Advogado português considera excessivo número de reclusos em prisão preventiva em Macau
O advogado português João Miguel Barros considera que o número de reclusos em prisão preventiva em Macau "é excessivo", sugerindo alternativas como a pulseira eletrónica.
Segundo dados facultados à agência Lusa, o Estabelecimento Prisional de Coloane tinha, a 31 de maio, 1.302 reclusos -- dos quais 271 em prisão preventiva, ou seja, 20,8% do total. A maioria dos reclusos não é de Macau: os locais representavam menos de um terço do universo total (413 ou 31,3%).
"Acho que é um número excessivo e acho que era importante que começasse a haver um culto em Macau de pensar em alternativas à prisão preventiva, até porque nem sempre está devidamente avaliado o grau de culpabilidade -- porque isso só é definido em audiência de julgamento --, que aqueles suspeitos possam ter, e eles devem beneficiar da presunção de inocência", afirmou João Miguel Barros, antigo chefe de gabinete da ex-ministra da Justiça Paula Teixeira da Cruz,
"Não há vantagem de haver um excesso e abuso da prisão preventiva. Devia haver alternativas à prisão preventiva. Em Portugal, a utilização da pulseira eletrónica teve uma grande divulgação e, portanto, acho que era capaz de ser uma alternativa interessante", acrescentou.
O advogado falava aos jornalistas em Macau, à margem da apresentação do livro "Sistema Judiciário (Anotado)", centrado no panorama judicial português.
Radicado em Macau, João Miguel Barros defende que a Lei de Bases da Organização Judiciária local, que está em processo de revisão desde o ano passado, pode beneficiar das metodologias utilizadas em Portugal para trabalhar na lei de organização do sistema judiciário.
"Esta metodologia é capaz de ser a mais-valia que podemos ter em Macau se quisermos pensar globalmente o sistema. Porque o que acontece normalmente é que nós olhamos, por exemplo, para a organização dos tribunais, mas depois não olhamos para outras situações equivalentes, como os códigos processuais, ou as novas tecnologias aplicadas aos tribunais", afirmou.
João Miguel Barros defendeu ainda que "é muito importante que se comece a olhar para o sistema judiciário como um todo, de uma forma sistémica", em detrimento das "reformas avulsas e isoladas, porque cada um destes ramos têm intercomunicação e afetam outros".
"Provavelmente é possível melhorar o dia-a-dia se tivermos um sistema aperfeiçoado e mais eficaz. Isso resolve-se com a qualidade dos magistrados, com a qualidade dos advogados e com a celeridade processual. Mas é evidente que, se não tivermos um sistema adequado a dar a esse tipo de respostas, que o dia-a-dia também vai sofrer", afirmou.
"O que temos de pensar -- todos aqueles que estão em Macau há muitos anos e trabalham no sistema judiciário -- é criar um modelo que seja eficaz e seja um modelo de futuro", acrescentou.
Além disso, considerou que a Lei de Bases da Organização Judiciária de Macau "tem um paradigma completamente desajustado" em termos do que pode ser uma lei de organização de tribunais moderna. "Não há sequer a valorização das profissões judiciárias e, portanto, nós temos que mudar estes paradigmas", afirmou.
"Quando olhamos para a lei, que vem antes da transição [de Macau para a China] e foi publicada em 1984, diz, por exemplo, que os órgãos judiciários são os tribunais e o Ministério Público, e depois tem um capítulo que fala dos mandatários judiciais, nem sequer fala dos advogados, e outro capítulo de dois artigos, que fala do pessoal de apoio", explicou.
"Não se dignificam os funcionários judiciais com este tipo de enquadramento legislativo numa lei de bases que é uma lei muito importante, e portanto, há muita coisa que tem de ser pensada de forma estruturada e desde o início", concluiu.