Lone Star. Conheça o fundo que pode ficar com o Novo Banco

por Christopher Marques - RTP
Rafael Marchante - Reuters

Confirmando as apostas, o Banco de Portugal considera que o Lone Star apresentou a melhor proposta para a compra do Novo Banco. O fundo norte-americano não é novidade em Portugal mas não detém participações no sistema financeiro. Comprou já centros comerciais insolventes, tendo vendido a maioria pouco tempo depois. Por cá, multiplicam-se as vozes contra o que José Maria Ricciardi classifica de “investidores abutres” e uma eventual venda do banco “aos bocados”.

O assunto Novo Banco tem de ser resolvido até agosto e o tabuleiro de jogo não sorri a Portugal. Não há bancos interessados. O grupo chinês Minsheng não apresentou as garantias bancárias e ficou de fora.

Restam os fundos de investimento. Entre duas escolhas possíveis, o Banco de Portugal abriu caminho ao Lone Star.

O fundo norte-americano propõe-se mobilizar 1.500 milhões de euros na compra do Novo Banco. Desse bolo global, 750 milhões serão usados na compra da instituição. Os restantes 750 milhões serão injetados no Novo Banco para reforçar a sua solidez.

No entanto, o Lone Star quer uma garantia pública para o caso da venda de alguns ativos do banco renderem menos do que o expetável. Ou seja, uma parte do risco seria assumida pelos contribuintes e poderia acabar por impactar as contas públicas.
O que é o Lone Star?
A concretizar-se, a compra do Novo Banco não seria a primeira operação do Lone Star em solo português, onde investiu já em centros comerciais e onde detém a concessão da marina de Vilamoura. No entanto, seria a primeira incursão na banca portuguesa.

O Lone Star apresenta-se como uma empresa de “private equity”, investindo em empresas não cotadas em bolsa e que apresentam necessidade de crescimento ou de serem recuperadas. Os fundos de investimento acabam frequentemente por vender as suas participações a médio prazo, com mais-valias superiores às que se verificam no mercado de capitais.

No seu site, o Lone Star refere ter criado o primeiro fundo em 1995. Até hoje, criou já 17, com um capital agregado de 70 mil milhões de dólares. Tem investimentos nos Estados Unidos, Canadá, Europa e Ásia.

A operação europeia ganhou novo fôlego a partir de 2005, fruto da criação da zona euro e respetiva consolidação do sistema financeiro, justifica a empresa na sua página oficial.

O Lone Star tem origem no Texas, tendo delegações pelo mundo fora. Na Europa, tem escritórios em Madrid, Paris, Amesterdão, Londres e Frankfurt.
Comprar e vender
O gestor norte-americano tem já presença em Portugal mas não no setor bancário. Em agosto de 2015, o fundo de investimento comprou ao grupo espanhol Chamartín quatro centros comerciais Dolce Vita que se encontravam em situação de insolvência: Lisboa, Porto, Vila Real e Coimbra.

Os valores das operações não chegaram a ser confirmados oficialmente à época mas ilustram os objetivos de valorização de ativos que se encontram em situação difícil.

Estima-se que o grupo Chamartín tenha investido mais de 500 milhões de euros nos centros comerciais Dolce Vita em 2006. Em 2015, cada um dos centros comerciais foi colocado à venda por valores pouco superiores a 40 milhões de euros.

Não se sabe por quanto foram vendidos mas sabe-se quem os comprou: o fundo de investimento Lone Star. Três dos centros comerciais comprados acabaram por ser novamente vendidos ainda em 2015 aos alemães do Deutsche Bank, ficando o Lone Star apenas com o Dolce Vita Monumental, situado na capital.

O jornal Expresso avançava então que o preço de venda dos três centros comerciais teria ficado próximo dos 200 milhões de euros. Não é conhecido o valor que o grupo investiu na sua compra, mas sabe-se que cada um tinha sido colocado à venda por valores pouco superiores a 40 milhões de euros.
A Marina de Vilamoura
Antes, em abril de 2015, o Lone Star tinha já adquirido a concessão da Marina de Vilamoura. Segundo informação na altura publicada pelo Diário de Notícias, o fundo de investimento adquiriu a Lusort – que detinha os ativos imobiliários e a concessão de Vilamoura – por 200 milhões de euros. Em 2010, a mesma Lusort valia três vezes mais.

Perante as notícias de que tornam o Lone Star como provável próximo dono do Novo Banco, erguem-se vozes que advertem contra o que classificam de “investidores abutre”. Em entrevista à SIC Notícias na noite de quarta-feira, José Maria Ricciardi alertou para a “filosofia dos private equity”: “vender uns ativos para aqui e outros para ali para tentar obter uns grandes retornos”.

“Se a filosofia não for essa, muito bem. Se for, é indiscutível que é melhor que o banco seja temporariamente nacionalizado, que fique na esfera do Estado, que continue com o dr. António Ramalho, e existem várias maneiras de capitalizar o banco“, afirmou o ex-presidente do Banco Espírito Santo Investimento e primo de Ricardo Salgado.

Na quarta-feira, num artigo de opinião publicado no jornal Público, Francisco Louçã tinha já considerado a venda do Novo Banco como uma solução “má”.
Reportagem de Paulo Jerónimo, Rui Rufino - RTP

O ex-dirigente do Bloco de Esquerda classificava os principais compradores de "flibusteiros, ou aventureiros provados no mar alto da finança mundial", referindo-se aos fundos Lone Star, Apollo e Centerbridge.

Para Francisco Louçã, os fundos "ameaçarão o banco, atacarão os clientes, arriscarão os depositantes". O economista defende a nacionalização do banco, um cenário que não é excluído pelo próprio ministro das Finanças Mário Centeno.

O social-democrata Santana Lopes avisa que o Novo Banco não pode ser "esquartejado" e que "é melhor não haver venda do que haver uma venda qualquer"
O problema da garantia
Caso o Governo siga a pista apresentada pelo Banco de Portugal, as negociações arrancam para uma nova fase. No comunicado enviado na noite de quarta-feira, o regulador nota que o Lone Star é “a entidade mais bem colocada para finalizar com sucesso o processo negocial”.

No entanto, a entidade liderada por Carlos Costa ressalva que a proposta norte-americana “apresenta condicionantes, nomeadamente um potencial impacto nas contas públicas”.

Um dos pontos de discórdia entre as autoridades lusas e o fundo de investimento norte-americano será a prestação de eventuais garantias por parte do Estado. O ministro Mário Centeno já garantiu que não serão prestadas garantias públicas caso o Novo Banco seja vendido a privados. Em causa estão avaliações diferentes feitas pelo vendedor e pelo potencial comprador.

O jornalista André Macedo notou esta manhã na Antena 1 que há “uma série de ativos – imóveis e empresas que o Novo Banco tem de vender – que têm um valor entre 2 e 2,5 mil milhões de euros. Há uma disputa quanto ao valor real dessa venda que terá de ser feita”, explica Macedo.

O Lone Star exige uma garantia do Estado para o caso de a venda ser feita abaixo desse valor estimado. Ao conceder essa garantia, o Governo arriscaria ter de cobrir essa diferença, com o respetivo impacto no défice.

Na busca por um entendimento, o comentador de Assuntos Económicos considera que se avizinham dois caminhos possíveis: uma redução do valor da garantia para que essa seja mais facilmente aceite pelo Executivo ou a entrega de contrapartidas por parte do LoneStar, como a distribuição de resultados do Novo Banco ou de parte do encaixe com a venda dos ativos.
Impacto para os contribuintes
O Lone Star propõe-se mobilizar 1.500 milhões de euros na compra do Novo Banco. Desse bolo global, 750 milhões serão usados na compra da instituição. Os restantes 750 milhões serão injetados no Novo Banco para reforçar a sua solidez.

O valor proposto pelo Lone Star encontra-se muito abaixo dos 4,9 mil milhões de euros que o Fundo de Resolução colocou na instituição em agosto de 2014, quando o Banco de Portugal tomou o controlo do então Banco Espírito Santo.

O Estado colocou 3,9 mil milhões de euros no Fundo de Resolução a título de empréstimo.

A concretizar-se a venda com perda, o custo deverá ser assumido pelo setor financeiro mas serão necessárias décadas até que o Estado reveja o capital que emprestou. Soma-se a isto o impacto na Caixa Geral de Depósitos, banco público e que também faz parte do Fundo de Resolução.
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