Comissão eleitoral de Macau apoia exclusão coletiva de candidatos ao parlamento

A comissão eleitoral de Macau afirmou hoje apoiar a decisão da Comissão da Defesa da Segurança do Estado (CDSE) de afastar todos os integrantes de uma lista quando um candidato ao parlamento é excluído por falta de patriotismo.

Lusa /
Foto: gov.mo

"Somos a favor desta decisão e também [estamos] de acordo com este parecer, de excluir essas pessoas", declarou o presidente da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL), Seng Ioi Man, após uma reunião desta comissão.

Há uma semana, a CDSE excluiu todos os 12 candidatos de duas listas eleitorais, considerando-os "não defensores da Lei Básica [a `mini-Constituição` de Macau] ou não fiéis à Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China"

Num comunicado, a CDSE explicou que, quando um candidato é desqualificado por falta de patriotismo, todos os outros candidatos da mesma linha são também afastados.

Questionado hoje sobre a legalidade da medida, Seng Ioi Man respondeu que a CDSE age "de acordo com o artigo 33 da lei eleitoral e "com os procedimentos e os factos que são fundamentos para realizar os trabalhos de verificar" se os candidatos "correspondem ou não aos critérios de participar na eleição".

O artigo 33 estabelece que cabe à CDSE "determinar se os candidatos defendem a Lei Básica e são fiéis à Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China, bem como emitir parecer vinculativo para a CAEAL sobre a verificação de desconformidades".

Em declarações à Lusa, o jurista português António Katchi disse, na semana passada, que "nenhuma disposição da lei eleitoral para a Assembleia Legislativa afirma que a exclusão de um ou mais candidatos de uma lista implica necessariamente a rejeição dessa lista ou dos restantes candidatos da mesma".

A CDSE "tem de apreciar o comportamento de cada candidato individualmente e indicar, no seu parecer, os fundamentos de facto e de direito que sustentam a sua conclusão de que ele deverá ser excluído", defendeu o constitucionalista.

"É comummente reconhecido que a responsabilização coletiva ofende o valor constitucional basilar que é a dignidade da pessoa humana", sublinhou Katchi, que trabalhou em Macau mais de duas décadas.

Joe Chan Chon Meng, um dos candidatos excluídos, comparou a decisão com o sistema de punição coletiva implementado durante a Revolução Cultural (1966--1976) na China.

"Não posso mesmo acreditar. Nunca ouvi falar deste sistema em todo o mundo. A Lei Básica dizia que eu tinha o direito de votar ou ser votado. Isto é como voltar à Revolução Cultural", disse à Lusa Joe Chan.

António Katchi defendeu que a impossibilidade de "reclamação nem recurso contencioso" viola o artigo 36 da Lei Básica, que dá aos residentes de Macau "o direito de intentar ações judiciais" contra o Governo.

Seng Ioi Man recusou-se a revelar os factos que levaram à exclusão, defendendo que "os trabalhos e documentos da Comissão da Defesa da Segurança do Estado são confidenciais".

A divulgação "pode representar certos riscos para a segurança nacional, não devendo nem podendo ser publicado o seu conteúdo", acrescentou.

Mas Katchi sublinhou que o princípio da confidencialidade "não é absoluto", uma vez que o presidente da CDSE, que é também o líder do Governo de Macau, Sam Hou Fai, pode autorizar a divulgação de informação.

"O que é certo é que esta confidencialidade não só impede a população de saber quais foram as razões invocadas pela [CDSE], como nem sequer lhe permite ter a certeza de que esta tenha realmente invocado quaisquer razões", referiu.

Em 2021, foi a comissão eleitoral a excluir cinco listas e 21 candidatos - 15 dos quais pró-democracia.

Com a decisão da semana passada, concorrem às eleições de 14 de setembro seis listas pelo sufrágio direto, menos oito do que em 2021.

Trinta e três deputados integram a AL, sendo que 14 são eleitos por sufrágio direto, 12 por sufrágio indireto, através de associações, e sete são nomeados posteriormente pelo chefe do Governo local.

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