Bielorrússia detém mercenários russos que estariam a preparar "ataques terroristas"

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
O presidente bielorrusso, Alexander Lukashenko (à esquerda) e o presidente russo, Vladimir Putin (à direita) Reuters

Na quarta-feira, as autoridades bielorrussas anunciaram a detenção de 33 mercenários russos, acusando-os de estarem a planear “ataques terroristas” para desestabilizar o país em vésperas das eleições presidenciais. Especialistas defendem, no entanto, que a detenção dos mercenários pode fazer parte de uma estratégia do atual presidente bielorrusso, Lukashenko, em busca de um sexto mandato.

A Bielorrússia defendeu que os mercenários detidos na quarta-feira nos arredores de Minsk pertencem à empresa privada de segurança Wagner, considerada próxima do Kremlin e que tem atuado em vários conflitos armados com o objetivo de proteger os interesses russos.

O secretário do Conselho de Segurança, Andrei Ravkov, afirmou que está ainda à procura de outros 200 mercenários russos que atravessaram a fronteira com o objetivo de preparar “ataques terroristas”. “Estamos à procura deles. Mas é como uma agulha num palheiro”, disse Ravkov.

Alexander Lukashenko, presidente da Bielorrússia dos últimos 25 anos, acusa a Rússia de procurar interferir nas eleições presidenciais que decorrem no próximo dia 9 de agosto. Na semana passada, Lukashenko defendeu que os mercenários russos podem ter sido enviados para o país para organizar um “Maidan”, referindo-se à revolução ucraniana de 2014 que derrubou o então presidente Viktor Yanukovych.

No entanto, há quem defenda o contrário: que a detenção dos mercenários faz parte de uma manobra para beneficiar Lukashenko, dado que o presidente bielorrusso está a enfrentar um dos maiores desafios ao seu domínio desde que chegou ao cargo em 1994. À crise política vivida na Bielorrússia, soma-se agora a controvérsia em torno da má resposta de Lukashenko à pandemia de Covid-19, o que originou protestos anti-governamentais por todo o país.

Para além disso, estas são as eleições mais competitivas da Bielorrússia em décadas, na medida em que se observa uma união entre a oposição e Svetlana Tikhanovskaya, candidata presidencial que atraiu multidões. Tikhanovskaya é vista como a única possibilidade de mudar o rumo político bielorrusso, depois de outros dois candidatos terem acabado por ser bloqueados na corrida à presidência. Viktor Babariko foi preso por acusações de lavagem de dinheiro e um terceiro candidato, Valery Tsepkalo, fugiu para Moscovo depois de ter alegado que foi decretada uma ordem para a sua detenção.

Uma das teorias para explicar a presença destes mercenários russos em Minsk é a de que estariam apenas de passagem. Alexander Alesin, especialista militar independente, explicou a The Guardian que há muito tempo que a Bielorrússia serve de corredor de circulação para operações russas no exterior e que o Governo de Lukashenko está informado sobre esta situação.

“Os russos usam a Bielorrússia para enviar tropas especiais para outros países já há muitos anos”, disse Alesin. “As agências de segurança bielorrussas sabiam de tudo isso e até ofereceram recentemente ajuda e assistência aos russos”, revelou ainda o especialista.

Alesin defende, por isso, que as detenções são uma estratégia de Lukashenko para mobilizar apoiantes antes da votação. “As autoridades estão a usar elementos da Wagner para assustar as pessoas antes das eleições ao inventarem um thriller sobre militantes russos”, afirmou o especialista militar. “As filmagens das detenções parecem absurdas: se os 33 elementos da Wagner estivessem realmente a planear organizar motins, eles não estariam a usar roupas de combate e camisolas com a palavra 'Rússia', assim como não estariam todos no mesmo lugar”, acrescentou.
Rússia nega qualquer intenção de “desestabilizar”
Após o anúncio da detenção dos 33 mercenários russos, o presidente bielorrusso exigiu explicações a Moscovo.

Esta quinta-feira, o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Bielorrússia convocou o embaixador russo “para fornecer explicações sobre os objetivos e outros aspetos acerca da chegada e da presença no nosso país de vários membros do referido grupo organizado, do qual existe um histórico comprovado de envolvimento em conflitos armados”.

Por sua vez, um porta-voz do Kremlin já veio negar qualquer intenção de desestabilizar a “aliada” Bielorrússia. “Existem insinuações de que organizações estão a enviar [elementos] para desestabilizar a situação na Bielorrússia (...), é óbvio que isso não é o caso. A Rússia e a Bielorrússia são aliadas, parceiros muito próximos”, afirmou o porta-voz russo, Dmitri Peskov, em declarações à comunicação social.

Segundo Dmitri Peskov, as autoridades de Minsk não transmitiram qualquer informação relativa “às atividades ilegais que poderão estar na base da detenção” dos cidadãos russos.

De qualquer forma, a detenção destes mercenários de nacionalidade russa veio alimentar as tensões entre os dois países. As relações entre Minsk e Moscovo são tradicionalmente cordiais, mas assinaladas por momentos regulares de tensão relacionados com as disputas energéticas.

Nos últimos meses, Lukashenko tem, no entanto, multiplicado declarações denunciando as pressões russas e acusando designadamente Moscovo de estar a forçar a Bielorrússia a abandonar a sua independência e a procurar manipular as eleições presidenciais.

c/agências
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