Dois estudos publicados esta segunda-feira indicam que o aumento de temperatura acima de 1,5ºC verificado no ano de 2024 é uma tendência de longo prazo que deverá prolongar-se por pelo menos 20 anos.
As investigações, cujos resultados foram publicados em simultâneo na revista Nature Climate Change, sugerem que o planeta pode ter entrado num período de várias décadas acima de 1,5°C.Em ambos os estudos, os investigadores questionam-se se o facto de ser
ultrapassado o limiar de 1,5°C ao longo de um ano não representa um
"alerta precoce", indicando que o limite de longo prazo já está em
processo de ser ultrapassado.
Uma equipe baseada na Alemanha e na Áustria analisou a questão combinando dados observados e modelos.
Os cientistas notaram que, desde o início do aquecimento global, sempre que um ano tenha ultrapassado certos níveis de aumento nas temperaturas médias, estes permanecem ao longo de duas décadas.
Se o extrapolarmos para o limiar de 1,5°C, este modelo sugere que o período de 20 anos acima desta temperatura "já começou e que os efeitos esperados a 1,5°C de aquecimento começarão a surgir", escrevem os autores. "A menos que sejam implementadas reduções ambiciosas de emissões", sublinham.
O mundo ainda está apenas no início deste período, alertam ainda. Teremos provavelmente de esperar dez anos para estabelecer que o aquecimento médio excedeu 1,5°C ao longo de duas décadas. Esta estimativa a 20 anos é consistente com a dos cientistas do IPCC, os especialistas contratados pela ONU, que prevêem que há uma probabilidade em duas de vermos, entre 2030 e 2035, o clima aquecer em média 1,5°C.
O segundo estudo publicado na segunda-feira utiliza metodologia e períodos de referência ligeiramente diferentes, mas produz uma conclusão comparável.
"Se a anomalia de 1,5°C continuar além de 18 meses consecutivos, é quase certo que o limiar do acordo de Paris será ultrapassado", mesmo num cenário intermédio de emissões de gases com efeito de estufa (cenário conhecido como "SSP 2-4.5" do IPCC), especifica Alex Cannon, do Ministério canadiano do Ambiente e Alterações Climáticas.
Os investigadores sublinham a importância de se tentar conter tanto quanto possível o aquecimento global, calculando que cada fracção adicional de grau irá trazer mais riscos, como ondas de calor ou a destruição da vida marinha.
Temperaturas acima dos 1,5ºC
Baseando-se em seis grandes bases de dados internacionais, a OMM, a Organização Meteorológica Mundial, indicou que o ano transato foi o primeiro ano civil a registar um aquecimento global acima de 1,5ºC, com uma temperatura média na superfície do planeta 1,55°C superior à média do período 1850-1900.
Antes disso, uma série de doze meses consecutivos acima deste limiar já tinha sido observada pelo observatório europeu Copernicus.
A secretária-geral da OMM, Celeste Saulo, frisa contudo a habitual mensagem de cautela das principais agências climáticas.
"Um único ano acima de 1,5°C não significa que não tenhamos conseguido atingir os objectivos de temperatura a longo prazo do Acordo de Paris, que abrangem décadas", lembrou à Agência France Press.
O acordo histórico de 2015 visa manter o aquecimento bem abaixo dos 2°C e prosseguir esforços para o limitar a 1,5°C.
Mas estas temperaturas referem-se a uma média climática, normalmente superior a 20 anos, tornando possível suavizar a variabilidade das temperaturas de um ano para o outro. De acordo com esta definição, o aquecimento actual ronda os 1,3°C.