De resistente anti-nazi a chefe da Igreja Católica

Karol Józef Wojtyla, falecido no Vaticano, nasceu no seio de uma família modesta em Wadowice, 50 quilómetros a sudoeste de Cracóvia, na Polónia, a 18 de Maio de 1920.

Agência LUSA /
EPA/Arquivo

Alfaiate de profissão, o pai serviu o exército austríaco como sargento, integrando depois as fileiras do exército polaco.

Filho mais novo de três irmãos, Lolek (como era conhecido) perdeu toda a família antes de completar os 21 anos: primeiro a irmã, ainda na infância, a mãe aos oito anos, o irmão mais velho quando tinha 11 e o pai aos 20 anos.

Aos 15 anos participou na instrução dos pelotões de treino militar e três anos mais tarde, altura em que se transferiu com o pai para Cracóvia, inscreveu-se na Faculdade de Filosofia da Universidade de Cracóvia.

A II Guerra Mundial marcou-o para sempre. Nessa altura frequentava a faculdade e para escapar às perseguições dos alemães foi operário numa pedreira de Zakrzowek, em Cracóvia, e na indústria química. De dia trabalhava e à noite estudava.

Sob a ameaça constante de prisão e de deportação para os campos de concentração, despistava as autoridades mudando constantemente de residência ou escondendo-se em porões e noutros lugares recônditos, longe dos olhares da polícia.

É por esta altura que integra um grupo de jovens - quatro rapazes e seis raparigas - que se encontravam na mesma situação.

Tornam-se inseparáveis e vivem unidos na clandestinidade. Compõem poesia, que declamam junto de famílias para manter viva a fé e o anseio de liberdade, integrando posteriormente uma companhia de teatro clandestina com os mesmos objectivos a que juntaram uma colaboração activa com os combatentes da resistência polaca.

Será provavelmente desta época a experiência de um "amor infeliz" que alguns atribuem a Karol, apesar de nenhuma das suas biografias oficiais a referir.

Em 1978, logo após a eleição papal, o Corriere della Sera publicou um artigo de primeira página sob o título: "O Vaticano não se perturba com as vozes de um trágico amor do Papa Wojtyla antes do sacerdócio".

O artigo citava o livro "Um Papa vindo de longe", acabado de publicar em Itália, onde se defendia a ideia de que Karol tinha sido noivo de uma polaca de nome Edvige, que morreu num campo de concentração nazi.

Para conferir mais credibilidade à história, o diário de Milão, apresentava um dos autores do livro, o jornalista De Andreis, como casado com uma polaca e conhecedor dos meandros do Vaticano e da hierarquia polaca. E afirmava que a tese de uma possível viuvez, veiculada por agências noticiosas norte-americanas, tinha sido desmentida pelo secretário da Conferência Episcopal da Polónia, monsenhor Dobrowski que, no entanto, confirmava a existência de um "amor infeliz" na vida de Karol Wojtyla.

Em apoio desta ideia, a imprensa italiana da altura referiu o livro "Diante da Loja do Ourives" escrito em 1960 por Karol Wojtyla, quando já era arcebispo de Cracóvia, como tratando-se de uma espécie de autobiografia.

Em Fevereiro de 1940, o jovem estudante universitário conhece em Cracóvia um alfaiate de nome Jan Tyranowski, um homem de espiritualidade profunda que lhe revela S. João da Cruz e Santa Teresa de Ávila, cujas leituras acabarão por influenciar decisivamente a sua vida.

Em Outubro de 1942, começa a frequentar cursos clandestinos da Faculdade de Teologia da Universidade Jagelónica, como seminarista da Arquidiocese de Cracóvia. A par destes estudos prossegue a sua actividade teatral e, sempre na clandestinidade, em Março de 1943, estreia a peça de teatro "Samuel Zborowski", de Juliusz Slowacki.

Em Agosto de 1944, é transferido com outros seminaristas clandestinos para a cúria do Arcebispado de Cracóvia, onde continua a estudar e permanece até ao fim da guerra, quando o exército vermelho libertou Cracóvia dos nazis.

A ordenação de presbítero acontece a 01 de Novembro de 1946, pelas mãos do arcebispo metropolitano de Cracóvia, Dom Adam Sapieha, na sua capela privada.

Segue depois para Roma para prosseguir os estudos e, a 19 de Junho de 1948, no Instituto Pontifício Angelicum (dirigido por Dominicanos) defende a tese académica "Dotrina de fide apud S. Joannem de Cruce" (A Fé no Pensamento de S. João da Cruz).

No mês seguinte regressa à Polónia onde lhe são confiadas diversas tarefas pastorais.

Entre 1951-1953 prepara-se para o magistério universitário e, em Setembro de 1953, defende a tese "Avaliação das possibilidades para se construir a ética cristã, com base no sistema de Max Scheler".

Passa depois a ensinar na Faculdade de Teologia da Universidade de Jagelónica e na Universidade Católica de Lublin.

Aos 38 anos, a 04 de Julho de 1958, o Papa Pio XII nomeia-o bispo auxiliar do arcebispo de Cracóvia, recebendo a sagração episcopal a 28 de Setembro.

A 16 de Julho de 1962, após o falecimento do arcebispo Dom Basiak, é eleito vigário capitular.

Toma parte activa nas sessões do Concílio Ecuménico Vaticano II. É nesta altura que o Papa Paulo VI o nomeia arcebispo de Cracóvia, em 13 de Janeiro de 1963. Como padre conciliar, já na fase final dos trabalhos (Janeiro a Abril de 1965) participa na redacção do XIII esboço da "Gaudium Spes", sobre a Igreja no Mundo Contemporâneo.

A 18 de Novembro de 1965, subscreve a carta de reconciliação dos bispos polacos e alemães onde se inscreve o paradigma "perdoamos e pedimos perdão".

No Consistório de 26 de Junho de 1967 é criado cardeal pelo Papa Paulo VI. Dois meses depois recusa-se a participar na I Assembleia-Geral do Sínodo dos Bispos por solidariedade com o arcebispo primaz da Polónia, o cardeal Stefan Wyszynski, a quem as autoridades polacas tinham recusado o passaporte.

Participa activamente em sessões posteriores do Sínodo dos Bispos, tendo sido relator da parte doutrinal da terceira sessão (Setembro/Outubro 1974).

Em Março de 1976 pregou o retiro da Quaresma ao Papa Paulo VI e, dois anos mais tarde (Agosto 1978), esteve presente nas exéquias do pontífice.

Participou pela primeira vez num conclave e, em 26 de Agosto de 1978, testemunhou a eleição do patriarca de Veneza, Dom Albino Luciani que, como Papa, tomou o nome de João Paulo I.

Regressado às suas tarefas pastorais no arcebispado de Cracóvia, um mês depois é de novo chamado a Roma para as exéquias do Papa.

No dia 16 de Outubro de 1978, às 18:43, quando há cerca de 20 minutos saíra fumo branco da Capela Sistina, no pórtico da Basílica de S. Pedro é anunciado pelo cardeal camerlengo Pericle Felice: "Habemus papam... Reverendissimum ac Illustrissimum Dominum Carolum...

Cardinalem Wojtyla...".

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