Irão deixa de limitar enriquecimento de urânio e afasta-se do acordo nuclear

por Andreia Martins - RTP
Leonhard Foeger - Reuters

A televisão estatal iraniana avança este domingo que Teerão vai distanciar-se ainda mais do acordo sobre o programa nuclear assinado em 2015 entre o país e seis grandes potências internacionais. Nos últimos meses, a República Islâmica tinha vindo a violar algumas das alíneas estabelecidas pelo entendimento de há cinco anos, mas anunciou agora que vai deixar de cumprir por completo os limites ao enriquecimento de urânio.

Este poderá ser o golpe de misericórdia num acordo diplomático que vinha a perder força desde maio de 2018, altura em que os Estados Unidos se retiraram unilateralmente do mesmo e anunciaram a reposição de pesadas sanções económicas contra Teerão. 

Um ano depois, em maio de 2019, e depois de exigir repetidamente às potências europeias que tentassem salvar o entendimento e compensar os prejuízos causados pela saída norte-americana, o Irão anunciou que iria começar a violar alguns dos aspetos do acordo, direção que tem vindo a seguir ao longo dos últimos meses e que culmina agora com o rasgar do entendimento nas suas principais vertentes.  

Ainda que não seja apresentado dessa forma pela televisão estatal iraniana, o anúncio deste domingo significa, na prática, que o Irão deixa de cumprir com os restantes limites que tinham sido impostos ao seu programa nuclear.  O acordo assinado em 2015 por Irão e o grupo P5+1 (Estados Unidos, França, Reino Unido, China, Rússia e Alemanha) estabelecia limites ao programa nuclear iraniano sob condição do levantamento de sanções internacionais contra aquele país.

Em concreto, o Irão anunciou que vai deixar de limitar o número de centrifugadoras de enriquecimento de urânio que são usadas, o que significa que passará a não haver quaisquer limites à quantidade de urânio enriquecido produzido, à percentagem a que este urânio pode ser enriquecido ou aos esforços de investigação e desenvolvimento do programa nuclear.

"O Irão vai continuar com o enriquecimento de urânio sem quaisquer limites e com base nas suas necessidades técnicas", refere o comunicado citado pela televisão iranana.

Nos termos do acordo sobre o programa nuclear assinado em julho de 2015 (Joint Comprehensive Plan of Action – JCPOA), o Irão não podia ultrapassar o nível de enriquecimento de urânio além de 3,67 por cento, muito longe dos 90 por cento de enriquecimento necessário à produção de armas nucleares. O acordo de 2015 também limitava o stock de urânio enriquecido do Irão a 300 quilogramas e o número de centrifugadoras disponíveis para o enriquecimento a um máximo de 5.060. 

Nos últimos meses, o Irão já tinha chegado a valores de enriquecimento de urânio à volta dos 4,5 por cento, ainda assim bastante longe dos 20 por cento que alcançou antes da assinatura do acordo de 2015.

Ao rasgar os principais compromissos assumidos, o Irão assinala, no entanto, que vai continuar a "cooperar" com a Agência Internacional da Energia Atómica (AIEA), a organização responsável por supervisionar o cumprimento do acordo, e assegura ainda que esta decisão poderá ser rapidamente reversível caso os Estados Unidos decidam levantar as sanções em vigor contra Teerão.

O anúncio deste domingo surge após a escalada de tensões entre o Irão e os Estados Unidos após o ataque aéreo norte-americano em Bagdade, no Iraque, que matou o general iraniano Qassem Soleimani, líder da Al-Quds, uma força de elite da Guarda Revolucionária.
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