Hunter Biden. A pedra no sapato do presidente que ameaça fazer tropeçar o Partido Democrata

por Graça Andrade Ramos - RTP
Joe Biden com o filho, Hunter Biden DR

O segundo filho do atual presidente norte-americano está de regresso como a maior dor de cabeça do Partido Democrata. Os republicanos querem pô-lo a responder perante o Congresso e a imprensa conservadora e tablóide multiplica programas e artigos a recordar a colorida carreira de Hunter.

Têm muito por onde se espraiar. A vida de Hunter Biden tem todos os ingredientes para resultar em pelo menos um filme, desde um protagonista toxicodependente, alcoólico e viciado em pornografia – incluindo pessoal - até alta intriga política do género de fazer tremer Washington. Nos últimos 30 anos, o filho de Joe Biden foi reservista da Marinha, de onde foi exonerado após um teste positivo a cocaína, advogado, investidor na alta-finança, lobbyista, banqueiro, administrador e vice-presidente de empresas, públicas e privadas.

Dentro de 10 meses os norte-americanos irão escolher mais uma vez os seus representantes e um novo Congresso, com os democratas a correrem sérios riscos de perderem o controlo de ambas as câmaras.

Com a popularidade de Joe Biden a rondar uns meros 41 por cento, do ponto de vista democrata escândalos como os trazidos por Hunter estariam melhor debaixo do tapete.

Os sinais multiplicam-se de que tal cenário será pouco provável. A par dos fracos resultados económicos e do fracasso do combate à pandemia, Hunter Biden é uma excelente arma para os republicanos contestarem a presidência.
Ligações diretas ao PCC
A Fox produziu para o início de 2022 uma série de quatro episódios sob o título genérico Quem é Hunter Biden, um dos quais lembra o caso de um laptop que o próprio mandou reparar sob o efeito de drogas e cujo conteúdo acabou por vir a público. Continha filmes das proezas sexuais do filho de Joe Biden, além de emails comprometedores. O mesmo episódio afirma que Hunter preparava e fumava crack durante o último ano da vice-presidência do pai.

A imoralidade de Hunter pode ser escandalosa e uma dor para a família mas o mais preocupante são as suas atividades financeiras, sobretudo com a China ao longo de 2017.

Recentemente, a Fox Business publicou uma nova série de comunicações eletrónicas que indicam laços próximos entre uma sociedade de capitais de investimento de Hunter Biden, a Rosemont Seneca Advisors, e uma empresa chinesa com ligações a altos funcionários do Partido Comunista Chinês, a Harves Century Group of Shenyang, a instâncias de um dos principais conselheiros de Joe Biden, Francis Person.

Mais do que Hunter Biden, que chegou a deter cinco por cento de uma das empresas do grupo Herves, as comunicações poderão ser comprometedoras para Person, tido “como um filho” pelos Biden e cujas relações próximas com a discreta família de empresários chineses poderão colocar em causa interesses do presidente.

Francis reconhece laços com Bo Zhang, o filho da matriarca dona da Harves e cujo sogro seria o “governador da província de Hainan”, conforme o convite endereçado por Person a Hunter, ao convidá-lo para conhecer o clã chinês em 2017.

Os contactos com Hunter não deram aparentemente muitos frutos, num ano a todos os títulos louco em termos pessoais para o filho de Joe Biden. A Fox Business nota contudo que o governador a que se refere Person deverá ser Liu Cigui, um “leal ao presidente chinês Xi” Jinping.

Liu seria membro do Comité Central do Partido Comunista Chinês desde 2012 e até 2017 integrava a todo-poderosa Comissão Central de Inquérito Disciplinar do partido, a principal arma de Xi JinPing para consolidar o seu poder. A ligação de Liu Cigui através do genro a pessoas próximas e familiares de Joe Biden só pode preocupar Washington.
NYT processa Departamento de Estado
Também as ligações aparentes de Hunter Biden a um dos 10 maiores conglomerados chineses em 2017, a CEFC Chinese Energy, entretanto falida, fazem erguer sobrancelhas. Em correspondência com o presidente do Conselho de Administração da CEFC, Ye Jianming, e publicada pela Fox em dezembro de 2020, Hunter Biden cumprimenta-o “em nome de toda a família Biden” e solicita-lhe o envio “urgente” de 10 milhões de dólares para “financiar e operar apropriadamente” um empreendimento conjunto entre os Biden e o conglomerado chinês, a futura SinoHawk Holdings.

Em várias missivas, Hunter Biden refere que Tony Bobulinski será o CEO da nova SinoHawk Holdings enquanto “investidor de capital em todo o mundo para algumas das famílias mais ricas do planeta”.

Também o irmão de Joe Biden, Jim Biden, estava envolvido na nova empresa.

Como todas as grandes firmas chinesas, a CEFC, apesar de privada, tinha laços estreitos com altos membros do PCC. Contudo, as ligações com os Biden parecem bem mais secretas.

Já em setembro de 2020 um relatório das Comissões do Senado para a Segurança Interna e para as Finanças tinha concluído que "Hunter Biden e a sua família estavam envolvidos numa vasta rede financeira com ligações a pessoas estrangeiras e governos estrangeiros do mundo inteiro".

Na altura, a denúncia visava a Burisma. "Hunter Biden e Devon Archer, em particular, formaram relações financeiras significativas e consistentes com a oligarca corrupta Mykola Zlochevsky durante o tempo em que trabalharam para a Burisma e as duas empresas lucraram milhões de dólares com essa associação enquanto Joe Biden era vice-presidente e a face da Administração Obama quanto à política ucraniana".

O mesmo relatório acusava os democratas de tentarem difamar a investigação como uma campanha russa de desinformação.

Em 31 de janeiro de 2022, o jornal New York Times processou o Departamento de Estado pela demora no acesso a correio eletrónico de responsáveis da embaixada dos EUA na Roménia entre 2015 e 2019, que mencionam os nomes de Hunter Biden e do antigo sócio, Tony Bobulinski, um tenente da Marinha na reserva.

Os primeiros pedidos pelos email foram encaminhados em junho de 2021, ao abrigo da Lei da Liberdade de Informação. Em dezembro passado, o jornal questionou o Departamento de Estado sobre a data estimada para receber os dados e recebeu, em resposta, 15 de abril de 2023. Seguiu-se o processo. O NYT afirma querer avaliar por si próprio se o conteúdo dos email é significativo, atitude indicativa de que não vai largar o caso.
Partido Republicano quer ouvir Hunter Biden
Não é só o Departamento de Estado que é suspeito de tentar fazer esquecer os sucessos e insucessos de Hunter Biden; também a imprensa simpatizante do Partido Democrata tem manifestado mais interesse em apontar inconsistências nas acusações do que em seguir a história. Muito, incluindo a credibilidade da imprensa, depende do que se conseguir provar. Em 2019, um inquérito republicano ao caso da ucraniana Burisma, instigado pelo então presidente Donald Trump, não foi capaz de mostrar conluio do ex-vice-presidente de Obama para favorecer Hunter. Mas esse está longe de ser o único caso sob análise.

O filho do presidente tem agora 52 anos, feitos no passado dia 4, e, além de pintar, escreveu um livro de memórias intitulado Beautiful Things e tornou-se consultor de fundos de risco e de investidores fazendo valer os seus altos contactos em Washington. Alguns dos seus quadros foram vendidos por 500.000 dólares.

O Partido Republicano exprimiu em janeiro de 2022 muitas dúvidas sobre a verdadeira origem da fortuna de Hunter Biden, avaliada em cerca de um milhão de dólares em 2021 e geralmente atribuída aos seus anos como advogado. E quer interrogá-lo sobre cada uma delas, começando pelas mais recentes denúncias.

Uma delas refere-se ao envolvimento em 2016 de uma firma de investimento co-fundada por Hunter Biden que ajudou um conglomerado chinês a assumir o controlo de uma grande mina de cobalto congolesa até então administrada por uma firma norte-americana.

Não está claro se Hunter se envovleu diretamente no negócio, ocorrido quando o pai era ainda vice-presidente de Barack Obama, ou se e quanto terá ganho com o negócio.

Temos muitas perguntas sobre de onde lhe vem o dinheiro, das suas obras de arte e dos seus negócios como consultor”, afirmou o representante do Kentucky, o republicano James Comer, à CNN. Numa carta aos Arquivos Nacionais a solicitar documentos sobre minhas de cobalto sob a presidência Obama, Comer afirma que o negócio foi "potencialmente uma ameaça de segurança nacional" e "uma perda orquestrada em não pequena parte pelo filho do presidente".

Terá o filho do presidente sido comprado por um Governo estrangeiro e até que ponto tal cenário pode afetar a atual Administração e a segurança dos Estados Unidos da América, são perguntas subentendidas.
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