Provedora de Justiça afirma que Comissão Europeia não acautelou conflito de interesses
A provedora de Justiça europeia considera que a Comissão Europeia não acautelou conflitos de interesses ao entregar um contrato de consultoria para novas regras "verdes" na banca a uma empresa com participações bilionárias em indústrias poluidoras.
Numa decisão publicada hoje em resposta a uma queixa de várias organizações não-governamentais e de deputados europeus, Emily O`Reilly afirma que "a Comissão devia ter sido mais vigilante e verificado que a empresa [Blackrock] não estava sujeita a um conflito de interesses que poderia afetar negativamente o contrato".
"A decisão de atribuir o contrato à empresa não ofereceu garantias suficientes para afastar todas as dúvidas legítimas sobre o risco de conflitos de interesse", afirma a provedora, que considera questionável que a Comissão tenha concluído "não haver fundamento legal para excluir a BlackRock Investment Management"
A empresa, baseada nos Estados Unidos, é a maior do mundo na gestão de ativos, controlando cerca de 7,4 biliões de dólares, e ganhou em março o contrato com a Comissão Europeia para estudar uma maneira de incluir fatores de "governança ambiental e social" no funcionamento, estratégias de negócio e política de investimento dos bancos europeus.
De acordo com a coligação Change Finance, que junta várias organizações não-governamentais e foi uma das entidades a apresentar a queixa à provedora, a BlackRock "está longe de ser imparcial".
"Se o contrato com a BlackRock não for retirado, isso será a morte de um verdadeiro Pacto Verde Europeu que esteja alinhado com as ambições climáticas do Acordo de Paris", afirmou Kenneth Haar, do Corporate Europe Observatory, que integra a Change Finance.
"Pedir à BlackRock que sugira as melhores regras para um setor financeiro sustentável é como pedir a uma empresa de energia nuclear conselhos sobre como deixar de usar energia nuclear", ilustrou.
Na resposta à provedora, a Comissão Europeia salientou que "a empresa faz investimento em nome de outros" e que o seu "portefólio de investimentos inclui tanto energias renováveis como combustíveis fósseis".
Além disso, argumentou a Comissão, o estudo que encomendou à BlackRock "é em larga medida técnico e analítico" e será "apenas um de vários relatórios, consultas e estudos" que fará sobre finanças sustentáveis.
Como exemplo do que considera a inadequação da Blackrock para a função, a Change Finance refere que "um dos sítios da Terra onde ganhou mais notoriedade é a Amazónia", tudo porque no final de 2018, detinha 2,5 mil milhões de ações em três empresas petrolíferas -- GeoPark, Frontera Energy e Andes Petroleum -- associadas com a desflorestação e destruição ambiental na Amazónia.
A Change Finance aponta ainda que a BlackRock é "o maior ou segundo maior acionista em 12 dos 15 maiores bancos europeus", cada um deles com investimentos em combustíveis fósseis.
Por exemplo, o banco europeu que mais investe nesta área, com 118 mil milhões de dólares em combustíveis fósseis é o britânico Barclays, de que a BlackRock detém 7,75 por cento do capital, equivalente a cerca de 1,6 mil milhões de dólares.
Em outros bancos com investimentos de dezenas de milhares de milhões em combustíveis fósseis, como os franceses BNP Paribas ou Societé Generale, a BlackRock tem cerca de 10% do capital.
"Não só a BlackRock tem um interesse geral em como os mercados financeiros são regulados como tem uma grande participação nas próprias instituições que serão afetadas pela integração de fatores de sustentabilidade na regulação bancária", argumenta a organização.
A provedora recomenda à Comissão que tenha "orientações mais claras sobre possíveis conflitos de interesse e pondere "uma revisão específica da sua regulação financeira para fortalecer as precauções quanto a possíveis conflitos de interesses".