Ucrânia acusa Rússia. Destruição da barragem de Nova Kakhovka obriga a evacuações

por Inês Moreira Santos - RTP
Maxar Technologies via Reuters

A escalada entre a Rússia e a Ucrânia voltou a agudizar-se. O Governo ucraniano acusou esta terça-feira as tropas russas de fazerem explodir a barragem da central hidroelétrica de Nova Kakhovka, no Rio Dnipro. Com o receio de que a destruição da infraestrutura provoque inundações nas áreas em redor, as autoridades estão a pedir à população desta região, no sul, que abandone as habitações. O presidente do Conselho Europeu já se manifestou, considerando este mais um crime de guerra das forças russas, e vai propor aos líderes da União Europeia maior assistência a Kiev pelo "ataque sem precedentes".

As imagens que circulam nas redes sociais, desde o início da manhã desta terça-feira, mostram uma enorme rutura na barragem de Nova Khakovka, com água já a inundar rio abaixo na direção de Kherson. Ainda não é claro o que causou a destruição da barragem, mas o Comando Sul das Forças Armadas ucranianas denunciou o incidente, a 60 quilómetros da cidade de Kherson, e avançou que está a investigar a extensão dos danos, bem como a velocidade e a quantidade de água que deverá afetar as áreas vizinhas.


"O nível da água está a subir e todos que estão na zona de perigo devem desligar todos os aparelhos elétricos, levar documentos essenciais, cuidar de entes queridos e animais de estimação, e seguir as instruções dos socorristas e polícias", pode ler-se nas recomendações publicadas pelas autoridades nas redes sociais.

O chefe da Administração Militar Regional de Kherson, Oleksandr Prokudin, disse, num vídeo publicado na plataforma Telegram, pouco antes das 7h00 locais, que "o exército russo cometeu mais um ato de terror" e alertou que a água deverá atingir "níveis críticos" dentro de cinco horas.

“Cerca das 7h30, as seguintes localidades foram total ou parcialmente inundadas: Tyaginka, Lviv, Odradokamyanka do distrito de Beryslav, Ivanivka, Mykilske Tokarivka, Ponyativka, Bilozerka, Ostriv microdistrito da cidade de Kherson, distrito de Kherson”, escreveu. “Receamos que outras zonas sejam ainda inundadas, estamos preparados para isso”.

Segundo a mesma fonte, Prokudin, estavam cerca de 16 mil pessoas na “zona crítica” na margem direita do rio controlada pelos ucranianos e, por isso, estavam a ser retiradas dos distritos a montante da cidade de Kherson e levadas pelas autoridades para a cidade.

O Ministério ucraniano do Interior pediu aos residentes das aldeias na margem direita do rio Dnipro e de partes da cidade de Kherson que reúnam os documentos essenciais e animais de estimação, desliguem os aparelhos elétricos e abandonem as casas.
As imagens que circulam - e que parecem ser de uma câmara de vigilância, com vista para a barragem - mostram um foco de luz, uma explosão e a barragem a desabar.

O chefe do gabinete da Presidência ucraniana, Andriy Yermak, revelou que Volodymyr Zelensky, convocou, de forma urgente, uma reunião do Conselho de Segurança do país, após "mais um crime de guerra cometido pelos terroristas russos".

“A destruição da barragem da central hidroeléctrica de Kakhovka apenas confirma ao mundo inteiro que eles têm de ser expulsos de todos os cantos do território ucraniano. Não lhes deve ser deixado um único metro, porque eles usam cada metro para o terror. Só a vitória da Ucrânia devolverá a segurança. E essa vitória há-de chegar. Os terroristas não serão capazes de parar a Ucrânia com água, mísseis ou qualquer outra coisa", escreveu Zelensky no Twitter.
Moscovo acusa Kiev
Moscovo, contudo, já reagiu alegando que a barragem desmoronou "devido a danos" causados pelo conflito e confirmando que os terrenos próximos estão a sofrer inundações.

"A barragem não aguentou, um suporte desabou e a inundação começou", disse uma fonte à agência de notícias oficial russa TASS.

O autarca da cidade ocupada de Nova Kakhovka disse que, pelas 2h00, as forças ucranianas realizaram "uma série de ataques à central hidroelétrica de Kakhovka, que destruíram as válvulas". Também de acordo com a TASS, Vladimir Leontiev disse que a água estava a sair da represa "de forma incontrolável".

Não é a primeira vez que a Ucrânia e a Rússia trocam acusações sobre alegados ataques à barragem e, em outubro, Zelensky avisou que a Rússia tinha colocado explosivos na estrutura para causar uma inundação e dificultar o avanço das tropas ucranianas. Em fevereiro, os níveis da água na barragem de Kakhovka estavam tão baixos que muitos temiam um colapso na central nuclear de Zaporizhia, ocupada pelos russos, cujos sistemas de arrefecimento são abastecidos com água de um reservatório mantido pela barragem.

E no passado mês de maio, após fortes chuvas e com a neve de inverno a derreter, os níveis da água subiram além dos níveis normais, inundando aldeias próximas.

Este incidente aconteceu, de facto, no segundo dia de operações ofensivas ucranianas, avança o Guardian.
Cheias em Kakhovka não afetam Zaporizhia de imediato
A central nuclear de Zaporizia não enfrenta "perigo imediato" na sequência das cheias provocadas pela destruição parcial da barragem hidroelétrica de Kakhovka no rio Dniepre, garantiu já a Agência Especial de Energia Atómica citada pela AFP.

"Não há perigo nuclear imediato", disse a agência das Nações Unidas referindo-se aos eventuais efeitos da destruição da barragem no rio Dniepre.

A zona da barragem de Kakhovka está ocupada pelas forças da Rússia que já acusaram Kiev de ataque contra a infraestrutura provocando as inundações. E existe alguma preocupação em torno da integridade da maior central nuclear da Europa.

No entanto, as autoridades, apesar de reconhecerem que o complexo pode ser afetado negativamente, já esclareceram que, para já, a situação “está sob controlo”.

"A água da barragem de Nova Kakhovka é necessária para que a central receba energia para as turbinas e para os sistemas de segurança. O reservatório de arrefecimento da estação está agora cheio: às 8h00 da manhã, o nível da água é de 16,6 metros, o que é suficiente para as necessidades da estação"
, afirmaram as autoridades, citadas pelo Guardian.
"Ataque sem precedentes"

Em reação às notícias da destruição da barragem, o presidente do Conselho Europeu disse que vai propor aos líderes da União Europeia maior assistência à Ucrânia pelo “ataque sem precedentes”, acusando a Rússia de cometer um crime de guerra.

“Estou chocado com o ataque sem precedentes à barragem de Nova Kakhovka. A destruição de infraestruturas civis é claramente qualificada como um crime de guerra e nós responsabilizaremos a Rússia e os seus representantes”, vincou Charles Michel, numa publicação na rede social Twitter.

Indicando que abordará este assunto na cimeira de chefes de Governo e de Estado da UE, no final deste mês, o presidente do Conselho Europeu adiantou que irá ainda “propor maior assistência às zonas inundadas”.

“Os meus pensamentos estão com todas as famílias da Ucrânia afetadas por esta catástrofe”, lamenta Charles Michel.

Também o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, condenou o alegado ataque russo à barragem.

"A destruição da barragem de Kakhovka hoje coloca em risco milhares de civis e causa graves danos ambientais", escreveu no Twitter.

"Este é um ato ultrajante, que demonstra mais uma vez a brutalidade da guerra da Rússia na Ucrânia".


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