Governo abrangente de Emmanuel Macron não convence partidos tradicionais

por Christopher Marques - RTP
Gonzalo Fuentes - Reuters

A abertura de Emmanuel Macron traduz-se num Governo paritário, com três personalidades do aliado MoDem, dois d’ Os Republicanos e quatro políticos do Partido Socialista. Apesar disso, a solução Macron não merece a aprovação dos partidos tradicionais. O PS não vê a prometida renovação no novo Executivo e nota que as pastas económicas foram entregues à direita. Por sua vez, Os Republicanos decidiram expulsar todos os que aceitaram integrar o primeiro Governo de Edouard Philippe. Afinal, a França vive em plena campanha eleitoral.

Ao quarto dia de Macron Presidente, eis o primeiro Executivo sob a sua égide. Depois de ter sido revelado na segunda-feira o nome de Edouard Philippe como primeiro-ministro, o Eliseu anunciou esta quarta-feira os nomes dos novos ministros franceses.

O primeiro Governo de Edouard Philippe segue o espírito de abertura que Emmanuel Macron defendeu ao longo dos últimos meses, afirmando-se não ser de direita nem de esquerda. Os cálculos do jornal Le Monde indicam que a média de idades é de 54,6 anos. Foram nomeados três personalidades do partido MoDem – que foi aliado de Macron nas eleições.

O Presidente nomeou ainda dois políticos d’Os Republicanos, o partido de centro-direita onde já tinha ido buscar o primeiro-ministro. Há ainda quatro personalidades vindas do Partido Socialista e duas do Partido Radical de Esquerda, um pequeno movimento de centro-esquerda. O Governo francês inclui 11 homens e 11 mulheres, aos quais se adiciona o primeiro-ministro.
Ecologia em terceiro lugar
O ex-socialista Gérard Collomb, que tem sido desde o princípio um aliado de Emmanuel Macron, será o número dois do Executivo e assume a pasta do Interior. Collomb é o presidente da Câmara de Lyon e assume agora um dos principais ministérios franceses.

Em terceiro lugar na hierarquia de Governo fica Nicolas Hulot, com a pasta das Transições Ecológicas e Solidárias. Macron coloca assim a ecologia no topo das prioridades, depois das dúvidas que tinha gerado com a nomeação de um primeiro-ministro que trabalhou na indústria nuclear.


Nicolas Hulot é um conhecido ecologista francês, tendo sido apresentador de vários programas que contribuíram para alertar os franceses para a necessidade de proteger o ambiente. Tentou por duas vezes ser candidato às Presidenciais –em 2007 e 2012 - mas nunca chegou a sê-lo.

Vários Presidentes tentaram que aceitasse um posto de ministro mas sempre sem sucesso. Colaborou com François Hollande, tendo sido o enviado especial do Presidente francês para a Proteção do Ambiente, mas não quis integrar o governo. Agora, respondeu positivamente ao apelo de Macron.
Paridade mas...
O quarto lugar na hierarquia é entregue a François Bayrou, o líder do MoDem – partido do centro francês - que abdicou da candidatura presidencial a favor de Emmanuel Macron. Bayrou passa a ser ministro de Estado com a pasta da Justiça.

Apesar do número de ministros respeitar a paridade, só em quinto lugar aparece a primeira mulher. Sylvie Goulard ocupa o lugar de ministra das Forças Armadas. Goulard chega diretamente das fileiras do MoDem, tendo vasta experiência em questões europeias e defendendo uma refundação do eixo franco-alemão. Segundo Le Figaro, foi Goulard a responsável pelo encontro entre Merkel e Macron em plena campanha eleitoral.

Há duas figuras que transitam do Governo de François Hollande, sendo Jean-Yves Le Drian o mais conhecido. O até agora ministro da Defesa será responsável pela Europa e pelos Assuntos Estrangeiros, assumindo assim a chefia da diplomacia francesa. Le Drian é uma das quatro figuras que Macron vai buscar às fileiras do Partido Socialista francês.

No conjunto dos 22 governantes agora nomeados, apenas dois são oriundos das fileiras d’Os Republicanos. Apesar de não merecerem lugar de destaque na hierarquia governativa, são eles que ficarão a gerir os dinheiros do Estado francês. O ex-candidato às Primárias do Centro e da Direita Bruno Le Maire será agora ministro da Economia.

Com apenas 35 anos, Gérald Darmanin será o ministro da Ação e das Contas Públicas, sendo responsável pelo Orçamento, a Segurança Social e a Reforma do Estado. Macron vai assim buscar um dos mais jovens dirigentes d’Os Republicanos, considerado uma das esperanças para a renovação de um dos partidos derrotados nas Presidenciais.

Entre os 22 governantes agora nomeados destaca-se também Laura Flessel. A antiga campeã olímpica de esgrima vai liderar o Ministério dos Desportos.
Promessas violadas
A imprensa francesa nota desde já que Emmanuel Macron viola três promessas com a nomeação deste governo. Apesar de respeitar a paridade, Le Monde assinala que a distribuição de pastas é desigual. Além disso, se contarmos o primeiro-ministro, há mais homens do que mulheres.

Ao contrário do prometido, o Presidente recorreu a duas personalidades que foram ministros durante o mandato de François Hollande. Caiu também por terra a promessa de criar um ministério exclusivamente dedicado aos direitos das mulheres. O novo Governo tem no entanto uma secretaria de Estado para a Igualdade entre Mulheres e Homens, que será liderada por Marlène Schiappa.

O Governo de Emmanuel Macron vai ao encontro do que seriam as expetativas, reunindo personalidades de diferentes quadrantes políticos. Ao contrário do que se poderia esperar, há no entanto apenas dois governantes do centro-direita francês, para além do primeiro-ministro.

Os Republicanos anunciaram já que os políticos que aceitaram integrar o governo de Macron serão expulsos do partido. “Fizeram a escolha pessoal de fazer campanha com o primeiro-ministro a favor dos candidatos do Em Marcha! contra os nossos candidatos da aliança Os Republicanos – UDI”, explicou por comunicado o secretário-geral do partido, Bernard Accoyer.
"Governo provisório e confuso"
Os Republicanos não veem o ingresso de representantes do partido no Governo de Macron como uma tentativa de abertura. Já antes de ter sido conhecido o novo Executivo, o partido acusava o Eliseu de procurar destruir o tradicional movimento político de centro-direita. A acusação mantém-se agora.

“O objetivo deste governo provisório e confuso é de baralhar os franceses na campanha das eleições legislativas”, critica Accoyer. Acusa ainda Emmanuel Macron de tentar “vedar o debate democrático a uma alternativa inaceitável” entre o movimento Em Marcha! e os partidos extremistas.

Por sua vez, o deputado conservador Eric Woerth aponta que “a operação de destruição da direita” fracassou, uma vez que apenas dois dos ministros são oriundos d’Os Republicanos. “Edouard Philippe é um primeiro-ministro de direita que lídera um governo de esquerda”, reagiu na rede social Twitter.



A esquerda nota precisamente o contrário. O secretário-geral do PS vê um “novo governo” sem “renovação”. Apesar de serem entregues pastas à esquerda, Jean-Christophe Cambadélis nota que a chefia do Governo e as Finanças foram entregues à direita.

“Edouard Philippe tem a certeza que poderá conduzir uma política económica “de direita e ao mesmo tempo… de direita”, reage o PS em comunicado, numa referência à filosofia do “nem de direita nem de esquerda” seguida por Emmanuel Macron.

Jean-Luc Mélenchon não tem dúvidas sobre a orientação que será seguida pelo Governo. “É um governo de direita. Ponto final”, afirmou aos jornalistas.

Por sua vez, a extrema-direita nota que Macron recorreu às “velhas glórias da vida política, oriundas das velhas direita e esquerda”. A Frente Nacional vê a continuação do sistema tradicional político francês, com uma mistura entre socialistas e republicanos.

O aliado da FN Nicolas Dupont-Aignan centra as críticas na postura “extremista-europeísta” dos novos governantes. “Têm como projeto fundir a Nação francesa num conjunto supranacional, desprezando as democracias”.
Governar até às legislativas
O novo Governo francês é apontado como provisório, um vez que os franceses regressam às urnas em junho para eleger a composição do novo Parlamento. As decisões de Emmanuel Macron, bem como as respostas dos partidos, são por isso lidas à luz de um país que se encontra ainda em campanha eleitoral.

Fruto da nova composição política francesa e da derrota dos partidos tradicionais nas Presidenciais, as eleições legislativas ganham nova importância. A ação de Macron ficará dependente da maioria que o movimento La République en Marche conseguirá nas legislativas ou das alianças que terão posteriormente de ser feitas.

Respeitando a tradição francesa, o Governo apresenta a sua demissão no dia seguinte à segunda volta das eleições legislativas. O Presidente nomeia depois um novo primeiro-ministro e posteriormente um novo Governo - que poderá ser o mesmo que o anterior. Este novo Executivo tem já em conta a nova composição do Parlamento.
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