Jornalista timorense candidata-se a PR porque país precisa de comunicação

  Virgílio Guterres, jornalista e ativista político timorense, diz que se vai candidatar às presidenciais previstas para março por considerar que, no momento atual, o que Timor-Leste mais precisa é "comunicação" e recuperar do espírito de solidariedade do passado.

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"Desde pelo menos 2017 que tem faltado a comunicação. Um Presidente mais comunicativo, com todas as forças do país, é importante. Especialmente porque nos temos concentrado demais na liberdade e na igualdade e esquecemos a fraternidade, a irmandade, a solidariedade que caracterizaram a nossa luta", diz, em entrevista à Lusa.

"Aos nossos líderes falta comunicação entre si e com o povo. Temos de reconhecer que se vão cometendo erros. Mas também que só cometendo erros desde 1975 é que chegámos à independência", sublinha o atual presidente do Conselho de Imprensa.

Virgílio Guterres explica que se candidata com sentido de "responsabilidade, sacrifício e abnegação" e como "chamada para a responsabilização política" à sua geração.

Aponta o que diz ser "a euforia da liberdade, o orgulho e alguma arrogância, até muita arrogância" que considera notar-se "nas narrativas perante o público sobre serem donos da independência, pilares da nação".

"Se alguns são donos, os outros são o quê? Esquecem-se que governar é mais difícil do que lutar pela independência", enfatiza.

"Xanana Gusmão dizia que a luta é a arte de conviver com o inimigo. E governar deve ser outra arte, de conviver com os adversários, de aceitar discordância, de ter tolerância entre as partes. A discordância não é o fim do respeito, não pode servir para trincheiras", insiste Virgílio Guterres.

O que tem ocorrido, considera, é que as diferenças e divergências que sempre existiram durante o período de luta contra a ocupação indonésia reacenderam-se, especialmente desde 2017, com "eleições antecipadas e interpretações da Constituição", com os líderes do país a "perderem o rumo, como formular o futuro, o destino do povo".

"As posições políticas são mais espaços para se autoproclamarem, de parte a parte - sou o tal, faço mais que outro -- e não são espaços para o compromisso político de servir o povo. A preocupação com essa situação é que me motiva", acrescenta.

A população "está frustrada" e "farta de conflitos", especialmente quando estes "envolvem os seus mais profundos sentimentos de simpatia" por um ou outro líder, refere o pré-candidato.

"Porque a confusão, a origem do centro da confusão vem dos seus próprios líderes mais amados e admirados e das forças políticas mais admiradas", considera.

Para Virgílio Guterres, "no passado foram esses líderes os exemplos, os solucionadores de problemas, mas agora, depois da independência, tornaram-se o centro da frustração e dos problemas" e vive-se em Timor-Leste "um desamor e um desalento com os líderes".

O pré-candidato refere que tem questionado líderes sobre exatamente o que se restaurou há 20 anos, parecendo que se restaurou apenas "o egoísmo, o regionalismo, o divisionismo, que no período da resistência foi enterrado por uma causa maior".

"Só chegamos à meta final abraçando todos. Mas agora surgem as narrativas de que se não fosse um ou outro não se chegaria aqui. E isso vem da Fretilin, de Xanana, de todos os que estão no poder, formal e informal", sublinha.

"O povo deposita muita esperança neles, na figura de Xanana, na força da Fretilin como partido histórico, mas estes 20 anos desgastaram muito isso. Chegou a altura de os líderes atuais se concentrarem em fazer a gestão dos interesses do povo. De 2002 a 2017 parece que gastaram mais tempo a fazer gestão dos interesses próprios", critica.

As eleições estão previstas para março e qualquer candidato tem de formalizar a candidatura no Tribunal de Recurso com pelo menos 5.000 assinaturas.

A data das eleições será anunciada este mês pelo chefe de Estado, Francisco Guterres Lú-Olo.

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