Irão. Bruxelas bloqueia sanções norte-americanas e protege empresas

por Andreia Martins - RTP
O Parlamento Europeu e o Conselho Europeu vão discutir as medidas apresentadas nos próximos dois meses Stoyan Nenov - Reuters

A Comissão Europeia anunciou esta sexta-feira que iniciou o procedimento legal para o bloqueio das novas sanções norte-americanas contra o Irão. É a tentativa de Bruxelas de evitar a retirada de empresas europeias de Teerão, na sequência da decisão de Donald Trump de abandonar o acordo sobre o programa nuclear.

Em comunicado, a Comissão Europeia anunciou esta sexta-feira que “lançou o processo formal para ativar o Estatuto de Bloqueio”, uma legislação europeia que remonta a 1996 e que projetou o bloqueio das sanções norte-americanas impostas na altura a Cuba, Líbia e Irão, protegendo o comércio da UE com estes países.  
 
Na prática, Bruxelas vai aproveitar essa regulação, que nunca chegou a ser formalmente implementada, atualizando a lista de sanções dos Estados Unidos contra o Irão que a legislação abrange. A medida tem por objetivo neutralizar os efeitos extra-territoriais da decisão norte-americana.
 
O Estatuto de Bloqueio proíbe qualquer empresa europeia de compactuar com as sanções dos Estados Unidos, permite que as empresas possam requerer compensação de eventuais danos recorrentes dessas sanções e não reconhece quaisquer sentenças judiciais, estrangeiras ou na União Europeia, que se baseiem nas sanções norte-americanas.

A medida anunciada esta sexta-feira não entra em vigor de imediato e deverá ser discutida a aprovada no Parlamento Europeu e no Conselho Europeu no recorrer dos próximos dois meses. Bruxelas pretende que a medida seja adotada antes de 6 de agosto, data em que entra em vigor a primeira vaga de sanções norte-americanas.
Proteger o acordo nuclear
A decisão foi anunciada por Jean-Claude Juncker após o encontro informal de líderes europeus em Sófia, na Bulgária. O presidente da Comissão Europeia diz que houve “unidade” entre os estados-membros para avançar com a proteção das empresas europeias que investem no Irão, mas também do acordo sobre o programa nuclear.

“Enquanto os iranianos respeitarem os seus compromissos, a União Europeia vai manter-se fiel ao acordo que ajudou a construir, um acordo que foi unanimemente ratificado pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas e que é essencial para preservar a paz na região e no mundo”, frisou o responsável europeu.

“Temos o dever [Comissão Europeia e União Europeia] de fazer o que pudermos para proteger as empresas europeias, especialmente as PMEs”, acrescentou Jean-Claude Juncker.

Este é o primeiro passo formal da União Europeia na tentativa de preservar o acordo sobre o programa nuclear iraniano, o Joint Comprehensive Plan of Action (JCPOA), assinado em julho de 2015 entre Teerão e o grupo P5+1 (Estados Unidos, Rússia, China, Reino Unido, França e Alemanha), com o apoio da União Europeia. 

O acordo, em vigor desde janeiro de 2016, estabeleceu a redução e controlo do programa nuclear iraniano de forma a interditar uma potencial construção de armas nucleares pelo regime. Em troca, o Irão conseguiu levantamento de sanções económicas de cada país, mas também de sanções multilaterais.

Para esse efeito, Teerão sujeita-se ainda à inspeção regular e apronfundada das infra-estruturas ligadas ao nuclear.Estas inspeções são conduizidas pela Agência Internacional da Energia Atómica (IAEA, na sigla em inglês), que confirmou em dez relatórios, ao longo dos últimos dois anos e meio, que o Irão está a cumprir os termos do acordo.

Na semana passada, o Presidente norte-americano decidiu retirar os Estados Unidos do acordo e anunciou a imposição de novas sanções contra Teerão, visando sobretudo o setor petrolífero e as transações bancárias.

Perante a intenção da União Europeia e das restantes partes em manter o acordo, a Administração Trump ameaçou a imposição de sanções a empresas europeias que façam comércio com o Irão.

Nos dias seguintes, várias multinacionais europeias, incluindo a dinamarquesa Maersk, a francesa Total, e as alemãs Siemens e Allianz, anunciaram que não vão continuar a realizar negócios em território iraniano caso o impacto das sanções norte-americanas se reflita de forma negativa.
Ajuda económica e financeira

Bruxelas não se limita ao bloqueio das sanções económicas norte-americanas mas tenta também a compensação do Irão com a ajuda financeira. Logo após a saída dos Estados Unidos, o Presidente iraniano Hassan Rouhani garantiu que o país se manteria firme no cumprimento do acordo “caso os objetivos sejam atingidos em cooperação com os restantes membros”.

“Pedi ao Ministério dos Negócios Estrangeiros para negociar com os países europeus, com a China e com a Rússia nas próximas semanas. Se nesse período concluirmos que podemos beneficiar do JCPOA, o acordo mantém-se”, esclarecia na altura o Presidente iraniano.

A União Europeia vai tentar compensar o efeito das sanções norte-americanas e a ausência de Washington deste acordo com o lançamento formal do processo com o objetivo de remover os obstáculos ao financiamento do Banco Europeu de Investimento no Irão.

Este mecanismo, mediante o orçamento da União Europeia, terá também de ser discutido e aprovado nos próximos dois meses. A Comissão destaca que esta medida pode ser "útil", em particular para pequenas e médias empresas.

Outras medidas, como a cooperação e assistência ao Irão em termos energéticos, vão ser iniciadas de imediato, com o comissário europeu para o Clima e Energia, Miguel Arias Cañete, a viajar já este fim de semana para Teerão.

A Comissão Europeia pretende ainda "encorajar os estados-membros a explorarem a possibilidade de efetuarem transferências bancárias únicas para o banco central iraniano".

Esta medida, explica a Comissão Europeia, pode ajudar as autoridades iranianas a recerberem "receitas relacionadas com o petróleo", particularmente nos casos em que as sanções dos Estados Unidos possam ter como alvo entidades da União Europeia que sejam relevantes para as transações petrolíferas com o Irão.
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