocímboa da Praia.

O apelo já chegou ao governador da província de Cabo Delgado, Valige Tauabo: "O que é trazido pelas comunidades, mesmo pelos nossos empresários, é tudo válido. Queremos que a nossa população esteja bem, queremos que os nossos empresários, os nossos comerciantes realizem as suas atividades da melhor forma, segura".

Tauabo recordou que, "durante muito tempo", a N380 "não requeria a intervenção de haver uma escolta" e os automobilistas podiam circular "livremente, cada um à hora que quisesse", mas o receio e os ataques mudaram o cenário nas últimas semanas.

"Agora há pedido para o reforço. O reforço é todo ele bem-vindo (...). Vai-se avaliar e dentro das estratégias das Forças de Defesa e Segurança, haveremos de ouvir. Se for aprovado, é o que nós mais queremos. E, a não ser aprovado, quer dizer que há outra forma [para que se] esteja a fazer o trabalho de proteção sem que os automobilistas passem por algum perigo", acrescenta o governador.

A província de Cabo Delgado, situada no norte do país, rica em gás, enfrenta desde 2017 uma rebelião armada, que provocou milhares de mortos e uma crise humanitária, com mais de um milhão de pessoas deslocadas.

O governador reconhece um recrudescimento da atividade destes grupos extremistas nos últimos três meses, mais acentuada desde final de junho, nomeadamente no sul da província, que só nos últimos dias provocaram milhares de deslocados, em fuga para Chiúre e para a vizinha Nampula.

Mamudo Irache, também ele empresário do ramo dos transportes de carga e agricultura, com quase uma centena de trabalhadores em Cabo Delgado, recorda os impactos dos ataques no seu negócio, que lhe provocou prejuízos de mais de sete milhões de meticais (95 mil euros) num ataque em 2021: "Em Quissanga perdi dois carros. Um de transporte de passageiros e um de carga. E o escritório foi queimado. Então é um sentimento de sofrimento".

"Uma perda muito grande", desabafa o empresário, que atualmente tem uma frota de 28 viaturas de transporte que ligam as províncias de Cabo Delgado, Niassa, Zambézia e Niassa.

Tópicos
PUB