Kosovo acusa Sérvia de estar envolvida em ataque que matou polícia

por Inês Moreira Santos - RTP
Georgi Licovski - EPA

A Sérvia declarou luto nacional em homenagem aos "mártires" que morreram no Kosovo, durante um ataque no domingo. Já Pristina afirma ter impedido "um cenário de carnificina" e acusa Belgrado de estar envolvida na emboscada que vitimou um polícia kosovar.

O ataque de domingo, que matou um agente da polícia do Kosovo, e os confrontos que se seguiram num mosteiro numa aldeia perto da fronteira com a Sérvia são já considerados uma das mais graves escaladas na antiga província separatista. O incidente tem desencadeado, desde o início da semana, trocas de acusações entre os dois lados.

O Kosovo acredita que a Sérvia tem responsabilidades e está por trás do grupo paramilitar que emboscou uma patrulha policial e provocou os confrontos com as forças kosovares. As autoridades de Pristina admitem ter armamento moderno que terá sido utilizado pelo grupo sérvio, incluindo dois carros blindados e um lançador de granadas. Entre as acusações, o Governo kosovar aponta como líder da organização paramilitar um proeminente político sérvio, Aleksandar Vučić, e garante que entre os mortos do ataque de domingo está o antigo segurança privado do chefe dos Serviços de Inteligência da Sérvia, Aleksandar Vulin.

“Este grupo veio da Sérvia, é treinado na Sérvia, financiado pelas autoridades e ainda equipado pelo Exército da Sérvia e pela sua polícia”, acusou Xhelal Sveçla, ministro do Interior do Kosovo, ao Guardian.

Ao jornal britânico, o governante kosovar afirmou ainda que “algumas das armas foram retiradas dos armazéns do exército e entregue a terroristas que vieram da Sérvia para o Kosovo”. O Ministério que administra, segundo o mesmo, divulgou as provas às embaixadas e às agências ocidentais.

“O que eles queriam era conquistar o território do Kosovo e abrir um novo canal de comunicação, uma nova estrada da Sérvia ao Kosovo”, disse o ministro, acrescentando que o objetivo final era a divisão do país.

O Governo sérvio, por seu lado, negou qualquer envolvimento com o grupo armado, mas decretou um dia oficial de luto pelos três mortos. Em declarações à televisão nacional (RTS), o ministro da Defesa sérvio, Milos Vucevic, equiparou os membros do comando paramilitar mortos aos sérvios caídos no passado “pela liberdade do Kosovo e pela liberdade da Sérvia”.

“São as novas vítimas desta linhagem de heróis ou de mártires (…) pela liberdade do povo sérvio no Kosovo”
, declarou na quarta-feira.

Também os tabloides sérvios saudaram os membros do comando, chamando-lhes “Os nossos heróis kosovares” (Informer) e “As vítimas do terrorismo de [Albin] Kurti” (Alo), numa referência ao primeiro-ministro do Kosovo.
Armamento sérvio
Vučić procurou, entretanto, justificar as suas ações acusando, numa reunião com o embaixador russo em Belgrado, o governo do Kosovo de estar a levar a cabo uma limpeza étnica.

Pristina acusa, contudo, que o grupo paramilitar era comandado por Milan Radoičić, vice-líder do partido da Lista Sérvia, apoiado por Belgrado, que domina a política nos quatro municípios de maioria sérvia no norte do Kosovo. Ainda à publicação, Sveçla disse que os serviços secretos kosovares acreditam que Radoičić, sancionado pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido, foi ferido e estaria a recuperar no principal hospital militar de Belgrado.

Radoičić não fez qualquer declaração pública a negar ou a confirmar as alegações, mas o ministro dos Negócios Estrangeiros da Sérvia, Ivica Dačić, afirmou que um vídeo divulgado pelo Kosovo que pretendia mostrar Radoičić entre os paramilitares era uma “fraude”.

Após o ataque, Pristina acusou de imediato Belgrado de estar por detrás daquele ataque “criminoso e terrorista”. A Sérvia negou, culpando o líder do Governo kosovar e as suas “provocações” aos sérvios do Kosovo.

Segundo uma lista divulgada por Albin Kurti, a polícia apreendeu 150 quilos de explosivos, dezenas de espingardas automáticas, lança-rockets e um veículo blindado.

“Com mais de cinco milhões de euros de armamento militar e quantidades suficientes para um grupo de centenas de combatentes, o cenário de carnificina no Kosovo ficou provado”, disse Kurti numa reunião do Governo, na quarta-feira.

“A Sérvia está totalmente envolvida neste ataque terrorista”, acrescentou, deixando entrever dias complicados no que diz respeito à “normalização” das relações com Belgrado, que já se encontram num impasse.

Há ainda elementos pouco claros neste episódio de violência que fez, no total, quatro mortos, acirrando o conflito entre a Sérvia e a sua antiga província, de maioria albanesa, cuja independência, proclamada em 2008, nunca foi reconhecida por Belgrado. Os três homens, residentes no norte do Kosovo, foram mortos numa operação das forças especiais kosovares, após a morte de um polícia kosovar albanês numa emboscada.

Algumas horas após o ataque mortal, perto da aldeia de Banjska, a alguns quilómetros da fronteira sérvia, dezenas de homens fortemente armados refugiaram-se num mosteiro.
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