Itália. Matteo Renzi demite-se após fracasso eleitoral

por Andreia Martins - RTP
Alessandro Bianchi - Reuters

O líder do Partido Democrático apresentou a demissão esta segunda-feira na sequência dos resultados das eleições em Itália. A informação é confirmada pela agência Ansa. As eleições ficaram marcadas pelo recuo dos partidos tradicionais e a ascensão das forças populistas e partidos de direita.

Com um resultado muito aquém do esperado, o antigo primeiro-ministro italiano (entre 2014 e 2016) sai de cena. A coligação de centro-esquerda liderada por Matteo Renzi, até hoje secretário-geral do Partito Democratico, ficou muito longe do resultado obtido pelo Movimento 5 Estrelas (mais de 36 por cento), um dos grandes vencedores destas eleições, a par da Liga Norte. 

A informação foi confirmada por um porta-voz do partido à agência Ansa, ao final da manhã. Para as 17h00 locais (menos uma hora em Lisboa) está marcado o anúncio oficial de demissão.

Os resultados já conhecidos atribuem cerca de 23 por cento à coligação de centro-esquerda que concorreu a estas eleições, quando a coligação de centro-direita, com a Liga Norte e o Forza Italia como principais forças políticas, alcançou mais de 36 por cento. Sozinho, o Movimento 5 Estrelas conseguiu mais de 32 por cento dos votos, assumindo-se como a força política mais votada, força dominante sobretudo na zona sul da península itália.

Matteo Renzi chegou à liderança do Partido Democrático pela primeira vez em dezembro de 2013. Antes, a experiência na política começara na sua cidade natal, em Florença, logo em 2004, quando foi eleito presidente da província aos 30 anos, tornando-se no mais novo de sempre a alcançar tal cargo. Em 2009, já como membro do Partido Democrático, concorreu às eleições e passou a ser o mayor da mesma cidade.

Da região toscana para a Itália, o político em ascensão foi eleito secretário-geral do Partido Democrático e depressa motivou uma revolução no Governo. Em fevereiro de 2014, o então primeiro-ministro Enrico Leta, que vencera as eleições gerais dez meses antes, apresentou a demissão devido à contestação interna do seu executivo no PD. O protagonista? Matteo Renzi, que então assinalava os fracos resultados económicos e para os valores de desemprego mais altos em várias décadas. Chegou ao Palazzo Chigi, residência oficial do primeiro-ministro, ainda antes de completar 40 anos.
"Bicameralismo perfeito"

Durante o governo que liderou, deu prioridade às reformas laborais e ao crescimento económico, mas outros temas acabaram por marcar os dois anos e meio em que esteve no poder. A imigração, com Itália a ser um dos países mais afetados pela crise de refugiados que visou a Europa, sobretudo durante o ano de 2015, e as reformas constitucionais, que acabariam por precipitar o pedido de demissão em dezembro de 2016.

Nas questões migratórias o ex-primeiro-ministro encontrou a oposição da extrema-direita e dos movimentos populistas, vitoriosos nestas eleições, tendo sido um dos temas fortes da campanha eleitoral, com a Liga Norte e o Forza Italia a prometerem encetar programas de deportação em massa de mais de 600 mil imigrantes. Há pouco mais de uma semana foi uma das principais figuras do Partido Democrático e desfilar numa marcha contra a xenofobia e o fascismo que reuniu milhares de pessoas no centro de Roma antes das eleições, isto enquanto decorriam grandes comícios de partidos de extrema-direita em vários pontos do país.

Quanto às reformas constitucionais, Matteo Renzi insistiu na aprovação de um conjunto de alterações constitucionais pela via de um referendo, desde logo a alteração dos poderes do Senado, o que implicaria mudanças no chamado "bicameralismo perfeito" que caracteriza a política italiana, onde ambas as câmaras do Parlamento, a Câmara dos Representantes e o Senado, possuem poderes idênticos. No entanto, levou ao extremo a campanha pelas mudanças pretendidas, ao transformar o voto num escrutínio ao seu governo. Personalizou o referendo, colocou-se em xeque na votação e o povo italiano acabou por rejeitar as alterações constitucionais propostas, a 4 de dezembro de 2016.

Nessa mesma noite, Matteo Renzi anunciava a demissão, tendo sido substituído por Paolo Gentioli alguns dias depois. Conseguiu recuperar a liderança do Partido Democrático em maio de 2017 nas eleições primárias, já a pensar num possível regresso ao cargo de primeiro-ministro. O resultado ficou muito longe do que seria necessário para o garantir.

Para além do falhanço político de Renzi, o resultado alcançado pelo Partido Democrático deixa prever mais um momento de crise para este jovem partido fundado em 2007. Depois do sucesso eleitoral em 2013, em que se tornou na força política com maior número de votos e de deputados nas duas câmaras, o PD vê-se reduzido a apenas 18 a 19 por cento dos votos, menos de metade dos 40 por cento alcançados nas eleições europeias de 2014.
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