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Abusos policiais marcaram período pós-eleitoral em Moçambique, acusa Amnistia Internacional

por Lusa
Siphiwe Sibeko - Reuters

A Amnistia Internacional acusou hoje as forças de segurança moçambicanas de exercerem violência contra manifestantes pacíficos e transeuntes, no período pós-eleitoral do ano passado, considerando que se tratou de uma reação "desproporcionada e vergonhosa".

No relatório "Protestos sob ataque: Violações dos direitos humanos durante a vaga de repressão após as eleições de 2024", a Amnistia Internacional (AI) mostra como as forças policiais "dispararam armas letais, gás lacrimogéneo e balas de borracha contra manifestantes pacíficos e transeuntes, nomeadamente crianças". 

Na opinião da diretora regional adjunta da AI para a África Oriental e Austral, Khanyo Farisè, "a repressão mortífera exercida pelas forças de segurança moçambicanas foi uma reação desproporcionada e vergonhosa às manifestações pós-eleitorais" de 09 de outubro de 2024.

Por sua vez, segundo o relatório, as autoridades "procederam a prisões arbitrárias em massa e visaram jornalistas, nomeadamente intimidando-os e confiscando o seu equipamento, enquanto restringiam também o acesso à internet em momentos-chave".

Além das 80 mortes consequentes deste período, segundo dados governamentais, o uso da força excessiva e desproporcional provocou "também ferimentos, tais como fraturas ósseas, hemorragias internas, danos em órgãos, lesões torácicas e problemas respiratórios, nomeadamente entre transeuntes e crianças, algumas com apenas 9 anos de idade. Alguns sobreviventes ficaram a sofrer de incapacidades permanentes, que incluem amputações", lamentou a AI.

O caso que acabou por se tornar mais conhecido, citado pela AI, ocorreu numa manifestação em 27 de novembro, em Maputo, quando soldados, "num veículo de combate blindado, atropelaram uma mulher a alta velocidade, causando-lhe ferimentos graves, e depois afastaram-se sem abrandar, deixando o seu corpo imóvel no asfalto".

A AI confirmou que o exército pagou as contas dos tratamentos hospitalares da mulher que foi atropelada, mas não lhe ofereceu qualquer indemnização.

De acordo com a organização, a polícia procedeu também à prisão arbitrária e em massa de pessoas, existindo relatos de tortura ou outros maus-tratos sob custódia policial.

"O grupo da sociedade civil Plataforma Decide informou que, entre 21 de outubro de 2024 e 16 de janeiro de 2025, mais de 4.000 pessoas foram presas e detidas no contexto dos protestos", citou a AI.

Segundo a organização de defesa dos direitos humanos, até hoje, "as vítimas e familiares" com quem falaram "não viram ser feita justiça pelas violações dos direitos humanos contra eles cometidas".

Outra questão levantada no relatório é o facto de, durante os períodos em que estiveram convocadas manifestações, a internet ter tido interrupções e restrições, "que resultaram no impedimento do acesso à informação durante esse período".

"As evidências da Internet Outage Detection & Analysis (IODA), Cloudfare Radar e Open Observatory of Network Interference (OONI) [sistemas que monitorizam a internet] sugerem fortemente que os fornecedores de serviços de internet bloquearam ou reduziram o acesso aos seus serviços em momentos-chave durante a onda de protestos", disse a AI.

Assim, a AI apela à Vodacom Moçambique, à Tmcel, à TV Cabo e à Movitel para que "garantam que as suas operações, produtos e serviços, incluindo a prestação de serviços de internet, respeitem os direitos humanos" e que investiguem os seus impactos.

O relatório baseia-se na análise dos factos ocorridos entre 21 de outubro de 2024 e 24 de janeiro de 2025, através de 28 entrevistas com fontes locais, na sua maioria a testemunhas e sobreviventes, e em 105 vídeos e fotos verificados.

O Governo moçambicano confirmou pelo menos 80 óbitos, além da destruição de 1.677 estabelecimentos comerciais, 177 escolas e 23 unidades sanitárias durante as manifestações.

De acordo com a plataforma Decide, pelo menos 388 pessoas foram mortas e mais de 800 baleadas em quase cinco meses e meio nos protestos pós-eleitorais em Moçambique.

Em 23 de março, o opositor Venâncio Mondlane e Daniel Chapo, Presidente já empossado, encontraram-se pela primeira vez e foi assumido o compromisso de cessar a violência no país.

 

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