Mundo
Antibióticos poderiam salvar milhares de crianças africanas em coma
Para as centenas de crianças que chegam todos os dias aos hospitais de algumas regiões de África inconscientes e sem reação, as suas hipóteses de sobrevivência permaneceram inalteradas durante quase 50 anos. Mas uma nova investigação está a aumentar as esperanças de que um tratamento rápido com antibióticos possa melhorar essas hipóteses.
Apesar dos enormes progressos registados nos cuidados de saúde e nas taxas de vacinação das crianças da África Subsariana, as probabilidades continuam a ser muito reduzidas para aqueles que ficam tão doentes que entram em coma. Dependendo da causa, espera-se que entre 17 por cento e 45 por cento morram. Muitas mais ficarão com deficiências.
“Pode tornar-se deprimente”, afirmou ao jornal britânico Guardian a médica Alice Muiruri-Liomba, que trabalha em Blantyre, no Malawi.
Os investigadores descobriram que a administração de antibióticos assim que uma criança chega ao hospital pode salvar dezenas de milhares de vidas por ano - e o facto de as crianças receberem rapidamente cuidados especializados também pode reduzir as mortes e a incapacidade a longo prazo.
Uma análise baseada em vários estudos e publicada na revista Lancet Global Health revela que a maioria das crianças que entram em coma tem uma complicação grave da malária, chamada malária cerebral. A segunda causa mais comum identificada é a meningite bacteriana.
Um segundo estudo realizado pela mesma equipa, centrado no hospital Queen Elizabeth em Blantyre, revelou que uma em cada quatro crianças hospitalizadas em coma com malária tinha uma infeção bacteriana adicional.
“Demasiadas vezes, os parasitas da malária encontrados no sangue de uma criança africana doente impedem o pessoal médico de procurar e tratar infeções bacterianas adicionais”, afirmou Stephen Ray do Oxford Vaccine Group, o principal investigador do estudo.
“Tratamos os parasitas da malária como a causa do coma e, depois, isso torna-se um fator de risco para morrer de uma infeção bacteriana subjacente que não foi tratada... temos de nos certificar de que todas as pessoas que chegam com coma febril recebem antibióticos e antimaláricos”, alertou.
Tornar esta prática padrão poderia mudar a forma como são tratadas 2,3 milhões de crianças por ano em África e salvar mais de 20 mil vidas, frisou Stephen Ray.
Os dados são fragmentados, mas os estudos e as observações dos médicos sugerem que o coma não traumático é muito mais comum entre as crianças da África Subsariana e de partes da Ásia.
“Infelizmente, uma criança chega ao hospital muito mais tarde do que no contexto britânico”, afiançou Stephen Ray. Isso pode significar "até um dia, ou mais de um dia, de coma total e profundo. Completamente inconsciente, incapaz de comunicar, completamente desorientada, com uma febre muito alta".
Esses sintomas levariam a uma ambulância do Reino Unido “em poucos minutos”. No Malawi, isso pode demorar dias.
“Esse atraso é catastrófico - demonstrámos com exames ao cérebro que, quando chegam a nós, já têm muitas complicações neurológicas: inchaço cerebral, lesões cerebrais”, frisou.
Para a médica Alice Muiruri-Liomba o transporte é um obstáculo importante para muitas famílias.
"Temos casos em que uma mãe carrega uma criança em convulsões às costas durante toda a noite, caminhando para um centro de saúde. Depois chegam lá, e nessa unidade de saúde não há ambulâncias. Por isso, essas mães são obrigadas a ir buscar o seu próprio transporte para um hospital maior."
Alice Muiruri-Liomba trata as crianças no hospital central Queen Elizabeth - que tem relativamente bons recursos, ostentando o único scanner de ressonância magnética portátil do país e laboratórios de investigação em pleno funcionamento.
Os hospitais distritais podem estar mal equipados, com medicamentos em falta e instalações laboratoriais básicas.
Normalmente, as crianças são tratadas primeiro em casa, depois numa clínica e num hospital distrital antes de chegarem ao Queen Elizabeth, explicou a médica. “Só levamos os doentes para o hospital quando se complicam - e o que isso me diz é que eles não compreendem o perigo que a malária é capaz de fazer, ou o que uma doença febril que leva a convulsões e coma é capaz de fazer”.
Alice Muiruri-Liomba quer sensibilizar as pessoas para as consequências de atrasar os cuidados de saúde, tanto na comunidade como entre os profissionais de saúde e os decisores políticos.
“As crianças que se apresentam tardiamente têm tendência a ter um mau resultado”, sublinha, que pode ser a morte ou lesões cerebrais, provavelmente causadas por convulsões que não foram tratadas numa fase anterior.
Já Tarun Dua, que dirige a Unidade de Saúde Cerebral da Organização Mundial de Saúde (OMS), concorda que “os desafios sistémicos ou as barreiras que vemos no acesso aos cuidados e à prestação de cuidados” são um dos principais motores do problema.
“Em muitos dos países de África, existe apenas um neurologista infantil por cada quatro milhões de habitantes”, afirma. "Se pensarmos onde é que a neuroimagem está disponível, é na capital ou num par de cidades. Existe um grande fosso rural/urbano".As diretrizes da OMS sobre os cuidados a ter com a meningite, atualizadas em abril, dizem que as crianças que podem ter meningite aguda “precisam de começar a tomar antibióticos empíricos” mesmo antes de qualquer teste de diagnóstico. Segundo Tarun Dua, isto inclui qualquer criança que se apresente no hospital em coma.
“A nossa tarefa é: como é que conseguimos que os países implementem essas diretrizes?”
A OMS está a incentivar os países a atualizarem as suas orientações. E Tarun Dua está esperançado nos avanços tecnológicos. Estão a ser desenvolvidos exames cerebrais de baixo custo e melhores testes de cabeceira.
“As coisas estão a avançar”, afirma. “Mas penso que é importante uma ação acelerada.”
“Pode tornar-se deprimente”, afirmou ao jornal britânico Guardian a médica Alice Muiruri-Liomba, que trabalha em Blantyre, no Malawi.
Os investigadores descobriram que a administração de antibióticos assim que uma criança chega ao hospital pode salvar dezenas de milhares de vidas por ano - e o facto de as crianças receberem rapidamente cuidados especializados também pode reduzir as mortes e a incapacidade a longo prazo.
Uma análise baseada em vários estudos e publicada na revista Lancet Global Health revela que a maioria das crianças que entram em coma tem uma complicação grave da malária, chamada malária cerebral. A segunda causa mais comum identificada é a meningite bacteriana.
Um segundo estudo realizado pela mesma equipa, centrado no hospital Queen Elizabeth em Blantyre, revelou que uma em cada quatro crianças hospitalizadas em coma com malária tinha uma infeção bacteriana adicional.
“Demasiadas vezes, os parasitas da malária encontrados no sangue de uma criança africana doente impedem o pessoal médico de procurar e tratar infeções bacterianas adicionais”, afirmou Stephen Ray do Oxford Vaccine Group, o principal investigador do estudo.
“Tratamos os parasitas da malária como a causa do coma e, depois, isso torna-se um fator de risco para morrer de uma infeção bacteriana subjacente que não foi tratada... temos de nos certificar de que todas as pessoas que chegam com coma febril recebem antibióticos e antimaláricos”, alertou.
Tornar esta prática padrão poderia mudar a forma como são tratadas 2,3 milhões de crianças por ano em África e salvar mais de 20 mil vidas, frisou Stephen Ray.
Os dados são fragmentados, mas os estudos e as observações dos médicos sugerem que o coma não traumático é muito mais comum entre as crianças da África Subsariana e de partes da Ásia.
“Infelizmente, uma criança chega ao hospital muito mais tarde do que no contexto britânico”, afiançou Stephen Ray. Isso pode significar "até um dia, ou mais de um dia, de coma total e profundo. Completamente inconsciente, incapaz de comunicar, completamente desorientada, com uma febre muito alta".
Esses sintomas levariam a uma ambulância do Reino Unido “em poucos minutos”. No Malawi, isso pode demorar dias.
“Esse atraso é catastrófico - demonstrámos com exames ao cérebro que, quando chegam a nós, já têm muitas complicações neurológicas: inchaço cerebral, lesões cerebrais”, frisou.
Para a médica Alice Muiruri-Liomba o transporte é um obstáculo importante para muitas famílias.
"Temos casos em que uma mãe carrega uma criança em convulsões às costas durante toda a noite, caminhando para um centro de saúde. Depois chegam lá, e nessa unidade de saúde não há ambulâncias. Por isso, essas mães são obrigadas a ir buscar o seu próprio transporte para um hospital maior."
Alice Muiruri-Liomba trata as crianças no hospital central Queen Elizabeth - que tem relativamente bons recursos, ostentando o único scanner de ressonância magnética portátil do país e laboratórios de investigação em pleno funcionamento.
Os hospitais distritais podem estar mal equipados, com medicamentos em falta e instalações laboratoriais básicas.
Normalmente, as crianças são tratadas primeiro em casa, depois numa clínica e num hospital distrital antes de chegarem ao Queen Elizabeth, explicou a médica. “Só levamos os doentes para o hospital quando se complicam - e o que isso me diz é que eles não compreendem o perigo que a malária é capaz de fazer, ou o que uma doença febril que leva a convulsões e coma é capaz de fazer”.
Alice Muiruri-Liomba quer sensibilizar as pessoas para as consequências de atrasar os cuidados de saúde, tanto na comunidade como entre os profissionais de saúde e os decisores políticos.
“As crianças que se apresentam tardiamente têm tendência a ter um mau resultado”, sublinha, que pode ser a morte ou lesões cerebrais, provavelmente causadas por convulsões que não foram tratadas numa fase anterior.
Já Tarun Dua, que dirige a Unidade de Saúde Cerebral da Organização Mundial de Saúde (OMS), concorda que “os desafios sistémicos ou as barreiras que vemos no acesso aos cuidados e à prestação de cuidados” são um dos principais motores do problema.
“Em muitos dos países de África, existe apenas um neurologista infantil por cada quatro milhões de habitantes”, afirma. "Se pensarmos onde é que a neuroimagem está disponível, é na capital ou num par de cidades. Existe um grande fosso rural/urbano".As diretrizes da OMS sobre os cuidados a ter com a meningite, atualizadas em abril, dizem que as crianças que podem ter meningite aguda “precisam de começar a tomar antibióticos empíricos” mesmo antes de qualquer teste de diagnóstico. Segundo Tarun Dua, isto inclui qualquer criança que se apresente no hospital em coma.
“A nossa tarefa é: como é que conseguimos que os países implementem essas diretrizes?”
A OMS está a incentivar os países a atualizarem as suas orientações. E Tarun Dua está esperançado nos avanços tecnológicos. Estão a ser desenvolvidos exames cerebrais de baixo custo e melhores testes de cabeceira.
“As coisas estão a avançar”, afirma. “Mas penso que é importante uma ação acelerada.”