Covid-19. Estudo alerta para mutações que podem "escapar às nossas vacinas"

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Stevo Vasiljevic - Reuters

Um estudo publicado na revista Nature na segunda-feira investigou a eficácia das atuais vacinas contra as variantes do Reino Unido e da África do Sul e concluiu que a sul-africana é mais “preocupante”, na medida em que é mais resistente aos tratamentos e vacinas existentes. Os investigadores apelam a que se redobrem os esforços de mitigação da pandemia, alertando que o vírus “está a caminhar numa direção que pode, em última instância, levá-lo a escapar às nossas vacinas e tratamentos”.

O surgimento das variantes do Reino Unido e da África do Sul gerou preocupação não só pela sua maior capacidade de transmissão, mas também pelas alterações que provocam na proteína Spike – usada pelo coronavírus como uma chave para entrar nas células humanas –, o que pode alterar a capacidade neutralizante por parte de vacinas ou de tratamentos com anticorpos monoclonais.

Estudos recentes têm vindo a demonstrar a eficácia das vacinas contra algumas destas novas variantes. No entanto, o recente estudo publicado na revista científica Nature alerta que, se a vacinação não avançar rapidamente em todo o mundo, as variantes irão sofrer novas mutações que podem escapar aos efeitos das vacinas e dos tratamentos.

No estudo, os investigadores analisaram a eficácia das vacinas da Moderna e da Pfizer, assim como tratamentos com anticorpos monoclonais e plasma convalescente, contra as variantes do Reino Unido (conhecida cientificamente por B.1.1.7) e a da África do Sul (B.1.351). No geral, os resultados demonstram que a variante identificada pela primeira vez na África do Sul é mais resistente a tratamentos e vacinas do que a britânica.

Segundo a investigação, a proteção das vacinas contra a variante B.1.1.7 permaneceu “amplamente intacta” e não é esperado nenhum efeito adverso. Por outro lado, a variante B.1.351 mostrou ser muito mais resistente aos anticorpos, com as vacinas a demonstrarem ser 10,3 a 12,4 vezes menos eficazes.

Em relação aos tratamentos com anticorpos monoclonais, o estudo aponta que as duas variantes foram resistentes à sua neutralização, sendo que a variante sul-africana foi mais resistente a um maior número de tratamentos.

Por último, o plasma convalescente de pessoas que recuperaram da Covid-19 não mostrou mudanças significativas na atividade neutralizadora contra a variante britânica, mas a redução da eficácia em relação à sul-africana é “notável”.

Muitas destas resistências por parte da variante sul-africana devem-se, em parte, à E484K, uma mutação partilhada por esta estirpe e pela brasileira, conhecida por variante P.1.

O estudo não analisou a variante que surgiu inicialmente no Brasil, que apresenta mutações semelhantes na proteína Spike às do Reino Unido e da África do Sul. No entanto, o estudo alerta que muitas das conclusões relativamente à variante B.1.351 “seriam provavelmente semelhantes” às da variante brasileira.
Risco de reinfeção
As conclusões do estudo vão ao encontro de relatórios da Novavax e da Johnson & Johnson, que demonstram uma queda na eficácia destas vacinas nos ensaios conduzidos na África do Sul. Também a farmacêutica AstraZeneca anunciou que a sua vacina oferece apenas uma proteção limitada contra doenças leves causadas pela variante sul-africana da Covid-19.

Em termos de mutações, este vírus está a caminhar numa direção que pode, em última instância, levá-lo a escapar às nossas vacinas e tratamentos atuais que são direcionados à proteína viral Spike”, lê-se no estudo.

O estudo alerta que, “se a disseminação desenfreada do vírus continuar e mais mutações graves se acumularem”, a humanidade pode estar “condenada a perseguir de forma contínua a evolução do SARS-CoV-2, como há muito fazemos com o vírus da gripe”.

Para além disso, a investigação alerta ainda para a possibilidade de reinfeção, afirmando que a contração do vírus por parte de uma pessoa já curada “pode ser mais provável se o paciente for confrontado com estas variantes, especialmente a da África do Sul”.

A investigação apela, por isso, a que se redobrem os esforços de mitigação da pandemia “o mais rápido possível”, acelerando o envio das vacinas a todos os países.
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