"Assassinos do ventilador". Invasões de negacionistas a hospitais britânicos colocam pacientes em risco

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Toby Melville - Reuters

As autoridades de saúde e a polícia britânica estão preocupadas com as recentes invasões de negacionistas da Covid-19 a hospitais, alertando que têm colocado em risco a vida e o atendimento de pacientes. Várias pessoas que negam a existência da pandemia têm protestado à porta dos hospitais e algumas chegam a invadir os edifícios, exigindo que os doentes sejam enviados para casa.

Por todo o mundo, para além da ameaça da própria Covid-19, os países têm também batalhado contra grupos de pessoas que negam a existência da pandemia e que fazem circular pelas redes sociais informações falsas relativamente ao novo coronavírus.

No caso do Reino Unido, estes grupos têm sido uma ameaça crescente nas últimas semanas, à medida que surgem vários relatos de negacionistas que invadem os hospitais e colocam o tratamento de pacientes com Covid-19 em risco. Estas pessoas invadem os hospitais para recolher imagens, que são posteriormente publicadas nas redes sociais e utilizadas para alimentar teorias da conspiração.

Segundo relata o jornal The Guardian, o exemplo mais recente ocorreu na semana passada, quando um grupo de pessoas foi expulso por um segurança da ala Covid-19 depois de terem filmado a equipa médica enquanto exigiam que um paciente gravemente infetado fosse enviado para casa, alegando que o vírus é uma farsa.

Nas imagens partilhadas pelo jornal britânico, ouve-se o paciente repetir várias vezes: “eu quero ir para casa”, enquanto o profissional de saúde explica que “se for para casa, vai morrer”.



De seguida, ouve-se o homem por trás da câmara a questionar qual o tratamento que está a ser administrado, enquanto uma mulher ao lado questiona: “Porque é que ele morreria se fosse para casa, se só precisa de oxigénio?”.

Depois de o profissional de saúde explicar que o paciente tem pneumonia derivada da Covid-19 que está a afetar os dois pulmões e está a ser tratado com esteróides e antibióticos, o homem que segura na câmara protesta contra os tratamentos e defende que o paciente deve ser levado para casa e tratado com vitamina C, vitamina D e zinco.

“Nenhum desses são tratamentos comprovados para o coronavírus”, responde o profissional de saúde. “Pelo contrário, antibióticos e esteróides são”, acrescentou. Na quarta-feira, a polícia britânica estava a pedir apoio na busca por um homem, de 45 anos, que se suspeita estar relacionado com este último incidente, no hospital de East Surrey.
 
Após ser contactado pelo jornal britânico, o Facebook retirou esta e outras filmagens nas quais negacionistas apelidam os profissionais de saúde de “assassinos do ventilador”.

Apesar deste alerta, vários vídeos filmados em hospitais no Reino Unido continuam a circular nas redes sociais. A polícia alerta para a “escalada de comentários abusivos e ameaçadores nas redes sociais que visam os profissionais de saúde”.
“Isto está a destruir a motivação”
A Doctors’ Association UK (DAUK), um sindicato que representa os médicos da linha da frente no Reino Unido, considera inaceitável que a equipa, para além de manter os pacientes estáveis, tenha que se preocupar com a nova ameaça de negacionistas da Covid-19 e grupos que são contra o uso de máscaras.

Os funcionários estão exaustos. Eles não deveriam ter que lidar com abusos e até ameaças de morte nas redes sociais”, disse Samantha Batt-Rawden, a presidente do DAUK, a The Guardian.

“Eles também não devem ter que se preocupar em chegar ao hospital para o seu turno devido às multidões que gritam ‘Covid é uma farsa’ à porta dos hospitais lotados de pacientes que estão doentes e a morrer”, acrescenta. “Isto está a destruir a motivação, mas, pior ainda, pode estar a bloquear o atendimento ao paciente”, sublinha a presidente do DAUK.

“Entrar numa ala da Covid, colocar em risco a vida dos pacientes e funcionários e, em seguida, publicar um vídeo online atinge novos pontos baixos. Não é apenas perigoso, mas também profundamente desrespeitoso para com os esforços extraordinários da equipa da linha de frente do Serviço Nacional de Saúde que, dia após dia, trabalha arduamente para salvar a vida dos pacientes em estado grave”, alerta Chris Hopson, chefe executivo da NHS Providers. Na sequência destes incidentes, já foram aplicadas várias multas e pelo menos sete pessoas foram detidas no Reino Unido.

No início de janeiro, o Channel 4 News, o telejornal transmitido pelo canal britânico Channel 4, conduziu uma reportagem onde demonstrou o clima vivido no hospital de Milton Keynes, sobrelotado de pacientes infetados com Covid-19. “Normalmente não filmamos dentro do hospital, mas a equipa insistiu” depois de vários negacionistas da pandemia terem protestado vários dias à porta do hospital, explicou a jornalista.

“A única razão pela qual estamos a filmar aqui hoje é porque o Sistema Nacional de Saúde quer que o público saiba que esta situação é agora muito séria”, diz a jornalista Victoria Macdonald, na reportagem.


“Enquanto estou aqui fora, uma pessoa passou e gritou a dizer que isto é tudo uma teoria da conspiração e que aquele hospital está vazio. Não está vazio. Está mais lotado do que nunca”
, diz a jornalista durante a reportagem.

Nas últimas 24 horas, o Reino Unido registou 1.725 mortes e 25.308 novos casos de Covid-19, aumentando os totais desde o início da pandemia para 101.887 mortes e 3.715.054 casos.

Entre 21 e 27 de janeiro foram registadas 8.597 mortes, o que equivale a uma média diária de 1.228 e a um aumento de 0,9 por cento em relação aos sete dias anteriores.

Na segunda-feira, data dos dados mais recentes, estavam hospitalizadas 37.605 pessoas com SARS-CoV-2, menos do que em dias anteriores, mas mesmo assim quase o dobro do número de internos durante o pico da primeira vaga da pandemia, na primavera de 2020.

A Inglaterra está em confinamento desde o início de janeiro e o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, já anunciou que o alívio das restrições não acontecerá antes de março.

c/agências
Tópicos
pub