Os linces voltaram à Serra Morena, em Castela La-Mancha, Espanha, em 2014 e, nestes 10 anos, António, vigilante da natureza, já viu "avós, mães e netas" parirem na serra, onde hoje vivem centenas destes felinos.
A alegria que António não consegue esconder dos jornalistas numa visita guiada esta semana pela serra é partilhada por uma comunidade que abrange cientistas, técnicos de conservação animal e autoridades locais, nacionais e europeias, mas também associações cinegéticas, agricultores ou empresários ligados ao turismo.
O projeto de recuperação do lince ibérico, que estava reduzido a menos de 100 animais e ameaçado de extinção no início deste século, envolve governos e privados de Espanha e Portugal, arrancou em 2002, financiado com programas europeus LIFE, e fez-se "sempre em cooperação com as populações", com as associações de caçadores, por exemplo, a assumirem um papel fundamental, num processo em "se quebraram vários tabus", nas palavras dos responsáveis do Lynxconnect, o LIFE em curso, para o período 2020-2025.
O exemplo está nos terrenos que António e responsáveis do Lynxconnect percorreram esta semana com jornalistas e que uma população de linces escolheu para se instalar e reproduzir: uma reserva de caça e uma reserva natural, vizinhas, em plena Serra Morena.
Os linces Kiowa, Kaplán e Kairós, nascidos em cativeiro, foram libertados nesta zona em 2014 e as primeiras fêmeas escolheram os terrenos da reserva de caça para se instalar, porque aí encontraram disponibilidade de coelho, o animal de que se alimentam.
Trabalho de preservação complicado
"É um animal impressionante em todos os aspetos e muito especial no momento de ser manuseado, tratado e até libertado", disse Rocío Gómez Pérez, sem esconder o fascínio pelo "maior felino da Península Ibérica", que esteve prestes a desaparecer.
Sendo uma espécie que esteve à beira da extinção, "ao longo destes anos, investigou-se muito, publicou-se muito e houve surpresas" sobre o que se sabia ou pensava saber sobre o lince, afirmou Paco Sánchez.
Socialmente, "não é tão solitário como parece" e "tem uma estrutura em que as fêmeas costumam tentar permanecer ligadas ao território das mães", a par de se manterem "relações sociais entre exemplares aparentados", exemplificou o biólogo.
Os cientistas estão também ainda a fazer descobertas, por exemplo, a nível dos patógenos, "sobretudo em populações que acabam de se estabelecer", ou das relações com outros animais carnívoros.
"Há muito trabalho por fazer", sublinhou Paco Sánchez, que insistiu em que o lince continua a ter muitas ameaças, desde doenças ao perigo que são as estradas, e que "é vertiginoso" pensar que "a sociedade em geral possa pensar que o lince já está fora de perigo": "O lince não está salvo".