Bruxelas.PT - As Missões Externas da União Europeia

por Antena 1

Episódio original publicado a 12 de janeiro de 2024 | Foto: Genevieve Engel - © European Union 2019 - Fonte : EP

Uma conversa da jornalista Andrea Neves com a Embaixadora Ana Paula Moreira, Representante Permanente de Portugal no Comité Político e de Segurança.

Missões e OperaçõesQuais são as Missões da União Europeia no exterior?

Esse é o lado mais visível da Política de Segurança e Defesa: quando uma missão aparece como uma bandeira da União Europeia. É uma das formas mais evidentes de presença da União Europeia enquanto instrumento de segurança e de defesa.

E nessa vertente, precisamente porque a política comum é uma política comum de segurança e de defesa, nós temos efetivamente missões militares e missões Civis da União Europeia.
Missões MilitaresE estamos a falar de que tipo de missões?

Há mais de 30 Missões da União Europeia, missões civis e missões militares, e muitas vezes, no mesmo local temos uma missão civil e uma missão militar. Porquê? Precisamente porque a missão militar tem um papel de apoio às forças de defesa locais, às Forças Armadas, quando elas não existem, na resposta a situações de ameaça – estou a pensar, por exemplo, no Mali, uma capacidade de resposta para fazer face ao terrorismo, na República Centro-Africana, em Moçambique, etc., são missões orientadas, no fundo, para um aparelho de defesa tradicional, para apoiar as forças locais, enfim, muitas vezes até criar ou desenvolver forças nacionais – quando nós falamos de forças de segurança, de forças de defesa, falamos de forças armadas completas e, portanto, dos três ramos.

Mas é uma presença legitimada sempre pelo país terceiro?

A União Europeia, tem missões militares no terreno com mandatos muito claros, normalmente enquadrados a pedido, ou seja, a União Europeia está presente porque o país terceiro lhe pediu e, portanto, há um pedido formal – porque tem que haver uma legitimação e uma forma de presença – e a legitimação surge da resposta para o apoio e desenvolvimento de uma força militar no país terceiro, a pedido das Nações Unidas.

E como é que são financiadas estas missões da União Europeia?

Com a Bússola Estratégica há um reforço, por assim dizer, da capacidade de resposta da União Europeia, com a criação de um instrumento de natureza financeira – que resulta de um esquema de participação nacional dos Estados- Membros com base no seu Produto Interno Bruto, portanto, os Estados-Membros participam e contribuem financeiramente para o Mecanismo Europeu que tem valores previamente definidos. E depois há um ajustamento das suas ações.

Há um pilar de Missões e Operações e há um pilar de Medidas de Assistência aos países terceiros. São mecanismos que foram desenvolvidos precisamente para dotar a União Europeia de instrumentos próprios que lhe permitam responder às ameaças e ao desenvolvimento de uma cultura de segurança e o reforço da sua política externa e de segurança comum.

Não há um exército comum europeu, mas há uma mobilização dos Estados-Membros – porque a defesa é uma matéria de soberania nacional e continuará a ser – o que não quer dizer que os Estados não percebam que há necessidade de uma resposta comum.

Essas missões são de intervenção no terreno no conflito?

Não, a União não faz intervenção no conflito. A União faz formação, faz treino, pode ajudar a desenvolver as forças nacionais, ou seja, apoiar o desenvolvimento de uma estrutura, de umas forças armadas mais robustas, pode preparar as forças nacionais para serem capazes de responder, para que possam intervir numa situação de conflito.
Missões CivisDepois temos as missões civis que têm uma natureza diferente. Mas diferente em que sentido? O que é que essas missões civis querem alcançar em países terceiros?

São, enfim, mandatos mais orientados para o reforço da lei, para a capacidade de intervenção, de matéria mais legislativa, também. São missões orientadas para o desenvolvimento de um setor de segurança nos países terceiros, onde há estruturas muito frágeis, para o desenvolvimento de uma cultura policial das “Guardas Nacionais Republicanas” onde elas existem, para a criação de uma cultura baseada nos direitos humanos, com o reconhecimento de um conjunto de princípios e valores básicos que muitas vezes não são evidentes e que é necessário desenvolver a nível local. O objetivo é, no fundo, criar uma relação de confiança com as autoridades.

Por vezes são coisas tão simples como a criação de uma estrutura legislativa para as forças policiais ou para a articulação entre as forças de segurança e as forças militares. Podem ser missões para apoiar na definição de questões de competências em matéria judicial, de controlo de fronteiras, de gestão das alfândegas, etc. Portanto, são áreas muito diversificadas, dependem muito da natureza dos mandatos e das necessidades específicas de cada país.

Tudo isto sempre em parceria com o país terceiro, por vontade das autoridades desse país e para essas questões em concreto?

Em alguns casos consegue-se ir um pouco mais além, porque o próprio país terceiro percebe a vantagem dessas missões de natureza civil e é o próprio Estado – que ao perceber o potencial de ter ali uma força que lhe dá esse tipo de apoio – progressivamente vai solicitando um alargamento do mandato para o desenvolvimento de estruturas integradas de resposta.

Portanto, no fundo, é quase que uma missão de formação ligada a tarefas fundamentais de soberania e ensinando as regras da separação de poderes e de um conjunto de princípios e valores que são essenciais e que são a matriz da ação externa da União Europeia, que está sempre subjacente a essas próprias missões.
Manter a pazPoder-se-ia dizer que o objetivo destas missões e da Política Comum de Defesa e Segurança e da Política Externa da União Europeia, é manter a paz?

Sim, sim, a ideia é manter a paz e fazê-lo de forma integrada.

Ou seja, voltamos à questão que há pouco abordamos quando nos falamos uma intervenção em conflitos: não basta intervir em conflitos e por isso é que, quer no desenvolvimento da própria estratégia global quer no desenvolvimento da Bússola Estratégica, um dos pilares da União Europeia é precisamente o da abordagem integrada. É preciso dar uma resposta de paz e de estabilidade e, para isso, não basta uma intervenção ou a presença de uma força internacional.

É preciso dotar os países de uma capacidade de resposta a essas questões.

Não há resposta de natureza exclusivamente militar. É preciso desenvolver um outro tipo de instrumentos que, no fundo, são a resposta às causas profundas dessa instabilidade.

E que causas são essas nos dias de hoje?

São causas muito diversificadas. São questões de natureza económica, por exemplo, fragilidades de natureza económica e, portanto, relacionadas com o desenvolvimento. E cada vez mais nós temos que olhar para as questões de natureza ambiental, também. São os desafios levantados por questões mais antigas de natureza interétnica.

Falamos tradicionalmente da necessidade de não podermos olhar para os conflitos e para os problemas de uma forma setorial. Os problemas têm que ser tratados de forma integrada e, nesse aspeto, a União Europeia tem uma vantagem enorme, porque tem um conjunto de instrumentos que, de facto, compreendem toda a panóplia da segurança e de defesa, mas também toda uma série de instrumentos ligados a assistência humanitária, ao desenvolvimento e à estabilização e, portanto, tem mais do que outras organizações – que são de vertente mais restrita – um conjunto de soluções que nos permitem dar uma resposta mais integrada às várias questões.

No fundo, ajudar os países a criar os seus próprios mecanismos de desenvolvimento para ultrapassarem as situações de conflito e criarem mecanismos que permitam uma estabilização que seja benéfica para todos: para o próprio país, para a União Europeia e para os seus países vizinhos.

Para consulta:
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