A pequena alga vive suspensa na água e é tranportada pelas correntes. Conhecida por Karenia mikimotoi está a espalhar-se ao longo da barreira de coral, no sul da Austrália.
O aparecimento em grande escala desencadeou um surto que foi detetado em março deste ano perto do Golfo de São Vicente. Agora já abrange uma área de mais de 4.500 quilómetros quadrados de mar australiano.
Alga Karenia mikimotoi. Está associada a mortes em massa de mariscos, crustáceos, equinodermos e peixes | Foto: FWC Fish and Wildlife Research/Woods Hole Oceanographic Institution
Aumento da temperatura dos oceanos
De acordo com autoridades ambientais este aumento de Karenia mikimotoi foi agravado pela subida da temperatura dos oceanos, e está a devastar centenas de espécies de vida marinha. É um “desastre natural”, disse o primeiro-ministro do Estado da Austrália do Sul, Peter Malinauskas.
“Há mais de 400 espécies diferentes de vida marinha que foram mortas ou tiveram mortes como resultado dessa proliferação de algas”, explicou Malinauskas ao programa News Breakfast da emissora nacional ABC.
“Este é um desastre natural e deve ser reconhecido como tal”, acrescentou.
O ambiente tóxico foi causado pelo crescimento excessivo das espécies de algas Karenia mikimotoi, que afeta as brânquias de peixes e absorve o oxigénio da água à medida que se decompõe, argumentou o departamento ambiental do Estado.
Continuam a encontrar-se milhares de peixes mortos no litoral sul australiano | Great Southern Reef Foundation
Na rede social X, a organização Great Southern Reef Foundation publicou imagens comparando a área subaquática antes e depois do surto de Karenia mikimotoi.
"Há zero vida", dizem os pescadores
Muitos pescadores perderam os seus meios de subsistência, com cerca de um terço das águas do estado completamente desprovidas de peixes, de acordo com Pat Tripodi, diretor executivo da Associação de Pesca Marinha, que representa os interesses da maioria dos detentores de licenças de pesca comercial no Estado.
“Onde quer que o surto de algas atinja, há zero vida”, disse Tripodi, citado na CNN.
A infestação - que agora se estende de Coorong à Península de Yorke, uma área cerca do dobro do tamanho do Território da Capital Australiana - está a dizimar o ambiente local e a encher a costa com espécies mortas.
"É como um filme de terror para peixes", disse Brad Martin - de OzFish, uma organização sem fins lucrativos que protege os habitats de pesca, citado na BBC.
Peixes mortos no fundo do mar | Great Southern Reef Foundation
Surto não pára de alastrar
Os primeiros sinais começaram em março quando dezenas de surfistas nas praias do lado de fora do Golfo de São Vicente, cerca de uma hora ao sul da capital do Estado, Adelaide, relataram dor de garganta, tosse seca e visão turva depois de sair do mar.
Surgiu depois uma espuma amarela nas águas onde os surfistas estavam, e logo a seguir, animais marinhos começaram a dar às areias mortos.
No início de maio, o Governo da Ilha Kangaroo, um destino popular de ecoturismo, relatou as algas atingiram a litoral da ilha. Uma tempestade no final de maio empurrou a infestação para a costa, junto da lagoa de Coorong. Em julho, chegou às praias de Adelaide.
Nos últimos dias moradora local, Johanna Williams, que tem feito monitorização diária de Glenelg Beach desde o final de julho, registou mais de mil observações de criaturas marinhas mortas no troço de 500 metros na Glenelg Beach.
Os relatos de Johanna juntaram-se a centenas de outros australianos do sul que coletivamente reportaram mais de 20 mil animais mortos indicando que a proliferação de algas tóxicas continua a impactar a vida subaquática.
Peixe de colete de couro de barbatana azul é um dos muitos peixes encontrado morto na praia em Glenelg por Johanna | Foto: johanna13501
"Este não é apenas um problema do sul da Austrália" alertam os cientistas
O Conselho de Biodiversidade da Austrália, para além de rotular a situação de catastrófica alerta que esta mortandade - que afeta 500 km do litoral da Austrália - é consequência das ondas de calor marinhas que chegam ao país e deixa claro que "irá repetir-se".
A organização Great Southern Reef Foundtion (que tem a missão de capacitar a sociedade para proteger o recife e a ecologia local) afirma que houve "uma tempestade perfeita onde "extremos climáticos e elevadas quantidades de nutrientes coincidiram (no tempo e espaço)" alimentando a proliferação desta alga.
"A descarga de água doce costeira poluída por nutrientes após inundações, temperaturas de ar e água anormalmente quentes e ondas de calor permitiram ao oceano as melhores condições para o crescimento da alga tóxica" explica a organização.
Para contrariar estas condições favoráveis à Karenia, diversos cientistas do Conselho de Biodiversidade divulgaram uma lista de várias ações necessárias para responder à proliferação da alga e à onda de calor marinha.
Entre os tópicos aponta-se a necessidade de "reduzir a poluição por nutrientes e de carbono dissolvido" disse Gretta Pecl, do Instituto de Estudos Marinhos e Antárticos da Universidade da Tasmânia.
Os investigadores defendem que deve haver um "investimento imediato de um mínimo de 8,56 milhões de euros para iniciar a investigação para se entender o impacto deste aumento da alga e elaborar planos para reagir perante nova invasão no futuro. Observam também a necessidade de "acelerar os esforços de descarbonização da Austrália de forma a que o país se torne líder global em ação climática".
Entretanto Malinauskas, de acordo com a Reuters, anunciou um pacote de apoio de 7.7 milhões de euros para combater o surto, combinando com uma ajuda do Governo Federal resultando num total de quase 24 milhões de euros, destinados a limpeza, investigação e apoio a quem depende dos recursos costeiros.
Porém, os cientistas relembram, uma vez mais, que "este problema não é apenas do sul da Austrália". “O que vemos nas praias é apenas uma pequena fração dos animais mortos, com a maioria dos corpos a apodrecerem no fundo do mar", insistem.
“Por causa do contacto entre os oceanos e das suas teias alimentares, o impacto deste crescimento prejudicial da Karenia excederá macivamente os limites da própria proliferação física; também haverá consequências em cascata noutras regiões da Austrália e do globo", alertou Ped.