Admirador de Pinochet. Quem é José Antonio Kast, o novo presidente do Chile?

Ultraconservador, admirador de Pinochet e defensor da “mão firme”, Kast chega ao poder impulsionado pelo discurso da segurança e da imigração.

RTP /
Juan Gonzalez - Reuters

José Antonio Kast foi eleito presidente do Chile no domingo, à terceira tentativa, com 58,2 por cento dos votos, derrotando Jeannette Jara, do Partido Comunista, que obteve 41,7 por cento. A vitória marca a chegada da direita radical ao Palácio de La Moneda pela primeira vez desde o retorno da democracia, há 35 anos, e confirma uma viragem conservadora num dos países mais ricos da América Latina.

Tem 59 anos, é advogado, pai de nove filhos e católico devoto. Kast construiu a sua campanha em torno da promessa de lei e ordem, num contexto de crescente preocupação social com a criminalidade e a imigração, apesar de os dados oficiais indicarem que os níveis de violência não são tão elevados quanto a perceção pública.

Natural de Santiago, formou-se em Direito na Universidade Católica do Chile e exerce política há cerca de 30 anos. Tornou-se uma figura controversa pela sua admiração declarada pela ditadura de Augusto Pinochet e por ter defendido a continuidade do regime militar no plebiscito de 1988.Pinochet governou o país entre 1973 e 1990 e o seu regime foi responsável pelas mortes de mais de três mil chilenos.


Durante a campanha, Kast prometeu deportações em massa de imigrantes ilegais, a criminalização da imigração irregular e a construção de prisões de segurança máxima com isolamento total para líderes do narcotráfico.

Alertou ainda os migrantes para que “façam as malas e vão-se embora”.

Também afirmou que a imigração faz parte de uma conspiração da “esquerda radical” para destruir as liberdades e acusou os imigrantes de ocuparem casas, camas hospitalares e recursos públicos destinados aos chilenos.

"Disseram-nos que não podiam fechar as fronteiras e agora não podemos abrir as nossas janelas por medo da violência", disse.
“Antiaborto” e contra casamento homossexual
No plano social, mantém posições fortemente conservadoras. Opõe-se ao aborto mesmo em casos de violação, é contra a contraceção de emergência, o divórcio, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a eutanásia.No passado, chegou a proibir a própria mulher, a advogada Maria Pia Adriasola, de usar pílulas anticoncecionais.


Kast rompeu em 2016 com o principal partido conservador chileno para fundar o Partido Republicano, de linha mais radical.

Apesar do discurso, o seu percurso legislativo é considerado limitado, tendo-se destacado sobretudo por leis relacionadas com a construção de estátuas, a concessão de um passaporte chileno a uma freira e a regulação das lotarias.

Filho de imigrantes alemães e o mais novo de dez irmãos, herdou um negócio familiar de salsichas. Há suspeitas de que o seu pai tenha sido membro do Partido Nazi e combatido na Segunda Guerra Mundial, algo que Kast atribui a um alistamento forçado, afirmando não acreditar na ideologia nazi.

Durante a campanha eleitoral, surgiu diversas vezes atrás de um vidro à prova de balas e admitiu possuir arma. Ainda assim, é descrito por analistas como um líder reservado e cauteloso, distante do estilo aguerrido de figuras como Jair Bolsonaro, Javier Milei ou Donald Trump.
A ascensão da direita radical pelo mundo

A jornalista chilena Amanda Marton definiu-o como “sóbrio, pragmático e calmo”. Antigos colegas, contudo, traçam um retrato díspar. “Ou se está com ele ou contra ele”, recordou a jornalista Lily Zuniga, acrescentando que Kast “sente-se destinado à grandeza”. Já os seus apoiantes destacam a disciplina, persistência e ética de trabalho, afirmando que sabe ser flexível quando necessário.Na campanha que o levou à vitória, Kast procurou desvalorizar a agenda moral e concentrar-se na segurança e na imigração.


A ascensão de Kast ocorre num contexto mais amplo de avanço da direita conservadora na América Latina e no mundo, após a reeleição de Donald Trump nos Estados Unidos e o crescimento de partidos semelhantes na Europa, com partidos como o Chega em Portugal, o Vox em Espanha, Alternativa para a Alemanha (AfD) ou a Frente Nacional da França liderada por Marine Le Pen, na França.Segundo o político e autor do livro O Fim da Vergonha- Como a direita radical se normalizou, Vicente Valentim, o sucesso das ideias de direita radical resulta em grande parte da “redução do estigma político sobre uma ideologia e não numa mudança de preferências políticas”.

José Antonio Kast vai tomar posse a 11 de março de 2026, quando receberá a faixa presidencial do atual chefe de Estado, Gabriel Boric, o mesmo adversário que o derrotou em 2021.

Desta vez, o eleitorado chileno escolheu um rumo claramente diferente.
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