Haddad em Lisboa. "Não se admite no Brasil de hoje o confronto de ideias"

por Carlos Santos Neves - RTP
“Nada veio de graça no campo da democracia”, afirmou o ex-candidato à Presidência do Brasil pelo PT, durante uma palestra em Lisboa Paulo Whitaker - Reuters

No Brasil de Jair Bolsonaro o “confronto de ideias” é uma impossibilidade e a crítica é vista “como uma torcida” contra o país, sustentou na última noite, em Lisboa, Fernando Haddad. O ex-candidato presidencial pelo Partido dos Trabalhadores, que participou numa palestra na Casa do Alentejo, descreveu ainda o impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em 2016, como o ponto de “mudança de regime”.

“Não se admite no Brasil de hoje o confronto de ideias e, se você critica, você está torcendo contra o Brasil”, arguiu Haddad.Em Lisboa, observa o jornal Folha de São Paulo, Haddad comentou notícias da imprensa brasileira sobre alegadas ligações da família de Bolsonaro a milícias, afirmando que estas são antigas.


“É assim que é vista a crítica: como uma torcida contra o país e não como a correção de um Governo que em 20 dias provocou pequenos desastres”, reforçou o candidato batido por Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais de outubro, para quem o afastamento de Dilma Rousseff do Planalto, em 2016, cunhou uma “mudança de regime”.

“Eu falo de uma mudança de regime porque efetivamente, para aqueles comprometidos com as jornadas democráticas de obtenção de direitos, e que têm mais ao menos a lembrança de como isso tudo começou, as revoluções em 2018 e 2019 trouxeram a lembrança de que isso exigia muita luta: dos trabalhadores, das mulheres, dos negros. Nada veio de graça no campo da democracia”, afirmou, ao intervir na palestra intitulada Democracia e perda de direitos no Brasil, promovida sob a bandeira do PT.

“Quando você perde para a direita, para o centro-direita, tem uma parte disso que é preservada, ninguém discute. Mas quando você perde para a extrema-direita, sobretudo dessa natureza, que assumiu o Governo do Brasil, tudo está em discussão”, acentuou, com baterias apontadas em permanência ao agora Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro.

Na sua intervenção, reportada pela agência Lusa, Fernando Haddad propugnou também que “o que aconteceu” no Brasil não foi “uma simples alternância de poder”.

“Nós não estaríamos tão apreensivos se uma pessoa razoável tivesse ganho a eleição. Não é porque o PT perdeu, é em função de quem ganhou que há essa apreensão”, vincou.



Haddad repudiaria ainda a decisão de transferir a embaixada do Brasil em Israel de Telavive para Jerusalém, um “ato impensável” com consequências concretas, na sua perspetiva.

“Hoje a Árabia Saudita anunciou o descredenciamento de quase todos os frigoríficos brasileiros, em função de um ato impensável”, exemplificou.
Ao lado de Tarso

Fernando Haddad, antigo prefeito de São Paulo, que foi também ministro da Educação nos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff, entregou-se nos últimos dias a um périplo pela Península Ibérica - ao lado de Tarso Genro, também ex-ministro da Educação e antigo prefeito de Porto Alegre e governador do Estado do Rio Grande do Sul.Fernando Haddad e Tarso Genro reuniram-se com socialistas, comunistas e bloquistas.

Em Espanha, os dois políticos brasileiros do PT mantiveram encontros com os antigos primeiros-ministros socialistas Felipe González e Jose Luis Rodríguez Zapatero, além de nomes do partido Podemos. Isto depois de terem passado, no início de dezembro, pelos Estados Unidos.

Na Casa do Alentejo, Tarso Genro falou de Portugal e Espanha como “dois países que são fundamentais para o futuro da América Latina”. E falou da abertura do PT para “beber” da “fonte” das forças partidárias de esquerda e centro-esquerda em Portugal.

Tarso advogou mesmo a formação de “uma rede de resistência, de informação, de combate ideológico e de princípios” contra “o fascismo, a reação política e a degradação completa dos direitos sociais e fundamentais”.

c/ Lusa
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