Agosto: Palmira, cenário de horror com o Estado Islâmico

A 18 de agosto, Khaled al-Assad, de 82 anos e diretor dos Museus e Diretório de Antiguidades de Palmira por mais de 50 anos, é decapitado entre as ruínas da cidade pelos islamitas do grupo Estado Islâmico. Terá sido torturado durante mais de um mês para revelar informações sobre a cidade e os seus tesouros. Al-Assad resistiu e nada revelou.

O assassínio de al-Assad marca simbolicamente um dos períodos mais terríveis para o Património Mundial, ao longo do ano de 2015, com a destruição e aviltamento de um dos locais de ruínas romanas mais bem preservadas do mundo.


Vanda Freire, Osvaldo Costa Simões - RTP (24 de agosto)

Palmira, cidade património mundial da UNESCO, está em poder dos jihadistas desde 21 de maio de 2015.

Nos meses seguintes torna-se palco das atrocidades do grupo Estado Islâmico - igualmente conhecido pelo acrónimo árabe Daesh - contra seres humanos como contra a cultura.
Execuções

Logo a partir de 27 de maio, o teatro romano da cidade é usado como cenário de execuções dos oponentes do grupo, às mãos de carrascos adolescentes e testemunhadas por centenas de homens e de rapazes.

Mais de 200 pessoas, entre soldados do exército regular sírio capturados e civis da cidade, agora conhecida como Tadmur, terão morrido desta forma nos primeiros dias.


RTP (4 de julho)

Em julho, pelo menos 25 soldados sírios são executados a tiro por adolescentes do EI, no anfiteatro. Em agosto é executado Khaled al-Assad.

Em finais de outubro o E.I. inova no método de execução. Pela primeira vez, prende três homens a antigas colunas e faz explodir os explosivos atados aos prisioneiros. A 30 de novembro, a cidade volta às notícias pelos piores motivos: mais 18 pessoas são ali assassinadas em público, por suspeitas de colaborar com o regime de Damasco.
Pilhagens

O Daesh não se limita a pilhar as riquezas de Palmira e a assassinar brutalmente um dos seus maiores especialistas, além de soldados e de civis. Armadilha as extensas ruínas, nomeadamente as colunatas romanas de 2000 anos e destrói mesmo vários templos e estátuas, vangloriando-se em vídeos publicados na internet de estar a combater a ‘idolatria’.

Poderá estar antes a esconder as pilhagens realizadas nas ruínas, já que vários artefactos de Palmira têm surgido no mercado negro nos últimos meses e este é um dos métodos conhecidos de financiamento do grupo.


RTP (31 de agosto)

Essa é a suspeita das autoridades mundiais quanto, por exemplo, ao Leão de al-Lat. A estátua, de 2000 anos e de dez metros de altura, é comprovadamente detonada em julho de 2015. Poderá contudo não ter sido destruída a autêntica mas apenas uma réplica, para o grupo poder vender a original através de contrabando.

Aparentemente num esforço para afastar estas suspeitas, o grupo jihadista terá flagelado na mesma altura, em Alepo, um homem acusado de traficar artefactos roubados de Palmira.
Destruição

Além do Leão, o grupo jihadista faz explodir em julho o Templo de Baal Shamin, ou “Deus dos Céus”, de 2000 anos, perto do teatro de Palmira. Usam explosivos para a destruição. As imagens só são difundidas em agosto.

Em agosto arrasa igualmente o Templo de Bel e uma colunata próxima, vestígios romanos também com 2000 anos. A destruição total dos vestígios é confirmada por imagens satélite.

Não só as ruínas da cidade romana são alvo da sanha do grupo extremista, mas também locais de devoção islâmica. O túmulo de Muhammad bin Ali, um descendente de Ali bin Abi Taleb, um primo do profeta Maomé, é destruído em julho.



Os militantes detonam também o santuário de Shagaf, ou Abu Behaeddine, uma figura religiosa de há 500 anos, e reduzem em agosto a escombros o Mosteiro de São Elian, uma estrutura cristã do séc. V.

Desde que iniciou as suas ofensivas no Iraque e na Síria, o grupo Estado Islâmico destruiu ou pilhou dezenas de outros locais arqueológicos e religiosos. De acordo com a UNESCO, o grupo controla um quinto dos 10.000 locais históricos do Iraque, que pilha numa “escala industrial” – uma verdadeira ‘limpeza cultural’ está a suceder no Iraque, refere um relatório do organismo da ONU.
Limpeza cultural

Só em 2015, os jihadistas saqueiam o Museu de Mossul, usam escavadoras para arrasar grande parte das ruínas assírias de Nimrod, incluindo frisos da história do Rei Ashurnasirpal II, de 800 AC – “um crime de guerra”, chama-lhe o secretário-geral da ONU, Ban Ki Moon.

Em abril, a cidade de Hatra, no Iraque, é danificada a tiro e com martelos depois dos jihadistas usarem escavadoras contra as ruínas romanas de 2000 anos.

Em junho, julho e agosto, a cidade de Palmira será o principal alvo da destruição. No final do ano, a queda dos teatros romanos de Sabratha, na Líbia, nas mãos de um grupo afiliado do Estado Islâmico, renova receios de novas pilhagens e destruição.

“A limpeza cultural, na minha perspetiva, é exatamente o que se está a passar”, afirmou a diretora da UNESCO Irina Bokova, referindo-se ao Iraque, mas numa análise extensível a outros locais. “Estes extremistas querem impor uma visão diferente do mundo. Querem dizer-nos que não há memória [destes locais], que não há cultura, que não há herança”.