Etiópia anuncia retirada de tropas da Eritreia na região de Tigray

O Governo da Etiópia anunciou, esta sexta-feira, que o exército da Eritreia concordou em retirar-se da província de Tygray, onde testemunhas descreveram pilhagens, homicídios e violações de civis. Após quase cinco meses desde o início do conflito na região, o primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, garantiu que as forças nacionais vão agora assumir a segurança em Tygray e nas zonas fronteiriças.

Inês Moreira Santos - RTP /
Tiksa Negeri - Reuters

Depois de se deslocar a Asmara para se reunir com o Presidente da Eritreia, Abiy Ahmed anunciou a retirada das tropas eritreias da região de Tigray (norte da Etiópia), onde Addis Abeba lançou uma operação militar em novembro para desalojar grupos dissidentes.

"Nas minhas discussões a 26 de março com o presidente [da Eritreia] Issaias Afeworki, por ocasião da minha visita a Asmara, o governo da Eritreia concordou em retirar as suas forças das fronteiras da Etiópia", informou em comunicado o primeiro-ministro etíope, publicado depois no Twitter.



A Eritreia não confirmou, até agora, a retirada das tropas nem foi avançada qualquer previsão da data para a saída dos militares eritreus.

Este anúncio surge na sequência do reconhecimento de Abiy Ahmed, pela primeira vez, no parlamento etíope, que as tropas da Eritreia estavam presentes em solo tigray. Em seguida, esta quinta-feira, o primeiro-ministro etíope visitou Asmara, capital eritreia.

Durante os últimos meses, as autoridades dos dois países negaram a presença de forças eritreias em Tigray, embora o facto tenha sido amplamente confirmado pela população daquele estado etíope e também por trabalhadores humanitários, diplomatas e mesmo alguns funcionários civis e militares etíopes.
As tropas eritreias, mas também o exército etíope, foram acusadas de pilhagem, massacres e violações em todo o estado do Tigray.

Já esta semana, o primeiro-ministro etíope tinha prometido punir os soldados que violaram mulheres e protagonizaram outro tipo de violações de Direitos Humanos, sem dar mais detalhes, embora tenha classificado as denúncias de "exagero da propaganda" da Frente de Libertação do Povo Tigray (TPLF).

Na declaração publicada esta sexta-feira, o primeiro-ministro etíope indicou ainda que as forças etíopes vão assumir a guarda das zonas fronteiriças "com efeito imediato". Esta decisão ocorre no momento em que as autoridades dos dois países enfrentam uma pressão crescente para pôr fim ao conflito.

Abiy Ahmed acrescentou que o lançamento de morteiros pelas forças estaduais comandadas pela TPLF sobre a capital eritreia tinha levado "o Governo da Eritreia a atravessar a fronteira com a Etiópia para evitar novos ataques e salvaguardar a segurança nacional".

No mesmo documento não é referido o número de soldados da Eritreia estacionados na Etiópia, embora testemunhas apontem para os milhares.

Recorde-se que Abiy Ahmed, Prémio Nobel em 2019, lançou uma intervenção militar a 4 de novembro para derrubar a TPLF, partido no poder, e declarou a vitória a 28 de novembro, ainda que os combates continuem.

A operação foi apoiada pelas forças regionais de Amhara, região a sul de Tigray, para segurar grandes áreas depois da retirada da TPLF. Estima-se também que esta tenha sido apoiada por tropas da vizinha Eritreia, inimigo tradicional da TPLF.

Desconhece-se o número de pessoas, especialmente civis, mortas nos combates de Tigray. A região, próxima da fronteira com o Sudão e a Eritreia, e com cerca de seis milhões de habitantes, mantém-se isolada do mundo e, apesar de alguns progressos na prestação de ajuda, os ativistas e trabalhadores humanitários advertiram que os alimentos e outros apoios são insuficientes.
Oposição exige regulador internacional para garantir acordo
A Etiópia e a Eritreia entraram em conflito entre 1998 e 2000 durante uma sangrenta guerra de fronteiras, num período em que TPLF dominava o poder federal na Etiópia. Os dois países aproximaram-se com a chegada ao poder Abiy Ahmed em 2018, mas a Eritreia e a TPLF mantiveram-se de costas voltadas.

Numa reação ao anúncio de Abiy Ahmed, uma formação da oposição em Tigray, Salsay Weyane Tigray, fez saber que qualquer acordo sobre a retirada da Eritreia é "inútil" sem a presença de "um organismo regulador internacional".

"Este é outro nível de engano, um jogo que eles jogam há muito tempo", afirmou Hailu Kebede, um responsável do partido, através do Twitter.



"Retirar todas as forças e criar uma equipa internacional de observação. O mundo não deve ser enganado de novo", escreveu.

O conflito já deslocou quase um milhão de pessoas. As autoridades locais estimam que cerca de 950.000 pessoas fugiram dos combates e perseguições, principalmente do Tigray ocidental, mas também das regiões noroeste e central da região.

O Tigray é palco de combates desde 4 de novembro de 2020, data em que o primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, enviou o exército etíope para desalojar a TPLF, partido eleito, que então governava o estado etíope no norte da Etiópia e que vinha há vários meses a desafiar a autoridade de Adis Abeba através de várias tomadas de posição, incluindo a realização de eleições no estado, quando os escrutínios foram adiados no resto do país por causa da pandemia.
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