Indonésia atribui a antigo ditador Suharto título de herói nacional
O Governo da Indonésia declarou hoje como herói nacional o antigo presidente Suharto, que liderou a ditadura da Nova Ordem entre 1967 e 1998, uma decisão criticada por ativistas dos direitos humanos.
O general Suharto, que morreu em 2008, chegou ao poder após o golpe militar em 1965 que derrubou o primeiro presidente da Indonésia, Sukarno.
Suharto foi acusado de ser responsável pela morte de centenas de milhares de opositores políticos e da repressão sangrenta de independentistas em Timor-Leste, Aceh e Papua.
O atual Presidente, Prabowo Subianto, que foi casado com uma das filhas do antigo ditador, concedeu o estatuto de herói nacional a Suharto e a mais nove personalidades, incluindo o também ex-presidente Abdurrahman Wahid.
O ministro da Cultura, Fadli Zon, afirmou que Suharto desempenhou um papel fundamental durante a luta pela independência contra os governantes coloniais holandeses, segundo a agência de notícias norte-americana Associated Press (AP).
Zon também creditou Suharto por aliviar a pobreza e controlar a inflação, bem como por derrotar uma revolta comunista.
O ministro rejeitou as alegações de corrupção e graves abusos dos direitos humanos, referindo que não foram provadas.
Grupos de direitos humanos consideraram a distinção como uma tentativa de branqueamento de abusos dos direitos humanos e corrupção que ocorreram durante os 32 anos em que Suharto esteve no poder.
Durante o regime de Suharto, um aliado dos Estados Unidos durante a Guerra Fria, até um milhão de oponentes políticos foram mortos, segundo a AP.
Manteve o poder com uma abordagem autoritária que levou à colocação de soldados em todas as aldeias, até ser deposto por uma revolta popular no auge da crise financeira asiática de 1997-1998.
Apesar das acusações, o mau estado de saúde --- e, segundo os críticos, a corrupção persistente --- impediu que fosse julgado até morrer, em 2008.
A maior parte dos homicídios ocorreu em 1965-1966, quando entre 300.000 e 800.000 alegados comunistas foram detidos e mortos durante a ascensão ao poder.
Nas três décadas seguintes, mais 300.000 pessoas foram mortas, desapareceram ou morreram de fome em Timor-Leste, Aceh e Papua, que lutavam pela independência, segundo grupos de direitos humanos e as Nações Unidas.
Sob a tutela de Suharto, o atual Presidente subiu na hierarquia de uma unidade das forças especiais indonésias acusada de extensos abusos dos direitos humanos.
Prabowo não fez qualquer declaração após a cerimónia, realizada no palácio presidencial, em Jacarta, e transmitida em direto pela televisão.
A sindicalista Marsinah, assassinada aos 24 anos durante a ditadura de Suharto, também foi distinguida no dia do herói nacional.
Menos de uma centena de pessoas participaram num protesto em Jacarta contra a atribuição do título a Suharto convocado por organizações não-governamentais (ONG) e ativistas, segundo a agência de notícias espanhola EFE.
"Merece o título de herói [alguém] conhecido por [liderar] um regime autoritário e fascista que atacou e oprimiu as pessoas?", disse um dos manifestantes, Ardi, um estudante de Direito de 22 anos.
Cerca de 500 ativistas indonésios já tinham rejeitado há uma semana a proposta de que Suharto recebesse o título honorífico, quando o Governo confirmou que era um dos candidatos.
"Conceder o título de herói nacional a Suharto representa uma traição às vítimas e aos valores democráticos", denunciaram numa carta dirigida a Prabowo.
"Esta honra só é apropriada para aqueles que lutaram pela liberdade (...), não para líderes marcados pelo autoritarismo e pela violação dos direitos humanos", acrescentaram.