Euronavy aposta em projectos da Petrobrás e mercado asiático, do Vietname à China no sector das tintas
Lisboa, 27 Jan (Lusa) - Apesar do ambiente resistente à mudança, a Euronavy impôs-se no sector das tintas "verdes" em Singapura, Brasil e EUA, apostando agora em mais projectos da petrolífera Petrobrás e mercados do sudoeste asiático, Vietname ou China.
A Euronavy é hoje uma companhia de vanguarda tecnológica dos mercados de tintas ecológicas para protecção anticorrosiva em áreas como a naval e o offshore (plataformas petrolíferas), sendo inclusive a única empresa não americana que fabrica tintas para os navios da armada dos EUA (US Navy). O produto é único no mundo e chama-se: ES301.
Mas nem sempre assim foi. Na verdade, segundo contou em entrevista à agência Lusa o presidente da Euronavy, Mário de Paxiuta Paiva, esta empresa de raiz portuguesa que é hoje mais facilmente reconhecida além-fronteiras, resultou de um "brainstorming" entre cinco engenheiros que há mais de 25 anos procuravam "a solução ideal para resolver problemas de anti-corrosão".
Sem vaidade, Mário Paiva lembra um artigo publicado em 1995 num jornal brasileiro em que um responsável de uma empresa concorrente no sector desvalorizava a Euronavy, caracterizando-a como "uvas muito verdes, se é que são uvas".
"Depois disso ganhámos-lhes [a essa empresa] praticamente todos os projectos das plataformas petrolíferas, sendo que o valor típico de um projecto destes ronda os 6 milhões de dólares", adiantou.
Hoje, a marca Euronavy (produtos e cadeia de valor) vale 30 milhões de euros, tendo as suas vendas mais do que quintuplicado entre 2001 e 2007, ano em que alcançaram os 12 milhões de euros, destinando-se mais de 95 por cento ao estrangeiro.
Apesar disso, acrescenta, em Portugal a empresa "continua a não ter importância".
"Onde é que fomos importantes em Portugal? Em obras de especialização como a pintura da ponte Luís I no Porto, os tanques de refinaria da Petrogal, em Sines, e as chaminés da Portucel. Mas por exemplo vendemos `zero` à marinha de guerra portuguesa. Ou melhor, não é `zero`, porque a Euronavy iniciou o fornecimento de tintas à HDW (Grupo ThyssenKrupp) no âmbito da construção dos dois novos submarinos encomendados pela Marinha Portuguesa ao consórcio Alemão vencedor do concurso", gracejou.
Segundo contou à Lusa, de 1982 a 1987, a empresa foi apenas um laboratório.
"Queríamos desenvolver as tecnologias que já na altura entendíamos que iriam ser o futuro e `canibalizar` as então existentes. Pensámos numa solução integrada que passava pelo produto, sua aplicação e desse resposta às necessidades dos clientes em quatro vertentes: qualidade, preço, produto `amigo` do ambiente e da saúde", lembrou.
Apesar de serem mais caras por litro, as tintas da Euronavy acabam por sair mais baratas, quando aplicadas, uma vez que o prazo de duração varia entre os 15 anos, no caso dos navios, e os 25 anos, no caso das plataformas petrolíferas, e utilizam esquemas inovadores.
Em vez de abrasivos e secos, altamente poluentes, usam água como meio de decapagem (hidrodecapagem) que depois tratam e reutilizam.
Algumas tintas são ainda tolerantes à humidade, podendo algumas delas ser aplicadas debaixo de água, e têm maior aderência.
Foram necessários cinco anos de grande aposta em investigação e desenvolvimento, "com mais e menos falhanços", para a entrada da Euronavy no mercado, mas, como sublinha Mário Paiva, "sempre com muita cerimónia", até porque o projecto esbarrou desde logo com a primeira resistência.
"Uma coisa aprendemos logo: na época não íamos longe em Portugal, não íamos ter mercado. O mercado nacional sempre foi e ainda é muito relutante à mudança. Ninguém analisa um projecto, sabendo o que vai ser, mas o que já foi. Quando a gente prova o que já foi, já não precisa", ironiza Mário Paiva.
O arranque da empresa no mercado português, mas com grupos estrangeiros, antecipava o sucesso que viria a alcançar em mercados externos, sobretudo a partir de 1993 quando entrou em Singapura, ainda que com "algum desconforto" face às reservas apontadas pelo mercado asiático.
"Fui a Singapura falar com o director-geral de uma empresa a quem eu estava a querer convencer da bondade dos nossos produtos e vender uma coisa que nunca se tinha vendido em lado nenhum do mundo. E ele só disse: Como é que me quer convencer de que o seu sistema é melhor do que um francês, alemão, inglês ou americano, se Portugal não tem nenhuma tradição em investigação?`", contou.
Minutos depois, Mário Paiva abandonava irritado as instalações da empresa sem quaisquer perspectivas de negócio.
Enganou-se: "O director da empresa mandou testar os nossos produtos e pintar uns painéis, meteu-os dentro de uns tanques com água salgada e uns meses depois ligou-me... o produto era interessante", disse.
O primeiro contrato ficou assim fechado com a Neptune Orient Lines, de Singapura, para a pintura de tanques de lastro de um navio.
"Singapura continua a ser o nosso primeiro mercado. Criámos, montámos e entregámos uma empresa, que já está em velocidade de cruzeiro, a um parceiro estratégico - Entraco", disse Mário Paiva, revelando também que pretende construir ali uma fábrica dentro de dois anos, que servirá também "clientes que estão a emergir na Malásia".
Contudo, o passo mais importante foi a entrada no mercado dos EUA.
A conhecida reputação da US Navy como entidade científica de elevada exigência e rigor e o seu complicado processo de certificação contribuiu para que os ecos do produto inovador da Euronavy chegassem ao Brasil.
Este é aliás um mercado onde a empresa está actualmente "muito concentrada", possuindo já uma subsidiária desde o ano passado e onde vai instalar uma fábrica no Recife, num investimento de 10 milhões de euros.
"Deu para nos sentarmos à mesa dos departamentos técnicos das petrolíferas Petrobrás, Chevron, Móbil, e da SNCF - caminhos-de-ferro franceses. E depois, através da Petrobrás, também já alavancámos novos clientes como a Transocean, que lidera o mercado mundial da perfuração de petróleo, e já em 2008 a norueguesa Aker para um novo projecto de renovação de plataformas de exploração petrolífera no sudoeste asiático", adiantou.
Estimando que o volume de negócios da casa-mãe não ultrapasse os 13 milhões de euros este ano, Mário Paiva é peremptório: "Esse volume de negócios vai implicar um crescimento muito grande da Euronavy mas fora de Portugal".
O empresário acrescenta que "na unidade de Setúbal o crescimento não é previsível e mesmo quando isso acontece a empresa vai deslocalizando", explicando que esta fábrica está reservada para a produção de bases de concentrados de alto valor acrescentado vendidas depois para outras unidades, sendo assim assegurada a confidencialidade do know-how.
"Também temos projectos no Vietname, com a empresa Vinashin que acabou de nos entregar os primeiros três navios de um total de 54, o que deverá totalizar um volume de negócios na ordem dos 38 milhões de euros nos próximos 10 anos", adiantou.
Na China, a empresa portuguesa também "vai fabricar, mas em fábrica alheia", encontrando-se em fase de criação a Euronavy China que estará concluída no primeiro semestre deste ano, iniciando a produção no fim do ano.
Quer no Bahrein, quer no Dubai, a aposta passa por um escritório comercial e Angola "é um projecto para o futuro - dentro de dois/três anos -, mas não uma prioridade".
Num mercado onde a maior parte dos seus concorrentes são gigantes multinacionais, facturando cinco mil milhões de euros, a Euronavy sabe que "para sobreviver tem de ser melhor em tudo" e orgulha-se de ter ocupado o seu próprio espaço e de ter "muitos bons clientes em carteira".
"Uma empresa passa por várias fases: uma é quando a empresa é mais pequena do que a pessoa que a faz. Depois há uma altura em que começa a entrar gente, e em que a empresa tem de ser maior que a soma das pessoas que lá estão. É nesta fase que nós estamos", afirma.
Em Portugal, a Euronavy tem entre outros clientes como a Petrogal, a Portucel e a EDP.
JMG