Covid-19. Plitidepsina mostra-se 100 vezes mais eficaz que Remdesivir

por Cristina Sambado- RTP
Francis Mascarenhas - Reuters

Um estudo revela que um medicamento usado no tratamento do cancro bloqueia a multiplicação do SARS-CoV-2 em células humanas e em ratos com a doença Covid-19. A Plitidepsina, um antiviral produzido em Espanha, é 100 vezes mais eficaz que os medicamentos usados até agora.

O grupo de cientistas, liderado pelo virologista espanhol Adolfo García-Sastre, do Hospital Sinai, em Nova Iorque, afirma que a Plitidepsina é 100 vezes mais potente que o Remdesivir, o primeiro antiviral para travar a Covid-19, que até agora não demonstrou uma eficácia contundente.

A Plitidepsina é um medicamento sintético à base de uma substância produzida por uma espécie de ascídias do Mar Mediterrâneo: animais invertebrados e hermafroditas que vivem ancorados em pedras. A empresa Pharmamar desenvolveu um medicamento com a marca Aplidina para tratar o mieloma múltiplo – um cancro com origem nos plasmócitos da medula óssea – que para já apenas foi aprovado na Austrália.

Depois do início da pandemia, a empresa espanhola Pharmamar deu início a ensaios clínicos que usam o medicamento contra a Covid-19.

Segundo a empresa, o composto reduz a carga viral em doentes hospitalizados, no entanto, os dados científicos verificados ainda não foram publicados.

Segundo um estudo publicado na revista Science, a equipa de García-Sastre, em conjunto com especialistas da Universidade da Califórnia, em São Francisco, do Instituto Pasteur de Paris e da empresa Pharmamar, rastreou todas as proteínas do novo coronavírus que interagem com as proteínas humanas. De seguida, analisaram os medicamentos conhecidos que podem interferir nessas interações e identificaram 47 fármacos promissores. Entre eles a Plitidepsina que parece um dos mais promissores. É entre nove a 85 vezes mais eficaz na multiplicação do vírus do que os dois outros medicamentos do mesmo grupo.
  
Os tratamentos dirigidos não contra o vírus, mas contra uma proteína específica do paciente são mais eficazes no surgimento de novas variantes.A equipa de García-Sastre pulicou ainda outro estudo, este apenas preliminar, no qual demonstra que estes dois tratamentos - Plitidepsina e Ralimetinib, outra molécula usada no tratamento do cancro – têm eficácia semelhante contra a variante britânica do SARS-CoV-2. O mesmo acontece com o Remdesivir, que é diretamente direcionado contra o vírus, mas a Plitidepsina é dez vezes mais potente contra o novo coronavírus que o Remdesivir.


Os cientistas compararam os efeitos da Plitidepsina com os do Remdesivir em dois grupos de ratos infetados com SARS-CoV-2. E os resultados demonstram que a Plitidepsina reduz a duplicação do vírus cerca de cem vezes mais e combate também a inflamação no trato respiratório.

A molécula não ataca o vírus diretamente, na sim uma proteína humana necessária para sequestrar a máquina biológica das células e usá-la para fazer milhares de cópias de si mesma.

A Plitidepsina bloqueia uma proteína humana conhecida como eEF1A, sem a qual a máquina de duplicação do vírus é incapaz de funcionar.

“Os nossos resultados e os dados positivos dos ensaios clínicos da Pharmamar sugerem que outros testes clínicos com Plitidepsina devem ser priorizados para o tratamento da Covid-19”, concluem os autores do estudo.

“O mecanismo molecular para o qual este fármaco é direcionado também é importante na duplicação de muitos outros vírus, incluindo o da gripe e vírus respiratório sincitial”, explicou García- Sastre. Longo caminho a percorrer

 No entanto, especialistas independentes frisam que há ainda um longo caminho a percorrer. “Estamos perante um excelente estudo pré-clínico realizado por um grupo de investigadores muito confiável”, afirmou Marcos López, presidente da Sociedade de Imunologia espanhola.

Já Elena Muñez, investigadora no Hospital Puerta de Hierro em Madrid, frisa que “estes resultados são muito preliminares”.

“Este tipo de dados pré-clínicos é feito com experiências em ratos totalmente controlados, situação bem diferente da que vivemos com os doentes internados”, acrescentou em declarações ao jornal espanhol El País.

Para a virologista do CSIS Isabel Sola o estudo “é muito promissor porque nos fornece um novo tratamento contra a infeção”.

A equipa de Isabel Sola tinha realizado um estudo anterior sobre a utilização da Plitidepsina e descobriu que era eficaz na prevenção da duplicação do vírus da gripe e da SARS de 2002. Um dos pontos fortes deste novo medicamento é a sua baixa toxidade em doses moderadas. Informação que vem de estudos realizados para medir o efeito da Plitidepsina contra o mieloma.

O mecanismo de ação deste medicamento é novo. Pode ser direcionado às células da pessoa infetada e não ao vírus, poderia ser usado em conjunto com o Remdesivir, o que é positivo”, afirma a Ana Fernández Cruz, assistente de doenças infeciosas do Hospital Puerta de Hierro em Madrid.

A Pharmamar está a finalizar o processo oficial para solicitar um ensaio clínico da fase III, no qual será estudada a eficácia do medicamento em doentes hospitalizados.


“Este trabalho confirma poderosa atividade e o alto índice terapêutico da Plitidepsina e que, devido ao seu mecanismo de ação especial, ela inibe a SARS-CoV-2 independentemente da mutação na proteína S, como as das variantes da África do Sul e do brasil ou as novas mutações que surgiram recentemente na Dinamarca”, esclareceu José María Fernández, presidente de Pharmamar.

“Estamos a trabalhar com as agências de medicamentos para começar o teste de fase III que será realizado em vários países”, acrescentou.
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