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China. Manobras aéreas são "ensaio" para assumir controlo de Taiwan

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Reuters

Pelo segundo dia consecutivo, vários aviões militares chineses aproximaram-se de Taiwan numa altura em que o país realiza cerimónias em homenagem ao falecido presidente de Taiwan, Lee Teng-hui, conhecido por "Senhor Democracia". O Ministério da Defesa de Taipé instou as autoridades chinesas a "controlarem-se e a retirarem", ao passo que a China esclareceu que as manobras militares não são um "aviso, mas um ensaio" para assumir o controlo em Taiwan.

O Ministério da Defesa de Taiwan anunciou que 19 aeronaves chinesas, incluindo caças, estiveram envolvidas em manobras militares este sábado, mais uma do que as que tinham sido observadas no dia anterior.

"O ROCAF enviou aviões caça e implementou um sistema de mísseis de defesa aérea para monitorizar as atividades", disse o Ministério da Defesa na rede social Twitter, referindo-se à Força Aérea da República da China, a designação formal da Força Aérea de Taiwan.

Na sexta-feira, a China tinha já anunciado a realização de manobras militares no Estreito de Taiwan, que coincidia com a visita do vice-secretário de Estado dos Estados Unidos, Keith Krach, que chegou na quinta-feira à ilha para uma visita de três dias no âmbito das cerimónias em homenagem a Lee Teng-hui, falecido presidente de Taiwan.

Em comunicado, o Ministério chinês da Defesa justificou que os exercícios consistem numa "ação legítima e necessária, tomada em resposta à atual situação no Estreito de Taiwan, para salvaguardar a soberania nacional e a integridade territorial".

Por sua vez, o Ministério da Defesa de Taiwan condenou as manobras militares, considerando que a China está a agir em provocação, prejudicando seriamente a paz e a estabilidade. “O Ministério da Defesa condena isso veemente e apela às autoridades do continente [chinês] que se controlem e se retirem da fronteira”, disse em comunicado. China e Taiwan vivem como dois territórios autónomos desde 1949, altura em que o antigo Governo nacionalista chinês se refugiou na ilha, após a derrota na guerra civil frente aos comunistas. Mas a China considera Taiwan como território sob a sua soberania e opõe-se a qualquer tipo de interação oficial entre outros países e a ilha.

Por este motivo, a visita do vice-secretário de Estado dos EUA e, por sua vez, a aproximação de Washington a Taipé é altamente sensível para Pequim e os exercícios militares são mais um reflexo da tensão entre os dois país, que recentemente tem sido alimentada por questões comerciais e de segurança, mas também pela pandemia do novo coronavírus.
China a “um passo mais próximo da ilha”
Krach é o segundo mais alto funcionário dos EUA a visitar Taiwan em dois meses, depois da visita do secretário de Saúde norte-americano, Alex Azar, em agosto. Nessa altura, a China já tinha tomado ações semelhantes às manobras realizadas nos últimos dias.

Krach é, no entanto, o mais alto funcionário do Departamento de Estado dos EUA a visitar Taipé desde que os dois lados romperam os laços formais, em 1979, quando os EUA aceitaram a "política de uma só China", que pressupõe que Pequim é o único Governo legítimo de todos os territórios chineses.

A China já tinha advertido contra o envio do vice-presidente dos EUA à ilha depois de na segunda-feira, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China, Wang Wenbin, ter exortado os Estados Unidos a "interromperem todas as formas de intercâmbio oficial com Taiwan". A China tem uma "vontade firme, total confiança e capacidade suficiente para impedir todas as interferências externas e ações separatistas das forças de independentistas de Taiwan", avisou o porta-voz do ministério.

Um mapa fornecido pelo Ministério demonstra que nenhum dos aviões chineses chegou perto do continente de Taiwan. No entanto, em tom de ameaça, o jornal Global Times, do Partido Comunista Chinês, escreveu na sexta-feira que “cada vez que um alto funcionário dos EUA visitar Taiwan, os caças do PLA [Exército de Libertação Popular] deviam estar um passo mais perto da ilha”.

No artigo é deixado claro que o alvo da China é “dissuadir o conluio entre os EUA e a ilha”, acrescentando que a aproximação dos dois países “está a tornar-se a fonte mais importante de agitação no estreito de Taiwan”.

“Os EUA e Taiwan não devem avaliar erradamente a situação, ou acreditar que o exercício militar é bluff. Se eles continuarem com as provocações, romperá, inevitavelmente, uma guerra”, acrescenta o editorial publicado no jornal, sublinhando que as manobras militares não são um “aviso, mas um ensaio” para assumir o controlo em Taiwan.

“O continente está determinado a tomar todos os meios necessários, incluindo opções militares, para evitar que os EUA e a ilha aumentem as suas provocações”, lê-se ainda no artigo.

Analistas dizem que a resposta militar chinesa é uma mensagem clara para os EUA contra a rutura do equilíbrio que Washington tinha mantido sob as administrações anteriores.

Do lado de Taiwan, o Governo parece ver os EUA - com a liderança de Trump e as tensões com Pequim - como uma oportunidade de lutar por uma relação mais estreita com Washington e, por sua vez, alcançar o objetivo de ser reconhecido internacionalmente como um país independente.

Johnny Chiang, líder do principal partido de oposição de Taiwan, o Kuomintang, escreveu na sua página do Facebook que ambos os lados precisam de retomar o diálogo para reduzir o risco de guerra. “As pessoas que desejam desempenhar um papel na comunicação são estigmatizadas e aqueles que clamam pela guerra são considerados heróis. Essa atmosfera definitivamente não é favorável ao desenvolvimento pacífico e estável do estreito de Taiwan”, defendeu Chiang, cujo partido tradicionalmente privilegia os laços com a China.
O adeus ao “Senhor Democracia”
Os exercícios militares – apelidados pelos EUA de “fanfarronice militar” – acontecem numa altura em que Taiwan lamenta a morte do primeiro presidente a ser democraticamente eleito em Taiwan.

À semelhança da sua cerimónia fúnebre, Lee Teng-hui tomou posse em março de 1996 também perante jogos de guerra e testes balísticos da China nas águas próximas a Taiwan. Lee Teng-hui, que faleceu em julho aos 97 anos, foi presidente de 1988 a 2000. Era apelidado de “Senhor Democracia” por ter terminado com o regime autocrático a favor de eleições livres e por defender a independência de Taiwan.

Num discurso durante o memorial que decorreu este sábado, a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, disse que Lee Teng-hui moldou o país de atualmente. “Confrontado com desafios internacionais intimidadores, ele habilmente liderou o povo de Taiwan ao promover uma diplomacia pragmática. Taiwan tornou-se o sinónimo de democracia e foi impulsionado para o palco mundial. Por causa disso, o presidente Lee passou a ser elogiado como o ‘Presidente Democracia’”, disse a presidente taiwanesa.

“Graças aos seus esforços, Taiwan agora brilha como um farol da democracia”, concluiu a presidente.

c/agências
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