Senegal propõe redistribuição das verbas do FMI aos países africanos
O Presidente do Senegal defendeu hoje que os países mais desenvolvidos devem canalizar para as nações africanas parte das verbas que poderão receber ao abrigo do aumento da capacidade financeira do Fundo Monetário Internacional (FMI).
"As grandes economias, que não precisam imediatamente deste aumento, deviam abdicar de alguns Direitos Especiais de Saque no FMI para conseguirmos receber entre 70 e 100 mil milhões de dólares [57,54 a 82,2 mil milhões de euros]", disse Macky Sall numa entrevista à France 24, citada pela agência de informação financeira Bloomberg.
O Presidente do Senegal referia-se aos 500 mil milhões de dólares (411 mil milhões de euros) de aumento de capital que o FMI estará a preparar, e que será depois distribuído pelos Estados-membros desta instituição financeira, o que permitiria, segundo as contas citadas pela Bloomberg, que África recebesse 25 mil milhões de dólares (20,5 mil milhões de euros), com 18 mil milhões de dólares (14,8 mil milhões de euros) a irem para África Subsaariana, dos quais a Nigéria e a África do Sul deverão receber cerca de 3 mil milhões de dólares (2,4 mil milhões de euros) cada.
A redistribuição, argumentou o chefe de Estado do Senegal, "permitiria relançar as economias e salvar empregos", já que o continente africano não tem a mesma capacidade de reservar verbas para estimular as economias, como fazem os países mais desenvolvidos.
O desafio de Macky Sall surge depois da aparente mudança de posição dos Estados Unidos, que durante a Presidência de Donald Trump se opunham a este aumento de capital do FMI, mas que o novo Presidente, Joe Biden, poderá acarinhar durante os próximos Encontros da Primavera, agendados para o final do primeiro semestre, em Washington.
"No ano passado, beneficiámos de uma moratória nos pagamentos da dívida, uma iniciativa muito necessária por parte do G20 [a Iniciativa para a Suspensão do Serviço da Dívida - DSSI], mas isso não é suficiente, por isso pedimos aos nossos parceiros para mobilizarem esses recursos", argumentou o chefe de Estado do Senegal na entrevista à France 24.
O Senegal lançou no ano passado um ambicioso programa de recuperação económica, incluindo mais apoio para o setor privado e dando prioridade ao fomento da produção nacional, tendo sido, recentemente, afetado pela segunda vaga da pandemia, que obrigou ao fecho de escolas, redução do horário comercial e à reintrodução do confinamento em várias regiões.
Na segunda-feira, Sall já tinha defendido o alargamento da DSSI até final do ano e salientou que a dívida de África representa apenas 2% da dívida mundial.
"A dívida dos países africanos, nos 365 mil milhões de dólares [300 mil milhões de euros], representa apenas 2% da dívida mundial", argumentou Macky Sall na sua intervenção no 20.º Fórum Económico Internacional de África.
Segundo o Presidente senegalês, "é preciso alargar a DSSI até final do ano, melhorar os termos dos contratos, fazer uma profunda reforma da governação económica e financeira a nível mundial e mudar a perceção de risco exagerada que é veiculada pelas agências de notação financeira quando avaliam os países africanos".
"As nossas economias não podem ser competitivas nestas condições", vincou o chefe de Estado do Senegal, que juntamente com a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) e a União Africana, organizou o Fórum.
A DSSI é uma iniciativa lançada pelo G20 em abril do ano passado que garantia uma moratória sobre os pagamentos da dívida dos países mais endividados aos países mais desenvolvidos e às instituições financeiras multilaterais, com um prazo inicial até dezembro de 2020, que foi depois prolongado até junho deste ano, com possibilidade de nova extensão por seis meses.
Esta iniciativa apenas sugeria aos países que procurassem um alívio da dívida junto do setor privado, ao passo que o Enquadramento Comum para o Tratamento da Dívida para além do DSSI, aprovado pelo G20 em novembro, defende que é forçoso que os credores privados sejam abordados, ainda que não diga explicitamente o que acontece caso não haja acordo entre o devedor e o credor.
A proposta apresentada pelo G20 e Clube de Paris em novembro é a segunda fase da DSSI, lançada em abril, e que foi bastante criticada por não obrigar os privados a participarem do esforço, já que abriria caminho a que os países endividados não pagassem aos credores oficiais e bilaterais (países e instituições multilaterais financeiras) e continuassem a servir a dívida privada.
Este Enquadramento pretende trazer todos os agentes da dívida para o terreno, incluindo os bancos privados e públicos da China, que se tornaram os maiores credores dos governos dos países em desenvolvimento, nomeadamente os africanos.