América Central desespera ao ser devastada por dois furacões em 15 dias

por RTP
Um soldado hondurenho segura um bebé durante as evacuações de vilas e aldeias devido ao furacão Iota, 15 dias após o Eta Reuters

Os ventos abrandaram mas a chuva torrencial continuou a cair quase sem interrupção nas últimas horas, à medida que o Iota avançava da Nicarágua para as Honduras. Os estragos são, para já, incontáveis, sobretudo duas semanas apenas após a anterior tempestade devastadora, denominada Eta.

"Está tudo debaixo de água, a chuva não parou a noite toda e agora para por uma hora e depois regressa por duas ou três", explicou o autarca de Wampusirpi, uma localidade no interior hondurenho. "Precisamos de comida e de água para a população, porque perdemos as nossas colheitas com o Eta" apelou. Iota e Eta são os primeiros furacões jamais registados em novembro no Atlântico. 

Puerto Cabezas, ainda pleno de destroços causados pelo Eta, voltou a sofrer em cheio com o Iota. Este último, a 13ª tempestade do ano a atingir a América Central, foi mesmo o furacão mais potente de sempre na Nicarágua, tendo chegado como grau 5 à costa, segunda-feira à noite, com ventos de 249 quilómetros hora e chuvas torrenciais.

Pelas 18h00 GMT de terça-feira, os ventos já tinham abrandado para 105 quilómetros hora mas a precipitação continuava a fazer estragos.
Telhados "como cartão"
Ruas inteiras perderam os telhados, postes de eletricidade e árvores caíram por todo o lado e vários rios galgaram as margens em diversas vilas e aldeias ao longo de toda a costa nicaraguense.


"O vento foi muito forte, levou tudo, os telhados, as janelas em madeira da minha casa de betão. Tive de me abrigar com vizinhos", contou Jessi Urbina, residente em Bilwi, uma cidade portuária de 40 mil habitantes, à agência France Presse.

Habitantes da localidade disseram que o furacão arrancou telhados "como se fossem feitos de cartão".

"Nunca vimos os furacões sucederem-se assim em tão pouco tempo"
, dizia desesperada outra residente da cidade, Silvania Zamora. "Psicologicamente, não e fácil perder o que se tem e recomeçar. Alguns de nós preferem ficar e morrer aqui, em casa", referiu.

Há notícias não confirmadas oficialmente de duas de vitimas mortais na Nicarágua. Os nicaraguenses temem o futuro.

"Podemos morrer, não há nada para comer",
explicou Inocência Smith à agência Reuters, após referir que o Eta destruiu todas as produções agrícolas e fez dezenas de mortos. As aldeias indígenas em torno de Bilwi, gravemente atingidas pelo Eta, ainda esperavam pela evacuação às primeiras horas de terça-feira.
"Situação crítica"
Depois da Nicarágua, o Iota rasou Providencia, uma das ilhas de um pequeno arquipélago da província caribenha colombiana de San Andrés, onde fez um morto. "A situação em Providencia é crítica", afirmou o Presidente da Colombia, Ivan Duque. "Muitas pessoas perderam tudo".

Praticamente 98 por cento das infraestruturas da ilha ficaram destruídas, acrescentou. Um hospital improvisado perdeu a cobertura e forçou a transferência de pacientes sob cuidados intensivos, incluindo duas mulheres que deram à luz durante o pior do Iota. Mais de seis mil pessoas ficaram sem eletricidade.

A tempestade causou igualmente uma fatalidade em Ngäbe-Buglé, uma região ocidental do Panamá.

A Federação Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho temem um desastre humanitário em toda a região devido à proximidade das tempestades.

"Estamos muito preocupados com a possibilidade de deslizamentos de terras em áreas onde o solo já está saturado", referiu o porta-voz da Federação, Matthew Cochrane, numa conferência de imprensa em Genebra, esta terça-feira.

Cerca de 40 mil pessoas na Nicarágua e 80 mil nas Honduras foram forçadas a abandonar as suas casas e a refugiar-se em acolhimentos temporários, revelaram as autoridades dos dois países.
"Pedimos a Deus que o Iota não chegue"
A meio da tarde, o Iota estava a cerca de 169 quilómetros de Tegucigalpa, capital das Honduras. Os serviços meteorológicos norte-americanos, que têm monitorizado a tempestade, esperam a queda de até 76 cm de precipitação nas próximas horas, em áreas já afetadas pelo Eta.

"Estamos nas mãos de Deus. Se tiver de ser subo às árvores", comentou Jaime Cabal, agricultor de 53 anos da província de Izabal, na Guatemala, que regressou à sua quinta para a guardar e aos seus pertences, depois de ter levado a família para um abrigo. "Não temos comida, mas vamos esperar aqui pelo furacão que pedimos a Deus não chegue", acrescentou.

O Iota está a seguir a mesma rota do Eta, que há duas semanas fez 200 mortos um pouco por toda a América Central. De acordo com as estimativas, cerca de 2,5 milhões de pessoas foram afetadas. A confirmar-se a rota prevista, depois do norte e noroeste da Guatemala, o Iota, agora tempestade tropical, irá atingir igualmente o sul de Belize, com chuvas ainda mais fortes.A meteorologia dos EUA alerta que as chuvas irão "causar cheias súbitas e grandes inundações, potencialmente mortíferas, assim como deslizamentos de terras".

Este ano foram registadas já 30 tempestades tropicais nas Caraíbas, na América Central e no sudeste dos Estados Unidos, um número recorde atribuído ao aquecimentos das águas do mar provocado pelas alterações climáticas.

Os chefes de Estado da América Central pediram segunda-feira em conjunto aos organismos financeiros internacionais, auxílio para a reconstrução dos seus países.
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