"Lóbi" em Portugal deve ser regulamentado, "credibilizado"- especialista
A falta de regulamentação para o sector do "lóbi" em Portugal está directamente a afectar a capacidade nacional de intervenção em espaços com a União Europeia e ao mesmo tempo a prejudicar a democracia e competitividade nacionais.
Martins Lampreia falou à Agência Lusa em Madrid, onde apresentou a versão espanhola do seu último livro, intitulado "Lóbi - Ética, Técnica e Aplicação", o primeiro título publicado em Espanha pela Texto Editores, que recentemente entrou no mercado espanhol.
"Em Portugal o lóbi tem má fama porque a maioria das pessoas confunde-o com tráfico de influências, corrupção, de máfias. A própria imprensa, quando fala de lóbis fala quase sempre num contexto negativo, referindo-se à pressão dos lóbis dos sectores", afirmou.
"Mas um lobista não é mais que um intermediário entre uma área da sociedade civil e os decisores, o poder legislativo e executivo. Ao fim e ao cabo pressionar os poderes públicos em prol dos interesses de um ou outro sector da sociedade civil", afirmou.
E se em Portugal essa prática é associada à falta de transparência ou à influência dos grupos mais poderosos, noutros países é um sector profissional e regulamentado onde o trabalho dos lobistas, os seus clientes, os seus objectivos e até os seus salários, são conhecidos.
"Em Portugal temos medo de conjugar o verbo pressionar, mas em democracia é perfeitamente legítimo a sociedade civil pressionar os poderes públicos na defesa dos seus interesses. Sempre se fez isso", afirmou Martins Lampreia.
"Mas pressionar de forma transparente, ética e profissional. Continuamos a fazer lobi através da cunha, do primo, do colega de faculdade mas isso não funciona fora de Portugal", considerou.
Como exemplo de um espaço onde essa prática tem pouco ou nenhum sucesso, cita Bruxelas e o caso do Parlamento Europeu onde estão acreditados mais de cinco mil lobistas, dos quais apenas um é português, o próprio Joaquim Martins Lampreia.
"Isto mostra bem a força que temos na capital europeia do lóbi. Uma força de zero", disse.
"O lóbi só existe nos países democráticos, não existe nas ditaduras. Em Portugal, com 32 anos de democracia, continuamos a fazer vingar práticas do 24 de Abril. Uma falta de transparência que afecta a nossa competitividade e capacidade de intervenção", afirmou.
Mesmo nos países onde não há regulamentação própria, como em França, o sector tem associações profissionais e códigos deontológicos.
O especialista em lóbi considera que, contraditoriamente, e mesmo sem reconhecer a prática, Portugal recorre regularmente a serviços profissionais do sector, maioritariamente no exterior.
Como exemplo cita o pagamento de serviços de "lóbi" a Madeleine Albright, aquando da campanha de António Guterres para o cargo de Alto Comissário da ONU para os Refugiados ou a contratação, nos anos 90, do senador norte- americano Bruce Cameron, para lóbi a favor de Timor-Leste.
Com prefácio de José Miguel Júdice, o livro aponta dados praticamente desconhecidos sobre o tema, defendendo a regulamentação da profissão, a posterior criação de cursos de especialização nas universidades portuguesas e de associações profissionais do sector.
Numa quarta fase, explica o autor da obra, será necessário fomentar "a credibilização da profissão e da prática junto da sociedade civil".
O livro define em termos técnicos o que é o lóbi, um sector que movimenta dezenas de milhares de profissionais e empresas em todos os países ocidentais, sendo na maioria deles regulamentado ou profissionalizado.
Ao mesmo tempo aponta comparações entre os vários regimes europeus para o sector, onde se destaca a "infeliz" falta de regulamentação e de qualquer quadro profissionalizante para o sector, tanto em Portugal como em Espanha.