Dados da UNICEF: 175 milhões de crianças sem acesso ao pré-escolar

De acordo com o relatório global “Um Mundo pronto para aprender: priorizar a educação pré-escolar de qualidade”, a organização das Nações Unidas para a infância defende um maior investimento mundial no ensino pré-escolar, referindo que mais de 175 milhões de crianças, ou seja, cerca de metade das crianças em idade pré-escolar no mundo, não estão matriculadas no ensino pré-escolar, perdendo oportunidades e sofrendo profundas desigualdades desde uma altura precoce das suas vidas.

Nuno Patrício - RTP /
© UNICEF/UN0220813/Matas

No relatório a UNICEF alerta para a falta de investimento por parte da maioria dos governos em todo o mundo, e dá a conhecer que, em países de baixos rendimentos, o quadro é particularmente preocupante, com apenas uma em cada cinco crianças matriculadas no ensino pré-escolar.

“A educação pré-escolar é a base da educação das nossas crianças - cada etapa da educação que se seguir dependerá do sucesso desta”, disse a Diretora Executiva da UNICEF, Henrietta Fore. “No entanto, esta oportunidade é negada a demasiadas crianças em todo o mundo, o que aumenta o risco de retenções ou de abandono escolar, deixando-as para trás em relação a outras crianças mais afortunadas”.
A taxa de frequência das crianças em Portugal em educação pré-escolar é de 92,5 por cento (a média da União Europeia é de 95,3%). Investindo o Governo cerca de 8,8 por cento do orçamento em Educação no ensino pré-escolar.
De acordo com a organização da ONU, as crianças que frequentam pelo menos um ano de educação pré-escolar têm maior probabilidade de desenvolver as competências essenciais para poderem ter sucesso escolar e ficam menos propensos a retenção ou abandono escolar. Ficando desta forma mais capazes de contribuírem para a construção de sociedades e economias pacíficas e prósperas quando atingirem a idade adulta.

Já as crianças que frequentam a educação pré-escolar têm mais do dobro de probabilidade de adquirirem competências iniciais de literacia e nas matemáticas, do que aquelas a quem o acesso lhes é negado ou inacessível.

Por exemplo, no Nepal, as crianças integradas em programas de educação pré-escolar têm uma probabilidade 17 vezes superior de adquirem competências de leitura e no domínio da matemática. Nos países em que mais crianças frequentam programas de pré-escolaridade, verifica-se que mais crianças concluem a escola primária e obtêm competências mínimas em leitura e matemática quando terminam esse nível de ensino.

Pela primeira, vez várias crianças, filhos de pastores nómadas da Mongólia, frequentam um espaço educativo pré-escolar, dando-lhe os primeiros passos educativos, raros e fundamentais para o desenvolvimento intelectual humano.



Nove em cada dez crianças portuguesas com acesso a ensino pré-escolar
Apesar de não constar neste relatório, Portugal serve de base comparativa, apresentando valores de frequência e investimento na educação pré-escolar a par dos verificados em países desenvolvidos. A taxa de frequência das crianças em Portugal em educação pré-escolar é de 92,5 por cento (a média da União Europeia é de 95,3%). Investindo o Governo cerca de 8,8 por cento do orçamento em Educação no ensino pré-escolar.

A UNICEF apela aos governos que proporcionem pelo menos um ano de educação pré-escolar de qualidade a todas as crianças – e que esta seja uma realidade quotidiana para todas as crianças – especialmente para as mais vulneráveis e excluídas.Atendendo a que o Governo "estabeleceu como meta o final da legislatura para a universalização do acesso à educação pré-escolar (…) beneficiando, em particular, aqueles que vivem em condições de maior privação e vulnerabilidade”, a Diretora Executiva da UNICEF em Portugal, Beatriz Imperatori, sublinha a importância de “estas metas serem alcançadas, garantindo serviços de qualidade, inclusivos, economicamente comportáveis e adaptados às necessidades das crianças e das suas famílias". 

Nesse sentido, defende a mesma responsável, "as crianças mais fragilizadas pela pobreza e exclusão social devem constituir um campo de ação prioritário das políticas públicas em Portugal e é por este motivo que a UNICEF Portugal apela à adoção de uma Estratégia Nacional para a Erradicação da Pobreza Infantil, centrada numa abordagem multidimensional e que inclua medidas integradas e um investimento em serviços públicos, como a educação pré-escolar. 

As crianças que crescem em situação de pobreza ou exclusão social têm menor probabilidade de frequentar a educação pré-escolar, de ter sucesso escolar, de gozar de boa saúde e de desenvolver plenamente as suas potencialidades. Portugal deve adoptar esta Estratégia Nacional para garantir o desenvolvimento adequado e oportunidades iguais para todas as crianças, sem exceção". 
Uma familia de pastores nómadas na Mongólia

A UNICEF, organização das Nações Unidas para Infância, dá a conhecer a família Erdenebat. Estes pastores nómadas, vivem na província de Bayankhongor, parte ocidental da Mongólia. Deslocam-se duas a três vezes por ano à procura de pastagens para o seu gado e pela primeira vez, no dia 17 de junho de 2018, os dois filhos mais novos frequentaram um jardim-de-infância móvel. 

A família diz que o acesso à educação para os filhos é um grande problema. “Não há escolas em volta de nossa área”, diz Bat-Orshikh [pai]. O jardim-de-infância móvel, apoiado pelo UNICEF, oferece desta forma uma solução de baixo custo e alto impacto e oferece às crianças de algumas das comunidades mais isoladas do país o acesso a uma educação infantil de qualidade.

A pré-escola móvel, que funciona no verão, quando os pastores estão mais ocupados, ensina às crianças habilidades básicas de alfabetização para ajudar a prepará-las para a escola primária. As crianças, por sua vez, aprendem a usar instalações de água, saneamento e higiene, que muitas vezes não estão disponíveis em suas casas, e surgem também a oportunidade de interagir e desenvolver habilidades sociais e emocionais críticas.



Localização geográfica, educação e fatores económicos determinantes

O relatório da UNICEF observa que a riqueza das famílias, o nível de educação das mães e a localização geográfica são critérios chave para a frequência do enino pré-escolar. No entanto, a pobreza é o fator determinante. Algumas evidências deste estudo:

• Papel da pobreza: Em 64 países, as crianças mais pobres têm uma probabilidade sete vezes menor do que as crianças das famílias mais ricas de participarem em programas de educação pré-escolar. Em alguns países, a divisão entre ricos e pobres é ainda mais visível. Por exemplo, as crianças dos agregados familiares mais ricos da República da Macedónia do Norte têm 50 vezes mais probabilidade de frequentar a educação pré-escolar do que as crianças oriundas dos agregados familiares mais pobres.

• Impacto dos conflitos: mais de dois terços das crianças em idade pré-escolar que vivem em 33 países afetados por conflitos ou desastres naturais não frequentam programas de educação pré-escolar. Contudo, estas são as crianças para as quais a educação pré-escolar pode oferecer alguns dos maiores benefícios. A educação pré-escolar ajuda as crianças pequenas afetadas por crises a superarem os traumas que vivenciaram porque lhes dá uma estrutura, um lugar seguro para aprenderem e brincarem e um local para poderem expressar as suas emoções.
60 por cento das crianças em idade pré-escolar de todo o mundo concentram-se nos países de rendimentos baixo e médio-baixo. Mas o investimento em pessoal qualificado e professores neste nível de ensino a ronda apenas os 32 por cento.

• Ciclo de realização educacional: Em todos os países com dados disponíveis, as crianças filhas de mães que concluíram o ensino secundário ou superior, têm uma probabilidade cinco vezes maior de frequentarem um programa de educação pré-escolar, do que crianças cujas mães concluíram apenas o ensino primário ou não possuem educação formal.

Em 2017, os orçamentos domésticos destinados à educação contemplavam apenas uma média de 6,6 por cento para a educação pré-escolar, com quase 40 por cento dos países, dos quais se possuem dados, a alocarem menos de dois por cento dos seus orçamentos de Educação para este subsetor.

Na África Ocidental e Central, 2,5 por cento é destinado à educação pré-escolar, com 70 por cento das crianças excluídas da educação pré-escolar na região.

Em toda a Europa e Ásia Central, os governos dedicam a maior proporção - mais de 11 por cento dos seus orçamentos de educação são destinados à educação pré-escolar.

Esta falta de investimento por todo o mundo na educação pré-escolar afeta negativamente a qualidade dos serviços, incluindo uma falta significativa de professores com as competências adequadas ao nível do ensino pré-escolar.

Juntos, os países de rendimentos baixo e médio-baixo abarcam mais de 60 por cento das crianças em idade pré-escolar de todo o mundo. Por outro lado e de forma menos positiva o investimento em pessoal qualificado e professores neste nível de ensino a ronda apenas os 32 por cento.

De facto, apenas 422 mil professores do pré-escolar ensinam atualmente em países de baixos rendimentos. Com o crescimento populacional, assumindo-se um rácio ideal aluno-professor de 20 para 1, o mundo precisará de 9,3 milhões de novos professores no ensino pré-escolar para ir ao encontro da meta universal para o ensino pré-escolar até 2030.

"Se os governos de hoje querem que a sua força de trabalho seja competitiva na economia de amanhã, é preciso que comecem com a educação pré-escolar", afirma Henrietta Fore.

Para a Diretora Executiva da UNICEF, "se quisermos dar às nossas crianças a melhor oportunidade para que tenham sucesso numa economia globalizada, os líderes mundiais têm que estabelecer a educação pré-escolar como prioritária, dotando-a dos recursos adequados".

Razão pela qual a UNICEF apela aos governos que proporcionem pelo menos um ano de educação pré-escolar de qualidade a todas as crianças – e que esta seja uma realidade quotidiana para todas as crianças – especialmente para as mais vulneráveis e excluídas.
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