"Black Lives Matter". Debate sobre desfinanciamento da polícia chega ao Reino Unido

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Andrew Kelly - Reuters

“Defund the police” é uma das pautas do movimento Black Lives Matter (BLM). Os defensores pedem menos verbas para a polícia e um maior investimento noutras atividades que ajudem a melhorar a segurança pública. Há quem considere que esta é uma ideia “absurda” e há também quem a considere “realista e séria”.

A morte de George Floyd - o afro-americano asfixiado por um polícia branco em Minneapolis, nos EUA - desencadeou uma luta global contra o racismo e uma das ideias defendidas pelo movimento Black Lives Matter é o corte às verbas da polícia.

Os ativistas que têm saído à rua nas últimas semanas defendem que as forças policiais e centros prisionais recebem um financiamento desproporcionadamente elevado por parte dos Governos, em detrimento de outros serviços essenciais que poderiam ajudar a reduzir os índices de criminalidade, como a educação, ajudas à habitação e centros de apoio a vítimas de violência doméstica.

A ideia tem sido alvo de críticas em vários países. Nos EUA, o presidente Donald Trump e os sindicatos que representam os agentes policiais no país surgem como as principais vozes hostis às propostas de BLM. Para eles, a violência é um sinal de que os investimentos no policiamento são insuficientes e, pelo contrário, deveriam ser reforçados. Trump apelida os defensores de “radicais” e “esquerdistas” que “querem o fim da polícia”.

Já no Reino Unido, o líder do Partido Trabalhista, Keir Starmer, considerou “absurda” a ideia de cortar financiamentos à polícia e disse ser “uma pena que o movimento Black Lives Mattter esteja a envolver-se com estas questões organizacionais”.

“É absurdo”, disse Starmer. “Ninguém devia dizer nada sobre cortar verbas à polícia e eu não aceitaria isso”, acrescentou o líder da oposição britânica. Durante uma entrevista à BBC Breakfast na segunda-feira, Starmer disse que o seu “apoio à polícia é muito, muito forte”, destacando o seu período enquanto diretor do Ministério Público.

Porém, há quem considere que alguns críticos, como Keir Starmer, não terão compreendido o verdadeiro significado desta medida. Tal como explica Adam Elliott-Cooper, um investigador associado a sociologia na Universidade de Greenwich, no Reino Unido, as campanhas para cortar financiamento à polícia “não defendem que todas as prisões devam fechar amanhã e que todos os polícias serão demitidos no dia seguinte. Argumentam que os problemas sociais são mais bem abordados através de respostas sociais”.

Num artigo publicado no The Guardian, Elliott-Cooper assevera que a expansão da polícia e dos estabelecimentos prisionais nos últimos 30 anos não representou qualquer melhoria para a segurança pública britânica, sublinhando que a Grã-Bretanha tem o segundo maior orçamento per capita para policiamento na Europa. “Cortar verbas à polícia não significa um fim imediato ao policiamento, mas sim investir em políticas sociais que impedem pessoas de serem vítimas de violência em primeiro lugar”, escreve o sociólogo, considerando que esta é uma medida “realista e séria”.

Do ponto de vista de Elliott-Cooper, os manifestantes do movimento Black Lives Matter não exigem um corte à polícia apenas por causa do racismo. “É uma exigência que busca melhorias tangíveis, evidenciadas e efetivas na segurança pública para todos, a começar por aqueles que mais precisam”, explica o especialista.

A melhor maneira de combater o racismo no nosso sistema judicial e criar comunidades mais seguras para todos é através da redução do poder e dos recursos da polícia, além de reforçar a capacidade dos nossos sistemas de saúde, social e educacional”, concluiu Elliott-Cooper.
O que já foi feito?
No início de junho, nove dos 13 conselheiros municipais de Minneapolis anunciaram o início do processo de encerramento do departamento de polícia local. As autoridades locais declararam que “um novo modelo de segurança pública” será criado na cidade que conta com um longo histórico de racismo.

"Estamos aqui porque aqui em Minneapolis e nas cidades dos Estados Unidos, o nosso sistema atual de policiamento e segurança pública não mantém as nossas comunidades seguras", disse a presidente da Câmara Municipal de Minneapolis, Lisa Bender.

"Os nossos esforços para uma grande reforma falharam. Ponto final", acrescentou Bender, ressalvando que os detalhes do plano de revisão ainda precisam de ser discutidos.

Por sua vez, em Nova Iorque também foram dados novos passos. Na passada terça-feira, a Câmara Municipal de Nova Iorque aprovou o orçamento de 2021 onde estão implicados cortes nas verbas para a polícia. No entanto, alguns deputados contestam que ficou aquém do corte de mil milhões de dólares prometido pelo ‘mayor’ Bill de Blasio. O novo orçamento prevê um corte no departamento policial de quase 484 milhões de dólares e parte dos fundos serão destinados a projetos sociais para os jovens.

“Sei que muitos estão dececionados”, disse Bill de Blasio antes da votação. “Também estou dececionado. Eu queria que fôssemos mais fundo”, acrescentou. No entanto, o presidente da Câmara de Nova Iorque apelou a que os membros aprovassem o orçamento, considerando que “o acordo de hoje é necessário”.

É altura de fazer o trabalho de reforma, pensar profundamente sobre onde a nossa polícia deve estar no futuro”, disse Blasio. “Haverá críticos de todos os lados? Claro. Mas estou convencido de que isto é uma mudança real”, concluiu.

George Floyd, afro-americano de 46 anos, foi morto por um polícia branco norte-americano a 25 de maio, depois de este o ter pressionado com um joelho no pescoço durante cerca de oito minutos numa operação de detenção. Desde então, várias manifestações antirracismo têm decorrido em cidades de todo o mundo.
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