Autarcas insurgem-se contra política migratória do governo de Meloni

Os autarcas italianos estão a insurgir-se contra a política migratória do governo de extrema-direita liderado por Giorgia Meloni, advertindo que a capacidade de acolhimento das cidades está à beira do colapso face ao número de chegadas e falta de recursos.

Lusa /

As críticas dos presidentes de câmara são desvalorizadas pelo governo, com fontes do Ministério do Interior a considerarem que as queixas, que classificam de "surreais", são motivadas por questões políticas, mas a associação de municípios italianos (ANCI) sublinha que "todos os autarcas estão a protestar, não apenas os do Partido Democrático" (PD), principal partido da oposição (centro-esquerda).

Após ter advertido, no passado sábado, que as instalações de acolhimento de migrantes, e designadamente de menores, nas cidades e vilas de Itália estão "em rutura e à beira do colapso", o responsável pela imigração na ANCI, Matteo Biffoni, que é presidente da câmara de Prato (Toscânia, centro do país) e membro do PD, admitiu "irritação" com a reação do Ministério do Interior, até porque têm sido "fontes" a responder às preocupações dos autarcas, acusando-os de terem posições ideológicas e de simplesmente não quererem acolher migrantes.

"É um pouco irritante responder às `fontes do Viminale` (sede do Ministério do Interior), que não põem o nome e o apelido à frente de certas afirmações, mas é correto apontar a verdade dos factos", declarou Biffoni, que convidou o governo a ouvir "todos os presidentes de câmara, não apenas os do PD, porque todos estão a protestar".

Os descontentes, apontou, incluem autarcas da Liga, o partido anti-imigração do vice-primeiro-ministro Matteo Salvini, do qual é muito próximo o ministro do Interior, Matteo Piantedosi.

Num ano em que se tem assistido a um número recorde de desembarque de migrantes irregulares -- nos primeiros sete meses de 2023 chegaram a território italiano cerca de 100 mil -, que coincide com a adoção de uma política migratória mais estrita por parte do governo de coligação de direita e extrema-direita formado pelos Irmãos de Itália, Liga e Força Itália, a ANCI denuncia que "esta é a maior emergência" dos últimos anos a nível de acolhimento de migrantes e o governo "nada faz", perante as dificuldades das autarquias.

Segundo a ANCI, face à chegada a diferentes localidades de migrantes transferidos diariamente desde a Sicília, os autarcas "são obrigados a encontrar lugares onde não existem" para o acolhimento, sobretudo de menores, e não têm recursos nem apoios, vendo o seu trabalho dificultado pelas disposições adotadas já este ano pelo governo liderado por Giorgia Meloni, em funções desde outubro, tal como ter excluído da rede de acolhimento instituições de caridade.

A principal preocupação é o acolhimento de menores, denunciam os autarcas, que se queixam da falta de centros de acolhimento para crianças, e isto num ano em que já chegaram a Itália 12 mil menores não acompanhados. Só no último fim de semana, chegaram 1.900.

"Com estes números, se ainda nos enviarem menores não acompanhados, não podemos garantir que as condições estabelecidas por lei serão cumpridas, e a responsabilidade é do Estado", aponta Biffoni.

Em muitas localidades, os autarcas buscam em quase desespero instalações para acolher os migrantes.

O problema ameaça agravar-se, dado as chegadas de embarcações de migrantes não pararem, sobrelotando sistematicamente os centros de acolhimento (`hotspots`) locais, designadamente o de Lampedusa, na Sicília, o que obriga à transferência diária de dezenas ou centenas de migrantes para cidades de todo o país.

Hoje mesmo, o navio de busca e salvamento da organização não governamental (ONG) Open Arms desembarcou no porto de Carrara, na Toscânia, 196 migrantes, que serão distribuídos entre centros de acolhimento das regiões da Toscânia, Piemonte e Úmbria.

A ilha siciliana de Lampedusa continua a ser, no entanto, o principal ponto de desembarque dos migrantes que atravessam o Mediterrâneo desde a Líbia e Tunísia, tendo hoje registado mais 941 chegadas.

Como tem sido frequente ao longo dos últimos meses, o `hotspot` de Lampedusa está uma vez mais sobrelotado, acolhendo atualmente cerca de 2 mil pessoas, quando a sua capacidade oficial é de apenas 400.

Entretanto, na ilha siciliana de Lampedusa, muito mais a sul e mais perto de África do que de Itália, foram registadas mais 941 chegadas ao centro de registo, que acolhe atualmente mais de 2.000 migrantes, contra uma capacidade oficial de apenas 400.

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