Incerteza em África devido a possível fim da Lei de Comércio Preferencial dos EUA
Trabalhadores e indústrias africanas preparam-se para o fim de um antigo acordo comercial com os Estados Unidos que dava acesso preferencial aos exportadores de África e agora deixa as empresas vulneráveis a novas pressões competitivas e tarifas.
A África Subsaariana encara com incerteza a potencial extinção da Lei de Crescimento e Oportunidades para a África (AGOA, na sigla em inglês), um programa norte-americano de acesso comercial preferencial que beneficia mais de 30 países do continente e que expira hoje, num contexto marcado pela guerra comercial travada pelo Presidente norte-americano, Donald Trump.
"O acesso ao mercado dos Estados Unidos pode deteriorar-se ainda mais para muitos países africanos se a AGOA não for renovada antes do prazo de vencimento em 30 de setembro de 2025", alertou a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) num comunicado na segunda-feira.
Considerada um elemento-chave nas relações económicas entre Washington e a África, essa lei, aprovada em 2000 pelo ex-presidente Bill Clinton (1993-2001), procura impulsionar a industrialização do continente e ajudar dezenas de países a escapar da pobreza.
A AGOA também é vista como uma ferramenta estratégica de influência em África, dada a presença crescente da China.
O programa beneficiou amplamente países como Madagascar, Lesoto e África do Sul e, em todo o continente, permitiu que dezenas de Estados exportassem quase 7.000 produtos para os EUA, desde setores como a agricultura a têxteis, até metais e combustíveis, embora o seu impacto tenha sido desigual na região.
Os benefícios do AGOA foram limitados nos últimos meses pelas medidas protecionistas implementadas por Trump após regressar à Casa Branca em janeiro, que resultaram na imposição de tarifas entre 10% e 30% a dezenas de países africanos, em vigor desde 07 de agosto.
"As tarifas recíprocas anulam efetivamente a preferência que os países da África Subsaariana desfrutam sob a AGOA", disse o ministro das Relações Internacionais e Cooperação da África do Sul, Ronald Lamola, em abril passado, cujo país agora enfrenta a maior taxa tarifária da África Subsaariana (30%).
De acordo com a UNCTAD, o fim da AGOA pode aumentar as tarifas sobre as exportações do Lesoto para mais de 30% (aumentadas para 15% pelo Governo Trump este ano), as tarifas sobre as exportações do Quénia para 25% (atualmente 10%), entre outros.
O fim desse programa causaria um "impacto agravado" nas economias desses países, como no Lesoto, que declarou estado de desastre nacional em julho passado devido à perda massiva de empregos.
"A competitividade das exportações africanas no mercado dos EUA pode diminuir rapidamente num momento de intensificação da competição por mercados de exportação alternativos em todo o mundo", alertou o órgão da ONU.
Diante dessa crise, vários países africanos têm mantido negociações bilaterais com Washington nos últimos meses, na tentativa de chegar a acordos comerciais.
A AGOA foi um dos tópicos de discussão na reunião realizada na semana passada entre o Presidente queniano, William Ruto, e o secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio, à margem da 80ª Assembleia Geral da ONU.
À medida que procuram expandir-se para novos mercados --- como a Ásia e o Médio Oriente --- os Governos africanos agora veem mais do que nunca a necessidade de fortalecer os laços comerciais dentro do continente através do Acordo de Livre Comércio Continental Africano.