Privatização da TAP. Sindicatos contestam ausência de desconto na venda de ações para trabalhadores

Os sindicatos da TAP antecipam que não haverá procura pelas ações reservadas aos trabalhadores no âmbito da privatização, acusando o Governo de afastá-los do processo ao não prever um desconto de 5%, como aconteceu em operações anteriores.

Lusa /

O Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos (SITAVA) entende "que o Governo enganou os trabalhadores uma vez e agora está a tentar fazê-lo pela segunda vez", afirmou à Lusa o porta-voz do sindicato, Paulo Duarte.

"A nossa perceção é que não vai ser subscrita uma única ação. Aliás, atrevo-me a dizer que o Governo sabe isso perfeitamente e até o deseja, para o novo acionista ficar com os 49%", acrescentou.

O presidente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC), Ricardo Penarroias, considerou que o tema dos 5% "não é relevante ou não é uma prioridade", mas defendeu que a exclusão dos trabalhadores é "mais um indício da pretensão do Governo em afastá-los do processo".

"Aliás, consideramos que esse afastamento dos trabalhadores é uma medida para atrair interessados fora da Europa", apontou.

Ricardo Penarroias lembrou que têm sido críticos da forma como está a ser conduzido todo este processo, "nomeadamente pela ausência da participação dos sindicatos, pelo `timing` em que está a ser realizado e, claro, pelo défice de garantias e de salvaguardas em relação ao interesse da empresa, do país e dos postos de trabalho".

O responsável revelou ainda que, "até ao momento, não houve qualquer contacto de associados demonstrando interesse na aquisição de ações da empresa".

Também o Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) considerou "inaceitável" que o caderno de encargos que "concede benefícios fiscais substanciais ao investidor de referência --- através dos créditos fiscais acumulados (cerca de 487 milhões de euros) e do regime de reporte de prejuízos --- retire agora o desconto de 5% historicamente concedido aos trabalhadores".

"Esta situação representa uma assimetria revoltante: nega-se aos trabalhadores um benefício modesto de 5% numa parcela que não ultrapassa 5% do capital, enquanto se oferece anos de alívio fiscal ao comprador que valem múltiplos desse desconto", disse à Lusa o vice-presidente da direção do sindicato, Frederico Saraiva de Almeida.

"Os trabalhadores da TAP, que são também contribuintes, suportaram os maiores sacrifícios durante a reestruturação --- com cortes salariais superiores a 60% entre os pilotos --- para viabilizar a operação", lembrou.

Segundo o dirigente, "a procura pelos 5% sem desconto será naturalmente reduzida", considerando "um exercício de cinismo pedir aos trabalhadores que comprem ao mesmo preço do investidor, após terem sido os primeiros a pagar pela recuperação da empresa".

O SPAC sublinhou ainda ser "particularmente revoltante" que o Governo "não aproveite este processo de reprivatização para compensar os trabalhadores pelo investimento perdido na operação harmónio de 2022, que eliminou os 5% de capital da TAP SGPS que detinham desde 2015, obrigando-os agora a recomprar e sem desconto aquilo que já possuíam e lhes foi retirado".

"O Governo converte, assim, um instrumento de participação numa mera formalidade simbólica, contrariando o espírito da Lei-Quadro das Privatizações e os precedentes da própria TAP", acrescentou.

Como a Lusa noticiou, o Governo justificou a medida de não incluir desconto na compra de ações para os trabalhadores com a necessidade de proteger os 3,2 mil milhões de euros investidos pelos contribuintes na TAP.

Nos anteriores processos de privatização houve desconto de 5%, ausente no atual caderno de encargos.

O documento, publicado na segunda-feira à noite em Diário da República, prevê a venda direta de 44,9% do capital social da companhia e estabelece que até 5% do capital social pode ser adquirido por trabalhadores. A parte não subscrita passará para o investidor privado que venha a assumir a posição acionista.

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