Ao "desespero" da população regime cubano está a responder com repressão, dizem analistas
As manifestações populares de 2021 em Cuba têm sido este ano retomadas fruto do "desespero" da população com as dificuldades de subsistência, mas a resposta do regime centra-se na repressão, segundo analistas ouvidos pela Lusa.
"Nas últimas semanas houve protestos, inclusivamente de pessoas a bater tachos. Porém, são protestos marcadamente diferentes dos protestos do ano passado, em que as pessoas estavam furiosas com a situação global do país", declarou Pedro Neto, diretor executivo da Amnistia Internacional (AI) Portugal.
Para Neto, "as [manifestações] destas últimas semanas são já de puro desespero, pela situação de escassez de alimentos, pela fome, que não é recente, pela falta de eletricidade por vários dias consecutivos. Esta situação foi ainda mais agravada pela passagem do furacão Ian [que provocou mortos e grande destruição na Ilha]".
Segundo ainda o responsável da AI, as autoridades cubanas continuam a culpar os "opressores", nomeadamente os Estados Unidos, sem "uma assunção de responsabilidades" por Governo de Cuba pela situação vivida no país.
"A liberdade de imprensa e a liberdade de expressão continuam sem mudanças em Cuba. Existe um trabalho que tem de ser feito pelas autoridades cubanas, que é o da garantia de mínimos de direitos económicos e sociais e de liberdade de expressão" ao povo cubano, adiantou Neto.
Filipe Vasconcelos Romão, professor na Universidade Autónoma de Lisboa (UAL), afirmou que "até ao momento, as organizações não-governamentais que monitorizam a questão dos direitos humanos e o cumprimento e a salvaguarda dos mesmos continuam a denunciar o regime cubano, afirmando que não tem havido melhorias neste campo em relação a gestão dos governos anteriores, nomeadamente dos irmãos [Fidel e Raúl] Castro".
Para Vasconcelos Romão, "neste sentido a repressão parece continuar a ser um instrumento considerado válido pelo regime cubano, que acaba por ser materializar na continuidade destes processos a quem foi considerado líder ou por ter participado nas manifestações do ano passado".
"Estes são os dados que existem e os dados da oposição cubana, evidentemente, vão na mesma linha, o que parece demonstrar que o Governo de [Presidente cubano, Miguel] Díaz-Canel não procedeu grandes alterações neste âmbito", sublinhou o professor da UAL e especialista em relações internacionais.
De acordo com a ONG Human Rights Watch (HRW), num relatório publicado no aniversário de um ano das manifestações, em 11 de julho de 2021 milhares de cubanos saíram às ruas na maior manifestação nacional contra o governo desde a revolução cubana de 1959. Esses protestos pacíficos, segundo a HRW, foram uma resposta às restrições aos seus direitos, à escassez de alimentos e medicamentos e à resposta do Governo de Cuba à pandemia da Covid-19.
O grupo cubano de direitos humanos Cubalex, citado pela HRW, referiu que mais de 1.400 pessoas foram detidas, incluindo mais de 700 que permanecem atrás das grades. Mais de 380 manifestantes e transeuntes, incluindo vários adolescentes, foram processados e sentenciados.
Já a Associação de Amizade Portugal-Cuba declarou à Lusa, por email, que "os acontecimentos de 11 de julho de 2021 foram desencadeados por um brutal ataque cibernético, com origem em organizações financiadas pelos Estados que, com a etiqueta [da organização de oposição] SOS Cuba, foram movimentadas dezenas de contas, com grande capacidade tecnológica, automatizadas, inorgânicas, robóticas e com instrumentos de informatização".