Conferência das Línguas Portuguesa e Espanhola destaca papel da IA

A IV Conferência Internacional das Línguas Portuguesa e Espanhola (CILPE), em Cabo Verde, terminou hoje com um apelo ao reforço das duas línguas nos sistemas de inteligência artificial (IA) e ao uso da tecnologia para estabelecer diálogos.

Lusa /

"Queremos que haja um reforço das línguas portuguesa e espanhola na inteligência artificial", referiu Fátima Fernandes, docente da Universidade de Cabo Verde (UniCV), no resumo de dois dias de apresentações e debates que a instituição acolheu, na cidade da Praia, num evento da Organização de Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI).

A implementação de sistemas de IA é um dos grandes temas da atualidade a nível global e acabou por ser transversal a várias áreas na CILPE: esteve em foco num painel dedicado à economia, mas também noutros sobre educação e multilinguismo.

Num dos pontos do resumo hoje apresentado, considerou-se necessário defender, em todos os países, "o direito à língua materna", porque "as línguas não podem estar concentradas em si mesmas, mas [devem] partilhar de um universalismo que defenda esse mundo de interconexões e empatias de que a IA não pode ser inimiga".

A IV CILPE serviu para apresentar um projeto com o título "kriOI(u) - Modelos linguísticos em grande escala", liderado pelo Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE) e pela UniCV para disseminação da língua cabo-verdiana (também designada como crioulo) em serviços digitais e de IA, recursos de leitura e escrita ou ferramentas de tradução, entre outros objetivos.

O projeto arrancou em outubro e tem a duração de 15 meses para "disponibilizar recursos linguísticos e ferramentas de processamento de língua natural ainda inexistentes para o crioulo cabo-verdiano, garantindo à comunidade falante desta língua acesso aberto e código livre", lê-se na ficha de projeto.

O resumo dos encontros apontou a língua como "infraestrutura invisível que alimenta algoritmos" na base de conhecimento e IA, uma ferramenta de trabalho, mas também base de cidadania.

Ao longo da CILPE houve vários apelos ao diálogo e multilinguismo, como antes do encerramento, numa intervenção da escritora brasileira Ana Maria Gonçalves, primeira mulher negra a entrar na Academia Brasileira de Letras, desde sexta-feira.

"Para os institutos de divulgação e promoção da língua portuguesa, rogo a sensibilidade de entenderem que o não financiamento de projetos, apenas porque promovem as variantes brasileiras, africanas e asiáticas do português, é dar continuidade ao violento processo colonial, cuja pureza linguística não dá conta do que nós, povos tocados pela escravidão, temos a dizer, não apenas como denúncia ou memória, mas como cura e expansão", referiu.

Segundo referiu, parece ignorar-se que "a língua portuguesa se fortalece perante o mundo, também através do número de falantes absurdamente maior fora do que dentro de Portugal", mas "é Portugal que recebe e controla a maioria dos recursos financeiros e das iniciativas de divulgação e promoção da língua, como se as outras variantes fossem meras coadjuvantes ou ferramentas de apoio".

"É urgente e eticamente necessário um esforço conjunto e proativo" nas questões de investimento na língua "para que construamos juntos a humanidade de que todos nos beneficiamos", concluiu.

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