A retirada de todas as forças militares estrangeiras do Afeganistão só está prevista para 11 de Setembro de 2021, mas as forças norte-americanas e restantes forças da NATO já deixaram a base de Bagram, a maior do Afeganistão, que foi devolvida ao exército afegão. A partida das forças internacionais marca o início de um período de incerteza entre a população.
All Coalition and American troops have departed Bagram Air Base last night. The base was handed over to the ANDSF. ANDSF will protect base and use it to combat terrorism.
— Fawad Aman (@FawadAman2) July 2, 2021
Contudo, o principal comandante norte-americano no Afeganistão, o general Austin S. Miller, "ainda mantém toda a capacidade e autoridade para proteger as forças". Estima-se que ainda estejam entre 2.500 e 3.000 soldados norte-americanos no país, perfazendo um total de sete mil soldados nas forças da NATO.
O anúncio da retirada acontece numa altura em que os grupos islâmicos da região ganham força, tendo já tomado vários bastiões no Afeganistão e estando a conquistar terreno.
Durante as últimas décadas, recorde-se, a base tem sido central para a intervenção dos EUA no Afeganistão, onde a luta contra os talibãs e os aliados da Al-Qaeda tem sido levada a cabo através de ataques aéreos e missões de abastecimento a partir deste aeroporto.
"Alguns foram parados e outros foram presos. Os restantes foram retirados da base", Raufi disse à Associated Press, acrescentando que foram assaltados vários edifícios antes de as Forças de Segurança e Defesa Nacional Afegãs (ANDSF) assumirem o controlo.
"Infelizmente, os norte-americanos partiram sem nenhuma coordenação com as autoridades distritais de Bagram ou com o gabinete do governador", disse Raufi. "Neste momento, as nossas forças de segurança afegãs assumem o controlo dentro e fora da base".
"Estamos muito satisfeitos e apoiamos esta partida. A sua retirada completa [do Afeganistão] permitirá que os afegãos decidam por si mesmos o futuro", declarou o porta-voz dos talibãs, Zabihullah Mujahid, à agência France-Presse.
#Reaction
— Zabihullah (..ذبـــــیح الله م ) (@Zabehulah_M33) July 2, 2021
We consider evacuation of all US forces from #Bagram a positive step & seek withdrawal of foreign forces from all parts of the country. Such is in the interest of both them & Afghans.
Afghans can move closer to peace & security with complete withdrawal of foreign forces https://t.co/vJXUjmPxqk
Desde que foi anunciada a retirada das forças militares, os talibãs intensificaram as ofensivas em todo o país, assumindo o controlo de dezenas de distritos rurais, enquanto as forças de segurança afegãs consolidavam a sua presença nas grandes cidades. Segundo os analistas, a capacidade do exército afegão de conservar o controlo do aeródromo de Bagram poderá ser uma das chaves para manter a segurança junto à capital, Cabul, e a pressão sobre os talibãs.
"Em casa, os norte-americanos e as forças aliadas verão de longe ser reduzido a cinzas o que lutaram tanto para construir, sabendo que os homens e as mulheres afegãos com quem lutaram correm o risco de perder tudo", adiantou o especialista Nishank Motwani, baseado na Austrália.
Agora, os habitantes de Bagram prevêem uma deterioração da situação de segurança e até económica devido à partida das tropas estrangeiras. Enquanto alguns afegãos afirmam que a partida das forças estrangeiras é um desenvolvimento positivo, outros perderam os empregos e sentem que o país enfrenta um momento de incerteza.
Ao longo dos anos, centenas de milhares de militares norte-americanos e da NATO, e alguns subcontratados, passaram pela base de Bagram, que chegou a parecer uma cidade em miniatura, com piscinas, cinemas e spas, e ainda um passeio com restaurantes de 'fast food', como o Burger King e a Pizza Hut.
Construída pelos Estados Unidos para o seu aliado afegão durante a Guerra Fria nos anos 1950 para o proteger da União Soviética a norte, a base tem também uma prisão que recebeu milhares de prisioneiros talibãs e 'jihadistas'.
O general Austin S. Miller considerou, esta semana, que a rápida perda de territórios em todo o país para os talibãs - vários com valor estratégico significativo - "é preocupante". O general norte-americano advertiu ainda que as milícias implantadas para ajudar as forças de segurança nacional podem levar o país à guerra civil.
"A guerra civil é um cenário possível, se continuar na trajetória que está agora, e devia ser uma preocupação do mundo", disse ainda.
"Só um acordo político trará paz ao Afeganistão. E não foram só os últimos 20 anos [de conflito]. Foram, na realidade, os últimos 42", sublinhou.
Muitos cidadãos afegãos, no entanto, lamentam a retirada das tropas e consideram que as forças internacionais estão a deixar um país profundamente empobrecido, à beira de outra guerra civil e com um agravamento da ilegalidade que aterroriza alguns mais do que a conquista de territórios pelos talibãs.
De acordo com a AP, os afegãos afirmam que estão a ressuscitar milícias com um histórico de violência devastadora para lutar contra os insurgentes.
Desde o anúncio da retirada das forças estrangeiras, milhares de habitantes de Cabul tentam fugir do país e estão a pedir vistos nas embaixadas.
"O nosso pessoal está a pensar que talvez vá começar uma guerra civil e esse é o principal problema pelo qual as pessoas querem ir embora", disse Abdullah Saeed, professor da Universidade Politécnica de Cabul. "Os nossos partidos políticos estão a receber armas. Toda a gente tem armas aqui, é por isso que as pessoas estão com medo".
Além disso, o encerramento de algumas embaixadas ocidentais e os avisos de outras para que os seus cidadãos saiam do país está a aumentar o medo entre a população.
"Não é que não tenhamos esperança. Não é que não tenhamos a capacidade de formular ou criar uma visão para o país na ausência da comunidade internacional. É aquela nuvem negra de incerteza a aproximar-se".