Instituto africano alerta para risco de crise pós-eleitoral
O Instituto de Estudos de Segurança (ISS), um observador africano das dinâmicas políticas e sociais em vários países do continente, alerta para o risco de uma crise pós-eleitoral na Guiné-Bissau.
Num artigo publicado recentemente, o ISS analisa o panorama guineense que antecede as eleições gerais de domingo, 23 de novembro, e conclui que existem vários fatores que "aumentam o risco de problemas pós-eleitorais que podem mergulhar o país novamente numa crise".
O Instituto aponta, em concreto, a exclusão do histórico partido da libertação, o PAIGC, pela primeira vez, de umas eleições, a gestão do processo eleitoral, também pela primeira vez, a nível interno, sem financiamento ou apoio internacional, e as alegadas "tensões políticas e divisões internas" nas Forças Armadas guineenses.
Fundado em 1991, o Instituto de Estudos de Segurança (ISS) dedica-se à segurança humana de África através de pesquisa, análise de políticas, assistência técnica e formação.
Na observação que faz do processo eleitoral na Guiné-Bissau, conclui que "a exclusão da principal oposição e a rivalidade entre fações militares podem desestabilizar as eleições de 23 de novembro", em que os guineenses são chamados às urnas para eleger novo Presidente da República e os deputados da Assembleia Nacional Popular.
Segundo relata, "as tensões estão a aumentar na Guiné-Bissau à medida que se aproximam as eleições", que, considera, "acontecem em circunstâncias incomuns".
O ISS descreve que "o parlamento não se reúne desde dezembro de 2023, quando foi dissolvido pelo Presidente (Umaro Sissoco Emabló) após o confronto da Guarda Nacional com a Guarda Presidencial", numa alegada tentativa de golpe e Estado.
A dissolução afastou do poder a maioria da coligação PAI-Terra Ranka, liderada pela Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e presidida por Domingos Simões Pereira, principal adversário de Embaló nas últimas presidenciais, em 2019.
Domingos perdeu as anteriores presidenciais para Embaló, "que assumiu a presidência em fevereiro de 2020, no meio de uma crise pós-eleitoral e sem esperar a confirmação da vitória" pelo Supremo Tribunal de Justiça, o que só viria a acontecer em setembro de 2020.
Este é apontado pelo ISS como "o segundo momento polémico" no processo eleitoral que tem 12 candidatos às Presidenciais e 14 às Legislativas, com as atenções focadas na eleição do novo Presidente da República.
As eleições de domingo, observa o Instituto, "deviam ajudar o país a restaurar a legitimidade institucional, mas os atores políticos estão cautelosos".
"Além das tensões políticas, há fissuras nas Forças Armadas e um ceticismo público generalizado em relação às instituições do Estado. Essa situação mina a estabilidade política e a credibilidade do processo, aumentando o temor de uma possível crise pós-eleitoral", conclui.
O ISS acrescenta que a aliança do excluído PAIGC com o candidato independente Fernando Dias "desafia a certeza do regime de vitória, tornando provável uma segunda volta eleitoral".
A organização descreve uma "agitação política" no processo eleitoral guineense "desencadeada pela decisão do Supremo Tribunal de Justiça de anular a participação do PAIGC nas eleições devido à entrega tardia" da candidatura, que tinha como protagonista novamente às presidenciais Domingos Simões Pereira.
O PAIGC e o líder decidiram apoiar Fernando Dias, que concorre como independente, já que o seu partido, o PRS (Partido de Renovação Social) dividiu-se em duas fações: uma apoiando a candidatura de Embaló e a outra liderada por Dias, recorda o ISS.
Segundo o ISS, esta reconfiguração política "parece favorecer Embaló, apoiado pela coligação de 16 partidos Plataforma Republicana "Nô kumpu Guiné", que busca um segundo mandato para Embaló e uma confortável maioria na Assembleia Nacional" Popular.
O Instituto ressalva que, "embora a ausência do PAIGC pudesse ter favorecido a vitória de Embaló, o apoio do partido a Dias dá à corrida presidencial uma nova trajetória".
"A inesperada aliança PAIGC--Dias desafia a certeza do regime de uma vitória rápida, tornando provável uma segunda rodada eleitoral", refere.
Perante a atual situação, há dois cenários possíveis para o ISS, o de uma vitória de Dias, que levaria à coabitação com um Governo da coligação de Embaló, que dominaria o parlamento e logo elegeria o primeiro-ministro.
O Instituto acrescenta que, se Fernando Dias for eleito Presidente, há também "o risco de que o parlamento possa ser novamente dissolvido, mergulhando o país em outra crise institucional".
Se Sissoco Embaló for eleito para um segundo mandato, prossegue a análise, uma maioria no parlamento da coligação que o apoia, permitirá rever a Constituição para aumentar o poder do Presidente da República.
O ISS recorda que, "em 2023, quando o seu partido (o MADEM G15) não conseguiu a maioria no parlamento, o Presidente não hesitou em dissolver a Assembleia Nacional [Popular], violando a Constituição", por ainda não ter decorrido o prazo de 12 meses desde as eleições.
Além das apostas políticas, para o Instituto estas "eleições são peculiares" também por outros três fatores, desde logo por ser a primeira vez que a Guiné-Bissau está a financiar o seu próprio processo eleitoral, observando que "o público questiona a origem dos fundos, especialmente na ausência de supervisão parlamentar dos gastos".
Outro fator "é a ausência de missões de observação eleitoral de longo prazo" que o Instituto entende fazer "parte da estratégia de Embaló para manter a comunidade internacional fora do processo".
O terceiro fator apontado "é o anúncio da tentativa de golpe de 31 de outubro na véspera do início da campanha eleitoral" para interromper o processo eleitoral, com vários oficiais detidos, incluindo o diretor da escola militar de Cumeré, general Daba Na Walna.
O ISS lembra que o exército guineense já protagonizou golpes no passado e que "as disputas de poder entre fações e o apoio a um candidato podem influenciar o resultado das eleições".