Covid. Extrema-direita israelita apela à desobediência civil contra um Netanyahu titubeante

O desafio partiu de um antigo e dos mais fortes aliados do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu no passado recente. Perante as hesitações do executivo na luta contra a pandemia de covid-19, Avigdor Liberman, antigo ministro da Defesa e chefe do partido nacionalista Yisrael Beitenu, veio esta segunda-feira apelar à população para ignorar as directivas do governo e agir antes de acordo com o bom senso. O ‘gabinete coronavírus’ está sempre a falar de “encerramento, mas o que nós precisamos é de ordem”, lançou Liberman durante uma reunião do partido, num momento em que Netanyahu recuou na decisão de confinar as comunidades que apresentam taxas elevadas de infecção.

Paulo Alexandre Amaral - RTP /
Reuters

Liberman, que há muito deixou as fileiras de Benjamin Netanyahu, considera que os israelitas devem simplesmente ignorar as ordens do executivo relativamente aos planos de combate à pandemia. As razões que apresenta: são ilegais e servem para manter a população refém dos interesses de Netanyahu.

“Nós estamos sempre a ouvir falar de encerramento, mas do que precisamos é de ordem”, declarou Avigdor Liberman durante uma reunião do Yisrael Beitenu. “É impossível que os cidadãos do Estado de Israel se tornem reféns do [ministro do Interior Arye] Deri, do [ministro da Habitação e Construção Ya'acov] Litzman e de [Moshe] Gafni. As decisões do gabinete coronavírus não estão a ser tomadas com base em dados científicos e não são nem transparentes nem lógicas”, sublinhou.

Liberman acusa Netanyahu de sacrificar a saúde pública em nome da estabilidade da coligação no poder, o que, na sua análise, leva a que “todas as decisões tomadas sejam flagrantemente ilegais”.

Foi com base nesta leitura que Liberman deixou um apelo aos israelitas: “Sugiro que as pessoas ignorem as directrizes do governo e ajam de acordo com o bom senso”. Um apelo à desobediência civil que mereceu fogo à peça por parte dos membros da equipa de Netanyahu.

O ministro da Saúde, Yuli Edelstein, veio de imediato acusar o líder da extrema-direita de “brincar com o fogo”, considerando que Liberman “está a agir de forma irresponsável ao procurar aproveitar-se da frágil situação económica e sanitária” que se instalou no país com a pandemia.

Edelstein tinha sido particularmente visado pelas críticas de Liberman, que considerou que o “gabinete coronavírus” deveria ser desmantelado e as decisões para lidar com a crise sanitária entregues às autoridades locais, com os seus comissários próprios: “O governo perdeu a confiança das pessoas e já não a merece”.

Benny Gantz, líder da coligação Azul e Branco e que segundo acordo que saiu das últimas legislativas israelitas alternará com Netanyahu na cadeira de primeiro-ministro, já veio dizer que “as pessoas estão a olhar para nós, para os nossos conflitos e lutas de egos, e esperam de nós que sejamos capazes de pôr de lado os nossos interesses pessoais para lidar com o coronavírus”.

Todas as ajudas serão poucas para Benjamin Netanyahu nesta fase da pandemia, com o país a enfrentar números elevados de covid-19 e os ataques ao executivo a surgirem de todos os quadrantes. O Haaretz acaba de noticiar que o primeiro-ministro voltou atrás na decisão de impor um fechamento das actividades em comunidades com elevadas taxas de infecção, o que valeu nova barragem de críticas.

O atraso na decisão já tinha colocado Netanyahu na linha de fogo, tanto da comunidade árabe, como dos ultraortodoxos, onde os números de covid-19 estão a disparar, ainda que por razões contrárias. Quando as escolas da minoria árabe tinham já a ordem para encerrar, a pressão política dos ultraortodoxos resultou num recuo da decisão inicial de Netanyahu, a impor agora apenas um confinamento parcial, com incidência nos períodos da noite.

Na mesma onda de críticas de Avigdor Liberman, o deputado Yair Golan, do partido de esquerda Meretz, considera que a leitura à linha de decisão do executivo “é simples. Bibi [diminutivo por que é também conhecido o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu] está a ceder perante tudo o que lhe pedem os ultraortodoxos e, em troca, eles tiram-no da prisão”.

“Estamos todos reféns. Netanyahu não tem medo de Deus, mas dos representantes de Deus no Parlamento”, afirmara a este propósito Liberman, com Netanyahu, em sua defesa, a garantir que a pandemia não é a prioridade do governo.
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